A CGTP defende que o Orçamento do Estado para 2022 e as futuras políticas do novo Governo têm de garantir uma mudança de modelo de desenvolvimento do país e responder às reivindicações dos trabalhadores, que estão cada vez mais descontentes.
Os baixos salários, o empobrecimento dos trabalhadores, a desregulação dos horários de trabalho, a elevada precariedade e o bloqueio da contratação coletiva são as principais prioridades apontadas pela secretária-geral da CGTP, Isabel Camarinha, em entrevista à Lusa.
“É preciso alterar as opções. Foi isso que dissemos ao primeiro-ministro na reunião da semana passada. Quer em relação às alterações à legislação laboral, quer em relação às opções políticas gerais, quer em relação ao Orçamento do Estado (OE) para 2022″, disse a sindicalista.
Camarinha defendeu que as opções do Governo têm de garantir a alteração do atual modelo de baixos salários, promovendo o crescimento geral dos salários, e garantir medidas para erradicar a precariedade.
A sindicalista lembrou que Portugal é o país da União Europeia (UE) com mais precariedade laboral, com os horários mais desregulados e onde os trabalhadores fazem maior número de horas de trabalho por semana.
“Precisamos de alterar isto”, disse, acrescentando que, assim, os trabalhadores não conseguem organizar a sua vida, o que tem levado também à intensificação da ação reivindicativa.
Para a CGTP é fundamental e urgente alterar a legislação laboral de modo a retirar dela a possibilidade de caducidade das convenções coletivas, “para obrigar as empresas a negociar” melhores condições de trabalho.
“Negociando encontram-se formas de garantir o progresso social, porque a contratação coletiva tem que ser um instrumento de progresso social”, considerou Isabel Camarinha.
Embora a contratação coletiva, a negociação nas empresas e setores privados não dependa do Governo, a CGTP tem responsabilizado também o executivo pela situação de bloqueio porque este não tem feito as alterações legislativas necessárias para inverter a situação.
A secretária-geral da CGTP salientou que o Governo tem ainda outras formas de incrementar o aumento dos salários, mas não o tem feito.
“Logo à partida valorizando os trabalhadores da Administração Pública (…), o Governo pode e deve decidir, mas também não o tem feito”, disse a sindicalista lamentando que o Governo não tenha dado esse sinal ao setor privado.
A sindicalista lembrou que o PS fez promessas aos trabalhadores durante a campanha eleitoral e na Agenda do Trabalho Digno, que “não dão resposta aos problemas dos trabalhadores”.
“Isto precisa de ser alterado. Nem no OE nem nas promessas feitas encontramos as respostas necessárias para os problemas dos trabalhadores e da população em geral”, disse.
A secretária-geral referiu que a falta de valorização dos trabalhadores, dos salários e das carreiras e profissões leva a que, nomeadamente, os jovens continuem a emigrar à procura de uma vida melhor.
“O que se tem vindo a fazer não está a reter os jovens qualificados. (…) Temos de alterar isto, não pode ser só propaganda”, considerou, acrescentando que está nas mãos do Governo e da Assembleia da República inverter a situação.
Isabel Camarinha salientou que o PS, com a maioria absoluta obtida nas últimas eleições legislativas “tem todas as condições para alterar a situação” dos jovens, mas lembrou que este partido também tinha condições para fazer as necessárias alterações na anterior legislatura e não o fez.
Eleições não resolveram problemas
Para a secretária-geral da CGTP, os problemas dos trabalhadores não se resolveram com as eleições, por isso, a central vai intensificar a ação reivindicativa para pressionar a promoção de medidas que melhorem a vida dos portugueses.
“Os problemas dos trabalhadores e do país que existiam antes das eleições, continuam a existir, não se resolveram com as eleições e continuam a exigir respostas”, disse.
Segundo a líder da Intersindical, as eleições “não eram necessárias”, porque “existiam condições para fazer alterações na proposta de Orçamento do Estado, de forma a que ela fosse viabilizada na Assembleia da República”, desde que o Governo tivesse abertura para isso.
Para a sindicalista, a maioria absoluta conseguida pelo PS não é por si só uma garantia de que a situação dos trabalhadores e do país vai melhorar.
“As maiorias absolutas nunca foram favoráveis aos trabalhadores, porque um partido com maioria absoluta tem tendência para não ouvir os outros e seguir com as suas opções, unicamente as suas”, referiu.
Isabel Camarinha reconheceu que foram recuperados alguns direitos e rendimentos após o período de intervenção da troika, com os governos de António Costa, mas lembrou que “a relação de forças na Assembleia da República era diferente”.
“Com a maioria absoluta vamos ver“, disse.
A sindicalista considerou que “está nas mãos do Governo e da Assembleia da República” dar as respostas que os trabalhadores e o país precisam.
Para a sindicalista é inaceitável continuar com o atual modelo de baixos salários, que não se resolve apenas com o aumento do salário mínimo nacional, dado que os restantes salários têm vindo a desvalorizar-se, tal como as profissões qualificadas e as carreiras.
“Atualmente cerca de um milhão de trabalhadores recebe o salário mínimo, o que é inaceitável, porque este montante não garante condições de vida dignas”, disse, justificando as reivindicações da CGTP de aumentos salariais gerais de 90 euros e um salário mínimo de 850 euros a médio prazo.
De outra forma os trabalhadores continuarão a empobrecer porque não terão capacidade para enfrentar “o brutal aumento do custo de vida”, defendeu.
Por isso, Isabel Camarinha deixou o desafio ao Governo para que responda a estes problemas e que isso seja entendido como “um investimento no desenvolvimento do país”.
Defendeu ainda que, “para as empresas, valorizar os trabalhadores tem que ser um investimento“. “É preciso aumentar o poder de compra dos trabalhadores e isso só é possível com salários”, disse a sindicalista acrescentando que a melhoria dos salários irá dinamizar a economia, pois os trabalhadores poderão consumir mais.
Segundo a líder da Inter, as empresas também irão beneficiar da melhoria das condições de vida dos portugueses dado que a maioria vive do mercado interno.
Mas como as empresas não estão a ir ao encontro das reivindicações dos trabalhadores e sindicatos e a CGTP não está muito otimista em relação à governação socialista, os órgãos da central, o Conselho Nacional e o Plenário de Sindicatos, já decidiram “intensificar a ação reivindicativa”.
“A CGTP intensificará a luta sempre que não houver resposta às necessidades e reivindicações dos trabalhadores”, disse Isabel Camarinha à Lusa, negando tratar-se de um aviso ao Governo.
Tudo depende das respostas dadas ou da ausência de respostas, garantiu.
A posição de desconfiança relativamente ao novo Governo, que ainda não está formado, tem também a ver com a atuação do Governo cessante, assumiu.
Isabel Camarinha assegurou que as críticas que a central tem assumido relativamente à atuação do Governo não têm causado divergências internas, nomeadamente com a corrente sindical socialista, porque as posições reivindicativas da CGTP são normalmente consensuais.
// Lusa