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40 anos depois, Charles Manson ainda fascina

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California Department of Corrections and Rehabilitation / Wikimedia

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Líder de uma seita assassina, o americano Charles Manson, de 80 anos, recebeu este mês o direito de se casar na prisão com uma jovem de 26 anos.

O caso, com grande destaque na imprensa internacional tem levantado a questão: como é que um homem, que cometeu os seus crimes há quase 45 anos, continua a fascinar pessoas nos Estados Unidos?

O olhar é o mesmo. Os cabelos estão brancos, mas a barba permanence. Com uma suástica tatuada entre os olhos, Charles Manson cultiva uma aura.

Há quase 45 anos, Charles Manson enviou um grupo de seguidores – conhecidos como a “Família” – para a casa da atriz americana Sharon Tate, na altura casada com o realizador Roman Polansky e grávida de oito meses.

Tate, que ficou famosa na década de 1960, morreu esfaqueada, juntamente com quatro outros amigos que estavam na casa.

Guerra entre raças

O grupo espalhou na altura pistas falsas no local de forma a tentar incriminar os Panteras Negras – grupo de ativistas afroamericano que recorria à violência na sua luta contra o racismo.

Manson esperava que estes assassinatos – como também os homicídios cometidos na noite seguinte a dois donos de lojas – promovessem uma guerra entre raças.

Na sua ideia, pretendia aguardar o fim desse conflito para depois emergir como um governante dos Estados Unidos.

Tal acabou claramente por não acontecer. Envolvido pelo repúdio generalizado da população, Manson foi declarado culpado de conspiração para assassinato em 1971 e cumpre actualmente uma pena de prisão perpétua.

Charles Manson recebeu recentemente autorização para casar com Afton Elaine Burton, de 26 anos. A jovem mudou-se da região centro-oeste dos Estados Unidos para Corcoran, na Califórnia, de forma a conseguir ficar mais perto da prisão onde Manson cumpre a sua sentença.

“Amo-o. Estou com ele”, afirmou Burton. Será, contudo, difícil um dia a jovem conseguir viver com Manson, uma vez que só aos 80 anos ele terá direito à liberdade condicional, no ano de 2027.

“Por que será que uma mulher de 26 anos quer casar com ele?”, pergunta Daniel Kane, professor de literatura e cultura americana da Universidade de Sussex. “Isto mostra a atração contínua que ele representa para a contracultura hoje. Manson o rebelde, o fora da lei, o radical vegetariano que se dispôs a matar para atingir o seu objetivo”.

“Esta é uma situação revoltante e demente, mas é também fundamentalmente política, da mesma maneira que um terrorista contemporâneo é político”.

Debra, irmã de Tate, que atua como porta-voz das famílias das vítimas de Manson, classificou este casamento como “ridículo”. Contudo, esta e outras notícias relacionadas a Charles Manson continuam a ser difundidas na imprensa.

Mais de 30 livros sobre a sua vida e os crimes cometidos foram publicados. Um deles pelo procurador que actuou no caso, Vincent Bugliosi, que vendeu mais de 7 milhões de cópias desde 1974.

Preso político

As declarações de Manson sobre a sua sentença ainda se mantêm. Afirma ser um “preso político” e que foi mantido “refém” pelo governo. “Sou filho do sistema… Sou apenas o que fizeram de mim. Sou um reflexo de vocês”, afirmou.

Manson nasceu em Ohio, órfão de pai, e teve uma infância pobre e conturbada. Com um QI supostamente elevado, mas incapaz de ler ou escrever adequadamente, passou por várias casas de correcção. A sua mãe e tio foram presos quando tinha 5 anos e aos 13 já assaltava lojas e casinos.

Manson tem “uma tendência para o mau humor e um complexo de perseguição”, de acordo com um psiquiatra que também o descreveu como “agressivamente antissocial”, em parte originada por uma “vida familiar desfavorável, se é que isso se pode chamar de vida familiar”.

Quando não conseguia pagar as contas ou ajudar na gravidez da sua mulher, Manson tornou-se  ladrão. Após passar seis anos na prisão, foi libertado em 1967 – ano que, no auge do movimento hippie, ficou conhecido como “verão do amor”.

