Número de eleitores que não votam pode, afinal, estar a ser inflacionado, em grande parte devido aos emigrantes que escolheram não alterar a morada do cartão de cidadão, não sendo, por isso, incluídos no recenseamento automático, pelo que continuam a constar nos cadernos eleitorais dos concelhos onde residiam.
Afinal, a abstenção em Portugal pode não ser tão elevada como se pensa. O jornal Público dedicou-se a a auscultar especialistas em Ciência Política e, na sua edição de hoje, concluiu-se que, por diversos fatores, os números apresentados de forma sucessiva nas noites eleitorais podem não estar assim tão próximos da realidade.
Primeiramente, a diferença entre eleitores recenseados (9,3 milhões de pessoas) e a população residente com idade para votar (8,6 milhões de pessoas). Esta diferença foi, segundo os especialistas, especialmente gritante nas eleições legislativas de 2019, cuja abstenção ultrapassou os 51,43%. Nesse ato eleitoral, caso fosse retirada da equação a abstenção correspondente à população portuguesa residente no estrangeiro, que corresponde a 90%, o número de abstenção no território nacional baixaria para 45% ou 46%.
Aquando da alteração legislativa de 2018, na qual foi introduzido o recenseamento automático, mais de 1,4 milhões de eleitores foram acrescentados aos cadernos eleitorais, sendo contabilizados os seus nomes para eleições legislativas e presidenciais — nas autárquicas só podem votar os residentes em território nacional. Pelo que assim se explica a diferença de eleitores nas eleições presidenciais (10,8 milhões) e autárquicas (9,3 milhões).
Ainda a propósito das eleições autárquicas, o facto de muitos emigrantes não alterarem a sua morada faz com que ainda constem nos cadernos eleitorais, apesar de já não estarem elegíveis para votar — o que também contribuiu para números mais elevados da abstenção, ou seja, mais um fator a ter em consideração quando se avança com números referentes ao abstencionismo que, na realidade, pode não ser tão real como se pensava.
Como não alteram a morada, estes eleitores, para além de serem incluídos nos cadernos eleitorais para as eleições autárquicas, integram, nas eleições legislativas e presidenciais. também os valores de abstenção em território nacional, quando, na realidade, deveriam ser incluídos nos números de abstenção relativos aos círculos da emigração.
Finalmente, um terceiro fator que dever ser tido em conta, apesar de há muito ser conhecido das autoridades oficiais, é o dos “eleitores fantasmas“, ou seja, pessoas que já não se encontram vivas mas que tal facto ainda não foi comunicado às conservatórias do Registo Civil — apesar de a Secretaria-Geral da Administração Interna (SGMAI) garantir que estes se tratam de casos “residuais“.
De forma a terminar com os valores de abstenção que não correspondem à realidade, os especialistas ouvidos sugerem uma revisão do regime jurídico do recenseamento eleitoral, com a limitação ao voto dos emigrantes a surgir logo no topo de medidas que devem ser introduzidas, defendem.