Desde os anos 90 que existe uma rede global de sensores para identificar detonações nucleares não autorizadas. O que se descobriu com esta criação foi um grupo de baleias azuis pigmeus, até então desconhecido.
Durante gerações, estas as baleias azuis pigmeus nadaram pelo Oceano sem se cruzarem com nenhum Ser Humano.
Algumas delas chegaram a medir 24 metros de comprimento e a pesar 90 toneladas.
Se estes animais se cruzaram, por exemplo, com algum barco, esses encontros nunca foram registados. Até há pouco tempo. Os cientistas descobriram, em 2021, um grupo de baleias azuis pigmeus no Oceano Índico.
A descoberta foi ainda mais surpreendente, uma vez que só aconteceu devido às armas nucleares.
Os cientistas criaram uma rede global de sensores, colocada em alguns dos locais mais remotos do mundo. Desde os anos 90 que os seus operadores, numa sala de controlo, em Viena, Áustria, têm estado à escuta de testes nucleares não autorizados.
Ao longo dos anos, esta rede também tem captado muitos outros sons e ruídos no Oceano, no solo e na atmosfera, estando agora a revelar-se bastante vantajosa para a ciência.
De acordo com a BBC, muitas instalações encontram-se em locais calmos e relativamente pouco perturbados.
Os EUA, por exemplo, têm uma estação na ilha Wake, no Pacífico, um dos locais mais isolados. Outras podem ser encontradas na Antártida.
No entanto, algumas estão um pouco mais perto da civilização, como um conjunto sísmico na aldeia da Lajitas no Texas — a 650 km a oeste de San Antonio — ou a estação de radionuclídeos em Sacramento, na Califórnia.
A sua distribuição generalizada significa que, se houver uma detonação nuclear algures na Terra, os operadores da sala de controlo de Viena saberão, como explica Xyoli Perez Campos, diretora da divisão do Sistema Internacional de Monitorização (IMS) da CTBTO, na Áustria.
“Onde quer que aconteça, temos as tecnologias para cobrir”, afirma. “Se houver um teste nuclear subterrâneo, temos a tecnologia sísmica para o apanhar. Se o teste nuclear for subaquático, temos estações hidroacústicas. Se os testes forem efetuados na atmosfera, temos o infrassom. E as estações de radionuclídeos permitem-nos distinguir se houve uma componente nuclear”.
Recentemente, a rede nuclear IMS tem revelado muito mais do que “big bangs”. Ao longo da última década, com a abertura do acesso científico aos dados, os investigadores recorreram à IMS para detetar acontecimentos que, de outra forma, poderiam passar despercebidos — isto inclui o canto das baleias, mas muito mais.
No caso das baleias azuis pigmeus — uma espécie tropical da baleia azul —, foram descobertas quando investigadores australianos decidiram escutar um pouco mais de perto os sons do Oceano, utilizando a rede hidroacústica do IMS.
Em 2021, a bioacústica Emmanuelle Leroy, da Universidade de Nova Gales do Sul, em Sydney, e os seus colegas analisaram as canções de várias populações de baleias no oceano Índico central.
Alguns anos antes, tinha sido detetada uma nova canção, conhecida como “canção de Chagos”, ou “Diego Garcia Downsweep”, nome do local onde foi detetada: o atol de Diego Garcia, no arquipélago de Chagos, a sul das Maldivas.
Na altura, eram conhecidos cinco grupos de baleias azuis no Oceano Índico, bem como populações de baleias de Omura. Mas não era claro a que grupo pertencia a canção de Chagos.
Os cientistas sabem que cada grupo tem chamamentos fortemente personalizados, o que significa que podem ser classificados em “populações acústicas“, e este não correspondia.
Leroy e os seus colegas aperceberam-se que a rede IMS lhes permitiria estudar o canto de Chagos ao longo de quase duas décadas, em vários locais do oceano, desde o Sri Lanka até à Austrália Ocidental.
A sua análise concluiu que o canto de Chagos deve pertencer a uma população inteiramente nova de baleias azuis pigmeus.
Encontrar este novo grupo foi uma boa notícia, sobretudo porque as baleias azuis pigmeus são muito raras.
No século XX, as baleias azuis foram caçadas quase até à extinção, passando de um número estimado de 239 000, na década de 1920, para um mínimo de cerca de 360 em 1973.
Os fundadores da rede provavelmente não previram todas as utilizações atuais da IMS. As suas mais de 300 estações evoluíram para a derradeira rede de escuta planetária.
Neste momento, em locais remotos de todo o mundo, os sensores estão a monitorizar a humanidade e a natureza à procura de sons e ruídos que, de outra forma, poderiam passar despercebidos — e isso inclui uma família de baleias a cantar uma canção única.
Podemos não ser capazes de ver este grupo esquivo, mas podemos ouvi-lo.