Fixação pela Helter Skelter, dos Beatles

Manson desenvolveu uma fixação pela música Helter Skelter, dos Beatles, que fala de forma ostensiva as dificuldades de uma vida amorosa contada através da metáfora de um passeio em um parque de diversões. Contudo, Manson associou a música a uma guerra apocalíptica de motivação racista.

Manson planeou, então, refugiar-se do improvável conflito, seguido pelo seu grupo, num local subterrâneo no deserto do Vale da Morte, na Califórnia. Desta forma, eles seriam os únicos sobreviventes brancos da guerra. No seu devaneio, o criminoso pensava que os negros, vencedores do conflito, não conseguiriam organizar-se e então pediriam-lhe que os liderasse.

Manson organizou, então, uma comunidade num rancho em Spahn, no deserto da Califórnia, próximo de cenários abandonados de filmes de faroeste da década de 1950. Recrutou seguidores, sendo a maioria mulheres de classe média, com as quais consumia LSD e participava em orgias.

“Manson conseguiu explorar a subcultura hippie de forma brilhante“, disse Kane à BBC. “Os hippies, acima de tudo, colocaram-se como outsiders do sistema político e social, comprometendo-se a criar as suas próprias utopias independentes, marcadas por sexo, drogas e rock and roll”.

State of California Website / Wikimedia

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“Manson incorporou todos esses sinais – LSD, música, amor livre, estilo de vida em comunidades – e reformulou-os em ferramentas para o seu assassínio em massa apocalíptico. Totalmente bizarro, demoníaco e muito, muito sedutor”.

Com seus cabelos longos e barba, os seguidores de Manson ligaram a sua aparência à de Jesus Cristo.

“Há milhares de vigaristas refinados e malignos, e tivemos homicidas mais brutais que Manson”, afirmou o promotor Bugliosi à revista Rolling Stone em 2012.

“Então por que razão ainda se fala de Charles Manson?”.

“Ele tinha uma qualidade que pouquíssimas pessoas tinham, uma aura. Uma ‘vibração’, como os se falava nos anos 60. Onde ele ia, os jovens gravitavam à sua volta”, disse Kane.

Psicopatas são “incrivelmente charmosos e persuasivos”, disse David Wilson, professor de criminologia da Universidade da Cidade de Birmingham, na Inglaterra.

“Quando controlam, parecem estar a dar toda a sua atenção”.

O caso de Manson envolvia drogas, orgias e cultos – três das grandes preocupações dos pais das crianças que cresceram na atmosfera do “amor livre” daqueles tempos. Este caso ocorreu também numa época de intensas divisões nos Estados Unidos sobre direitos civis, racismo e Guerra do Vietnam. Os protestos violentos atingiram diversas cidades em 1968.

Wilson afirma acreditar que a persistência de Manson como figura cultural decorre do fato dele parecer ter ensinado aos americanos sobre a negligência a ameaças que enfrentavam. Isso aliado a seu carisma pessoal teria feito seu impacto ser maior que o da maioria dos assassinos.

“Ele é icónico porque foi a pessoa que levou ao fim dos anos 60. Seu pensamento estranho e bizarro aparentava estar em perfeita sintonia com o lado destrutivo da cultura da droga. Não se tratava mais do poder das flores. A cultura jovem estava mais obscura e desruptiva do que as pessoas jamais tinham imaginado”.

ZAP / BBC

2 Comments

  1. Não era líder de nenhuma seita assassina, e não enviou alguém, nem esteve com as pessoas (as gajas uma das quais estava do lado do Grande Charles e de um momento para o outro converteu-se ao cristianismo e passou a estar contra o Grande.. ..dedicando a sua vida para o manter na prisão, porque será, dado o facto de ter sido a mesma a matar uma das vitimas..) conspirações e bodes-expiatórios, o objectivo de Charles Manson era criar uma comunidade livre do actual sistema, livre de dinheiro e da opressão que existe e é aceite, no meio do deserto, e não o deixaram, lavaram a cabeça a meia dúzia de pessoas que cometeram essas sim assassinatos por vontade própria e nunca por ordem de Charles Manson..

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