Lixo amontoou-se nas ruas da principal cidade de Myanmar esta terça-feira, após os manifestantes terem levado a cabo uma “greve do lixo” para se opor ao regime militar, numa onda de protestos que já matou mais de 500 pessoas desde o golpe de 1 de fevereiro
De acordo com a agência Reuters, uma campanha de greves de desobediência civil paralisou grande parte da economia. Numa nova tática, os manifestantes procuraram intensificar a campanha, pedindo aos moradores que deixassem o lixo nos cruzamentos da principal cidade de Yangon.
“Esta greve de lixo é uma greve para se opor à junta”, lia-se nas redes sociais. “Todos podem participar.”
Milhares de manifestantes também saíram para marchar em várias outras cidades do país esta terça-feira.
Myanmar está em crise desde que o exército depôs um governo eleito liderado pela vencedora do Nobel Aung San Suu Kyi, impondo o regime militar após uma década de tentativas de democracia.
Pelo menos 512 civis foram mortos em quase dois meses de protestos contra o golpe, 141 deles no sábado, o dia mais sangrento dos protestos, de acordo com o grupo de defesa da Associação de Assistência a Presos Políticos (AAPP).
Esta segunda-feira, 14 civis foram mortos, incluindo pelo menos oito no bairro de South Dagon em Yangon. As forças de segurança também dispararam e mataram um homem na cidade de Kawthaung, no extremo sul, enquanto limpavam as ruas, informou o portal Mizzima.
As forças de segurança dispararam uma arma de calibre mais pesado do que o normal contra os manifestantes agachados atrás de uma barricada de sacos de areia. A televisão estatal revelou que as forças de segurança usaram “armas de choque” para dispersar uma multidão de “terroristas violentos” que estavam a destruir uma calçada e um homem ficou ferido.
Conselho de Segurança da ONU reúne-se de urgência
Os 15 membros do Conselho de Segurança iniciarão a sessão de quarta-feira, que acontecerá à porta fechada, com um briefing sobre a situação em Myanmar, que será feito pela enviada especial da ONU, Christine Burgener.
Para já, ainda não há nenhuma certeza de que o Conselho de Segurança das Nações Unidas possa chegar a um acordo sobre uma nova declaração, no final da reunião, sendo para tal necessária unanimidade dos membros, incluindo a China e a Rússia.
Em 10 de março, o Conselho de Segurança condenou “fortemente a violência contra manifestantes pacíficos, incluindo mulheres, jovens e crianças”, numa declaração suscitada pelo Reino Unido, que condenou a junta militar de Myanmar.
Apesar das tentativas dos países ocidentais, o Conselho recusou fazer qualquer menção à possibilidade de sanções internacionais, caso a repressão continuasse, devido à oposição da China e da Rússia, bem como de outros países asiáticos, como a Índia e o Vietname.
No dia 4 de fevereiro, um primeiro texto do Conselho de Segurança da ONU, também elaborado por Londres, deixou um sinal de unidade entre os países membros, mas limitou-se a evocar “profunda preocupação” com a situação em Myanmar, também sem qualquer referência à eventualidade de sanções contra Myanmar.
Esta segunda-feira, o secretário-geral da ONU, António Guterres, condenou a violência “absolutamente inaceitável” registada em Myanmar no último fim de semana. “É absolutamente inaceitável ver violência deste nível contra pessoas, tantas pessoas mortas, e uma recusa tão obstinada em aceitar a necessidade de libertar todos os presos políticos e de colocar o país novamente no caminho de uma transição democrática séria”, afirmou.
“Precisamos de mais unidade [no seio] da comunidade internacional, mais empenho (…) para exercer pressão no sentido de inverter a situação”, apelou o secretário-geral da ONU. “O antigo sistema não era o ideal, mas não há comparação com a situação atual”
Também a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou, na segunda-feira, que as “atrocidades” no Myanmar devem “parar agora”. “Condeno veementemente a violência perpetrada contra o povo do Myanmar. As atrocidades têm de parar agora”, escreveu Von der Leyen no Twitter.
A presidente da Comissão Europeia acrescentou que a União Europeia (UE) está a trabalhar para “parar com esta violência contra o próprio povo do Myanmar”, criar um “processo político adequado” e “libertar todos os detidos”.
Maria Campos, ZAP // Lusa