Um canadiano pode ter de pedir o estatuto de refugiado político no Canadá, o país onde vive há 60 anos, porque os pais, anarquistas, se recusaram a registar o seu nascimento.
“O meu pai, nativo das Primeiras Nações, e a minha mãe, branca, ambos anarquistas, não quiseram registar o meu nascimento porque temiam que me retirassem da sua guarda e que acabasse numa escola da segurança social”, afirmou Donovan McGlaughlin.
Esta decisão dos pais gerou um autêntico “pesadelo burocrático” na vida de McGlaughlin, residente em Dawson City, no Yukon, que o impediu de obter qualquer documento de identificação, incluindo o cartão de saúde.
A situação agravou-se quando Mcglaughlin teve uma série de ataques cardíacos, que resultaram em despesas de 130 mil dólares, cerca de 89 mil euros, de contas médicas, incluindo o transporte aéreo para o hospital.
“Não sei quanto mais difícil se pode tornar a minha situação até ter de pedir o estatuto de refugiado político“, disse McGlaughlin.
“O que mais posso fazer? Quer dizer, não tenho Pátria, não tenho direitos no meu próprio país?“, questiona McGlaughlin.
A falta de documentação e os problemas médicos também têm levado cobradores de impostos, tanto do governo territorial como federal, a baterem-lhe à porta. Scott McGlaughlin nunca teve um trabalho a tempo inteiro.
McGlaughlin celebra o seu aniversário a 19 janeiro, mas não sabe nem a data exata nem o local, apenas que nasceu algures entre Rosebud, no Dakota do Sul, EUA, e Guelph, no Ontário, Canadá, onde os avós maternos viviam.
Nem casar pode com a mãe dos filhos
McGlaughlin conta que os pais mudavam com frequência o local de residência, em várias zonas do Canadá, porque tinham medo de ser apanhados pelas autoridades.
Aos 15 anos de idade, McGlaughlin deixou os pais, passando a viver de trabalhos agrícolas e empregos sazonais, como a colheita de frutos.
Há 30 anos, apaixonou-se pela região do Yukon, no nordeste do Canadá, onde tem vivido desde então, recorrendo à caça e pesca.
No entanto, por não ter certidão de nascimento, McGlaughlin não conseguiu obter um cartão de cidadão canadiano, número de segurança social, passaporte, carta de condução ou cartão de saúde.
Também não se pode “candidatar a um emprego, nem votar, nem mesmo casar” com a mãe dos três filhos.
McGlaughlin tinha uma entrevista marcada com o Ministério da Cidadania e Imigração do Canadá em outubro de 2010, mas como sofreu um “ataque cardíaco quase fatal” foi levado para um hospital em Victoria e faltou à reunião.
A entrevista foi remarcada e realizou-se no início de 2011, altura em que o agente da imigração decidiu suspender uma ordem para a sua “deportação do Canadá”.
Depois dessa entrevista, McGlaughlin teve mais três ataques cardíacos.
Num dos casos teve de ser internado e no outro necessitou de transporte aéreo. Por não ter cartão de saúde, os custos destes serviços são muito elevados.
McGlaughlin já entregou às autoridades um pedido de cidadania, alegando uma “dificuldade especial e fora do comum”.
Até vai a pé, se o coração deixar
Entretanto, Nancy Caron, porta-voz do Ministério da Cidadania e Imigração (CIC), explicou em declarações à comunicação social canadiana que McGlaughlin apresentou um pedido no final de setembro, mas o documento não continha “informação suficiente para demonstrar há quanto tempo vive no Canadá”.
Caso este pedido não seja aceite, McGlaughlin terá pedir o estatuto de refugiado político, que lhe permitiria permanecer no país.
Também neste caso terá dificuldades acrescidas porque os documentos têm de ser entregues pessoalmente no gabinete da imigração, a centenas de quilómetros de distância.
McGlaughlin não tem carta de condução e não pode comprar um bilhete de autocarro porque lhe exigem a identificação, mas está determinado a resolver a sua situação.
Nem que tenha de percorrer a distância a pé, confiando que o coração não o traia.
/Lusa