A mulher que em fevereiro deste ano tentou sequestrar uma recém-nascida no Hospital de São João, no Porto, consultou processos clínicos no balcão do secretariado de Obstetrícia, chegando mesmo a levar um deles, indica a acusação do processo.
“Foi ao balcão do secretariado – que estava fechado por ser sábado – e aí consultou alguns processos. Após consultar alguns processos clínicos que ali se encontravam, pegou num deles de modo a dar maior credibilidade à identidade de médica que pretendia assumir”, refere a acusação do caso, deduzida pela 10.ª secção do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) do Porto e consultada pela agência Lusa.
A investigação refere que a mulher entrou “de forma não apurada e não autorizada” na Obstetrícia, cerca das 19h00 de 2 de fevereiro, mas não especifica se o fez pela zona para visitas ou para profissionais, sendo certo que nos dois casos é preciso exibir cartões comprovando a condição da pessoa.
“Para poder circular no hospital sem levantar suspeitas, decidiu identificar-se como médica, vestindo para o efeito uma bata descartável azul e colocando um estetoscópio ao pescoço”, diz apenas a acusação.
Logo após a divulgação do caso, o Hospital de São João anunciou a abertura de um inquérito interno para “esclarecimento completo” da tentativa de sequestro da bebé, mas uma fonte oficial da unidade disse à agência Lusa que as conclusões só serão divulgadas após o processo judicial.
O DIAP acusa a mulher, que se encontra atualmente em prisão domiciliária com vigilância eletrónica, da prática de um crime de sequestro agravado, na forma tentada. O processo sustenta que a mulher, de 48 anos, simulou a gravidez e tentou sequestrar a recém-nascida “com o propósito de retomar a relação amorosa que anteriormente mantinha” com um homem.
Na altura dos factos, a versão publicitada era a de que a mulher pretendia “substituir” uma bebé que perdera, três meses antes, na sequência de uma gravidez de risco. Ainda segundo o processo, a arguida e o seu namorado tinham interrompido uma relação que durara quase um ano e, em outubro de 2018, “retomaram pontualmente os contactos pessoais e de cariz sexual”.
Na sequência de uma discussão, a mulher mentiu-lhe, com o alegado propósito de estabilizar a relação, anunciando uma falsa gravidez e o propósito de a levar até ao fim. Fez pelo menos duas montagens de imagens ecográficas de um feto, “onde introduziu um cabeçalho falso com o seu nome aposto”, espalhou pela casa roupa de bebé e, já em 24 de janeiro de 2019, a arguida contacta telefonicamente o homem comunicando-lhe que a filha de ambos tinha nascido prematuramente e que se iria chamar Vitória.
“A arguida sabia que não tinha estado grávida, nem tinha tido nenhum bebé, mas, querendo manter a relação e a história que tinha forjado, decidiu então arranjar’um bebé”, o que tentou naquele final de tarde de 2 de fevereiro de 2019, um sábado, na Obstetrícia do São João.
Além da bata e do estetoscópio, para se fazer passar por médica, levava consigo um casaco e uma mochila, com o alegado propósito de nela trazer a bebé. Entrou e saiu do berçário e depois da sala de internamento.
Ao ser interpelada por uma auxiliar de ação médica, responde que era médica e estava à espera do processo de uma parturiente que identificou. Pediu para pegar na sua bebé ao colo, mas o seu comportamento suscitou desconfiança ao pai da recém-nascida que, entretanto, entrou no quarto.
Temendo que o pai da criança se apercebesse dos propósitos, a arguida entregou a bebé a outro familiar que também ali se encontrava, pegou no casaco e na mochila e saiu do quarto, relata a acusação. Acabou intercetada por funcionários do hospital, entretanto alertados pelo pai da criança, que manteve a desconfiança quanto ao comportamento da mulher.
// Lusa