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Coreia do Norte pode estar a usar fábricas de fertilizantes para extrair urânio

(dv) KNS / KCNA

O líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un

Um novo estudo norte-americano mostra que a Coreia do Norte pode estar a utilizar fábricas de fertilizantes para produzir mais material nuclear, extraindo urânio de ácidos fosfóricos.

Segundo noticiou o Newsweek, na opinião da investigadora Margaret Croy, responsável pelo estudo, esse método pode estar a ser usado pela Coreia do Norte – oficialmente conhecida como República Popular Democrática da Coreia (RPDC) – para ocultar a obtenção de urânio, como parte do esforço do país para aumentar também a produção agrícola.

Caso esteja a construir fábricas de fertilizantes para esse fim, a Coreia do Norte “tem o potencial de alterar consideravelmente as estimativas sobre a quantidade de urânio que é capaz de produzir anualmente, afetando, por sua vez, as estimativas sobre quantas ogivas nucleares pode produzir”, disse.

Croy, investigadora associada do Instituto Middlebury de Estudos Internacionais no James Martin Center for Nonproliferation Studies, em Monterey, nos Estados Unidos (EUA), apresentou este argumento no artigo “Uso Duplo na RPDC: Extração de Urânio em Fábricas de Fertilizantes de Fosfato”, recentemente publicado.

Neste estudo, a cientista construiu um caso circunstancial para demonstrar que o método referido pode estar atualmente em uso, embora não prove que o país esteja de facto a produzir urânio a partir de fábricas de fertilizantes. Antes de publicado, o artigo foi revisto por um painel interno de investigadores.

À Newsweek, Croy explicou que se deparou com o método de extração de urânio a partir de ácido fosfórico ao realizar pesquisas sobre atividades nucleares na Síria – onde norte-coreanos teriam prestado assistência -, depois no Egito e no Iraque.

Após ler o artigo “Phosphate fertilizers as proliferation-relevant source of uranium”, escrito por Robert Kelley e Vitaly Fedchenko e publicado no EU Non-Proliferation Consortium em maio de 2017, que fala sobre esse método, Croy disse ter percebido que “ainda não tinha visto ninguém conectar esse método de aquisição de urânio à RPDC”.

(h) KCNA / YONHAP

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“Uma pesquisa inicial rápida e superficial da indústria de fertilizantes fosfatados na Coreia do Norte revelou que esta é uma indústria na qual a liderança da RPDC estava a gastar muito tempo, dinheiro e energia”, referiu Croy à Newsweek.

“Embora a RPDC necessite de melhores fertilizantes para lidar com as numerosas carências nas plantações, dado o histórico de sucesso com este método noutros países, a crescente pressão internacional para ‘reverter’ os seus programas nucleares e a priorização do regime de Kim em criar um dissuasor nuclear nacional, senti que precisava de investigar mais”, sublinhou.

E acrescentou: “Dez meses depois, a pesquisa transformou-se num projeto muito maior do que inicialmente suspeitava, mas havia uma riqueza de evidências para pesquisar”.

Como apontou o Newsweek, a Coreia do Norte tem enriquecido o nível de armas de urânio, considerando o seu programa nuclear um elemento central de segurança nacional diante do que considera uma agressão estrangeira dos EUA. No passado, construiu ogivas nucleares e lançou mísseis balísticos intercontinentais, apesar das sanções internacionais.

Contudo, de acordo com o Tratado de Não-Proliferação Nuclear, a Coreia do Norte não é um estado nuclear reconhecido, visto que Pyongyang retirou-se do pacto em 2003. Em 2006, o país testou o seu primeiro dispositivo nuclear, seguidos de outros cinco. Em setembro de 2017, conduziu a sua detonação mais poderosa.

O líder supremo Kim Jong Un acelerou os esforços nucleares no país, ao mesmo tempo que investiu no desenvolvimento económico e das infraestruturas. Nas semanas entre os dois primeiros testes com mísseis balísticos intercontinentais, em julho de 2017, a media norte-coreana anunciou a criação da Fábrica de Fertilizantes Fosfáticos Sunchon.

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“A fábrica tem um significado importante no aumento da produção agrícola, produzindo mais fertilizantes”, informou na época a agência de notícias estatal da Coreia do Norte. Foi nesta fábrica que Croy concentrou o seu estudo.

Embora reconheça que outros locais de produção de fertilizantes fosfatados podem ter servido como parte de “um programa piloto” para extração de urânio, a investigadora acredita que Sunchon – ainda em construção – é potencialmente o primeiro desses locais onde será possível “realizar atividades de extração de urânio em grande escala”.

“Acho que a pressão que Kim Jong Un tem enfrentado para ‘desnuclearizar’ desde que assumiu o poder (particularmente desde 2017) é muito significativa e imagino que essa pressão possa fazer com que a liderança da RPDC examine mais de perto as opções para continuar a criar material nuclear, silenciosamente se necessário, e acho que este método pode servir”, afirmou Croy.

A falta de dados oficiais sobre a produção de urânio e fosfato da Coreia do Norte dificulta a determinação do impacto deste processo nos estoques de urânio do país, mas as estimativas divulgadas do estudo – baseadas em números de produção anual publicados pelo Nautilus Institute for Security and Sustainability -, mostram uma percentagem de recuperação de 25% – em comparação com a taxa dos EUA, que varia entre 92 e 95%.

“Se considerarmos a recuperação de todas as fábricas que não têm os seus números de produção anuais publicados, o número hipotético torna-se rapidamente maior”, continuou Croy. “Certamente não pretendo sugerir que esse nível de produção esteja a ocorrer atualmente, mas que é uma possibilidade com a qual devemos estar em sintonia”.

As tensões entre os EUA e a Coreia do Norte diminuíram significativamente depois de 2017, mas a falta de progresso na obtenção de um acordo para a desnuclearização desestabilizou novamente essa relação. Até agora, Kim manteve uma moratória autoimposta em 2018 sobre testes nucleares mas, na véspera de Ano Novo, afirmou que não se sentia mais obrigado em segui-la.

ZAP //

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