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Lagarde quer usar o BCE para combater as alterações climáticas. Bundesbank discorda

WEF / Wikimedia

Christine Lagarde

Christine Lagarde só na sexta-feira toma posse como presidente do Banco Central Europeu (BCE), mas as discordâncias com o Bundesbank já começaram. A ex-líder do Fundo Monetário Internacional (FMI) pretende usar o ‘quantitative easing’ (prática de os bancos centrais comprarem títulos do tesouro ou outras obrigações financeiras para injetar liquidez na economia) para promover causas verdes.

“Vejo exigências de uma política monetária verde, por exemplo sob a forma de ‘QE’ verde (…) muito criticamente. Essas decisão não devem ser tomadas por banqueiros centrais, pois eles não estão democraticamente legitimados”, disse Jens Weidmann, presidente do Bundesbank, citado pelo Expresso na quarta-feira.

O Financial Times, que divulgou na quarta-feira a notícia, lembrou que o banqueiro alemão foi um opositor determinado do programa de ‘quantitative easing’ que ficou associado ao mandato de Mario Draghi – um programa que muita gente acredita ter salvo o euro numa altura crítica.

Christine Lagarde, pela sua parte, considera essencial combater as alterações climáticas e tem defendido o investimento em obrigações verdes, sujeito a certas condições. Esse investimento, em princípio, seria acompanhado por uma redução da compra de títulos emitidos por empresas responsáveis por níveis elevados de emissões de CO2.

Concordando com o objetivo último, Jens Weidmann acha que a regulação bancária não deve ser usada para o promover, até pelo risco de as pressões externas acabarem por levar a uma perda de independência dos bancos centrais.

Mais investimento da Alemanha e da Holanda

Esta quinta-feira termina o mandato de oito anos de Mario Draghi como presidente do BCE e começa um novo estilo na instituição, sob a tutela de Christine Lagarde. Mais verbal e mais virado para pressionar os governos, referiu o Diário de Notícias.

Agora, os banqueiros centrais do euro têm de descer da sua “torre de marfim”, como disse o vice-presidente do BCE, Luis de Guindos, numa entrevista ao El País, e interpelar diretamente os Estados porque alguns estão em falta há já algum tempo. É preciso agir contra uma eventual crise.

Julien Warnand / EPA

Christine Lagarde e Mario Draghi

A nova era de Christine Lagarde terá como mote inicial a necessidade imperiosa de completar a resposta política (com a parte orçamental), como lembrou Mario Draghi, nas suas últimas intervenções como presidente do BCE.

A autoridade monetária garante que fez a sua parte (juros historicamente baixos, estando virtualmente no limite das suas capacidades, com fraturas internas já visíveis). Assim, disse que a bola está do lado dos governos: os que podem, e muitos já podem porque não têm défices nem dívidas monumentais, têm de gastar e de investir mais.

De acordo com o Diário de Notícias, a conjuntura económica parecia encaminhada. Havia dinheiro abundante e barato, algum investimento, as exportações estavam a crescer, mas em setembro tornou-se claro que o ciclo inverteu para pior, com guerras comerciais, guerras de facto e o ‘Brexit’.

“Os países com excedentes [orçamentais] crónicos no orçamento, como Holanda e Alemanha, precisam de investir mais para apoiar o crescimento. Eles não fizeram realmente os esforços necessários”, atirou Christine Lagarde. “Partilhamos uma moeda, mas não muita da política orçamental, por enquanto”, lamentou.

A maior pressão do BCE sobre os governos tem muitas razões de ser. Desde 2015 que está em marcha um enorme programa de compra de obrigações, muitos países endividam-se a taxas de juro de quase zero, quando não mesmo negativas.

Dívida causa fraturas no BCE

Segundo o Diário de Notícias, o BCE está a carregar com dívidas nacionais no seu balanço, o que pode pôr em causa a independência da instituição, além de representar um risco financeiro substancial se alguma coisa correr pelo pior, o que já está a levar a dissidências internas graves.

bankenverband / Flickr

O presidente do Bundesbank, Jens Weidmann

“A retoma de um programa de compra de ativos, adotada por uma maioria clara, ainda foi fortemente criticada. E, notavelmente, pela primeira vez na história do BCE, surgiram fugas a revelar que o Comité de Política Monetária [o corpo técnico de especialistas do BCE e dos bancos centrais nacionais] se tinha posicionado contra qualquer nova flexibilização quantitativa (QE)”, observou Franck Dixmier, chefe da divisão de obrigações da Allianz Global Investors.

Sabine Lautenschläger, a alemã que fazia parte do comité executivo do BCE, anunciou a sua demissão por causa da segunda vaga de compra de ativos, anunciada em setembro. Esteve contra essa decisão, tal como o seu colega e compatriota Jens Weidmann, que governa o Bundesbank.

Clemens Fuest, o presidente do Ifo, é também um crítico das compras de obrigações. “Não se espera que essas compras tenham um impacto percetível na inflação.” Pelo contrário, “elas reforçam distorções no mercado de capitais e também implicam riscos de formação de bolhas especulativas”.

“O BCE está a tentar aumentar a inflação com um pé-de-cabra”, atirou o economista do instituto de estudos económicos sediado em Munique.

Mario Draghi discordou. “Infelizmente, tudo o que aconteceu em setembro, mostra que as nossas decisões de política monetária eram justificadas”.

O Bundesbank está contra planos públicos de investimento contra a crise, mas aceita que algo vai mal na maior economia do euro. A economia alemã pode ter registado “uma nova contração” no terceiro trimestre, o que, a verificar-se, significa que o país está oficialmente em recessão técnica, embora este banco central diga que ainda não é uma coisa severa.

ZAP //

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