Um industrial famoso bebeu tanto rádio que o seu crânio (literalmente) se desintegrou

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ZAP // Dall-E-2

Eben Byers faleceu em 1932 após ingerir mais de 1000 garrafas de “Radithor”

Há quase 100 anos, um então famoso industrial norte-americano morreu depois de consumir mais de 1.000 garrafas de Radithor. Este tónico, que continha rádio na sua composição, era obviamente radioativo — e causou danos catastróficos no seu corpo.

Em 1932, Eben Byers, um industrial endinheirado e personalidade famosa da sociedade de Pittsburgh, nos Estados Unidos, sucumbiu a uma dose fatal de radiação depois de se ter automedicado com um tónico “milagroso” que continha rádio como ingrediente ativo.

O trágico incidente desenrolou-se durante o início do século XX, num período marcado pelo sentimento geral de otimismo que se vivia e pelo fascínio por novas descobertas — incluindo o rádio, 88Ra.

Descoberto por Marie e Pierre Curie em 1898, este elemento químico foi rapidamente adotado em vários produtos de saúde e beleza. O problema deste metal alcalino-terroso, formado pelo decaimento do urânio, é que é ele próprio radioativo.

Em 1918, William J.A. Bailey, um empresário conhecido pelas suas inúmeras atividades fraudulentas — o vendedor de banha da cobra por excelência — introduziu no mercado um produto “revolucionário”: o Radithor .

Este “remédio santo”, conta o Science Alert, era essencialmente composto por água infundida com sais de rádio.

Sam LaRussa / Flickr

Garrafa de Radithor, tal como vendida no início do século passado

Em 1927, Byers deu uma queda e fraturou um braço, tendo então sido aconselhado pelo seu fisioterapeuta, Charles Clinton Moyar, a tomar Radithor — um conselho que o industrial norte-americano seguiu entusiasticamente.

Durante dois anos, Byers tomou três garrafas do tónico por dia, tendo consumido ao todo mais de 1.000 garrafas do “medicamento”.

A confiança no xarope era tanta, que Byers chegou a promovê-lo entre amigos e a usá-lo num dos seus cavalos. Na altura, não havia ivermectina e ainda ninguém se tinha lembrado de falar dos “benefícios” da lixívia, inventada em 1750, para tratar todas as maleitas imagináveis…

Os efeitos prejudiciais do consumo diário de rádio tornaram-se evidentes em 1930, quando Byers começou a perder os dentes. Apesar de ter cessado de tomar o “maravilhoso” medicamento, os danos eram já irreversíveis.

O rádio, sendo quimicamente semelhante ao cálcio, deposita-se nos ossos e emite radiação, causando danos significativos nos tecidos.

Byers sofreu de fortes dores de cabeça e na mandíbula, sintomas semelhantes aos sentidos pelas “Radium girls“, as trabalhadoras de três fábricas norte-americanas que há 100 anos sofreram de exposição fatal ao rádio após ingerirem quantidades “inofensivas” de tinta.

Na altura em que o caso foi levado à Federal Trade Commission, o regulador norte-americano de atividades económicas, Byers já tinha sido submetido a cirurgias para remover a maior parte da sua mandíbula, e os seus ossos, incluindo o crânio, estavam a desintegrar-se.

Byers faleceu a 31 de março de 1932. A autópsia revelou a presença de cancro em todo o seu esqueleto e abcessos no cérebro. O seu corpo tinha 36 microgramas de rádio, sendo que 2 microgramas são já considerados uma dose fatal.

O industrial foi enterrado num caixão revestido a chumbo — um destino que partilhou com Marie Curie, cujo corpo se tinha tornado altamente radioativo devido à prolongada exposição a materiais radioativos ao longo da sua carreira de investigadora.

A morte de Byers levou a mudanças legislativas nos Estados Unidos. As substâncias radioativas passaram a estar sob a supervisão da Food and Drug Administration, e a florescente “indústria de medicamentos radioativos” foi abruptamente extinta.

Em 1965, uma equipa de cientistas exumou os restos mortais do empresário para estudar os efeitos da radiação no corpo humano, e descobriu que o corpo ainda estava perigosamente radioativo.

Eben Byers foi novamente sepultado no seu caixão forrado a chumbo. E, atendendo a que a semivida do rádio é de 1600 anos, assim permanecerá provavelmente por mais de três milénios.

Armando Batista, ZAP //

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2 Comments

  1. “(…) atendendo a que a semivida do rádio é de 1600 anos, assim permanecerá provavelmente por mais milénio e meio.” Errado!

    “Meia-vida, também conhecida como período de semidesintegração, é o tempo necessário para que metade do número de átomos do isótopo radioativo presente em uma amostra desintegre-se.” https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/quimica/o-que-e-meia-vida.htm

    Sendo assim, vão ser precisos três milénios para toda a radiação desaparecer. Ou, mais exactamente, a radiação ainda pode continuar mas já a ser produzida por isótopos de outro elemento, o radão.

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