Sampaio da Nóvoa acha que a realidade do ensino está pior, por causa da COVID-19: novas e profundas desigualdades foram criadas.
A escola viveu séculos de muitos progressos mas nas últimas décadas tornou-se local de protestos, queixas, mal-estar. E agora está pior.
António Sampaio da Nóvoa, titular de uma Cátedra UNESCO sobre os futuros da educação, falou sobre o ensino e acha que a COVID-19 piorou o cenário.
“A realidade está pior. A pandemia cavou novas e profundas desigualdades. Segundo a UNESCO, no mundo, metade dos alunos terminam a escola sem terem aprendido praticamente nada. É inaceitável”.
“Muitos consideram que é preciso investir mais na educação. Têm razão. Mas não basta. É preciso também que haja uma metamorfose da escola, uma mudança da forma e da configuração da escola”, afirmou, em entrevista ao Diário de Notícias.
Sampaio da Nóvoa acha que não vale a pena esperar por uma “novidade extraordinária, que venha de uma lei, de uma reforma, de um método ou de uma tecnologia”. A novidade já existe nas escolas que inovam, que mudam. “E que precisamos de conhecer, estudar, repertoriar e partilhar. É a partir destas experiências que podemos, em conjunto, pensar e construir novas formas de educar”.
O antigo embaixador de Portugal na UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – abordou o ensino superior, ao dizer que “a essência de uma universidade está na diferença”.
“A universidade é um lugar único, marcado pela relação inter-geracional e pelo diálogo entre todas as formas de conhecimento. Quando procura copiar as lógicas de funcionamento e as métricas das outras instituições, a universidade empobrece-se e torna-se irrelevante”, analisou.
E citou o filósofo Michel Serres: “A hiper-especialização conduz à formação de duas populações de imbecis: os instruídos incultos, cientistas que não querem saber nada da cultura geral, humanística; e os cultos ignorantes, letrados que ignoram totalmente a matemática, a física ou a biologia”.
Por outro lado, o “hiper-produtivismo está a transformar as universidades em fábricas de artigos, autores sem leitores, produções sem sentido, com riscos sérios para a integridade e a originalidade do trabalho científico. Medir é preciso, mas a razão de ser de uma universidade está muito para além do que se pode medir no imediato”.
Sampaio da Nóvoa acha que a maior utilidade das universidades é cultivar o que não parece ter “utilidade imediata” mas que, mais à frente, é “a coisa mais útil”.
“Numa sociedade híper acelerada, permanentemente ocupada, 24 horas por dia, 7 dias por semana, espera-se da universidade um processo de desaceleração, uma forma diferente de pensar e de agir para, assim, ser “útil” às sociedades. É preciso dar tempo ao tempo, devolver o tempo às universidades. E à ciência”, completou.
Depósito de miudos com um letreiro que diz escola