Morrem mais pessoas de enfarte agudo do miocárdio no Natal e no Ano Novo do que em qualquer outra época do ano. A estatística trágica levou ao aparecimento do chamado “síndrome do coração de Natal” que é um risco bem real – e grave.
O enfarte agudo do miocárdio é uma das principais causas de morte em Portugal, matando, em média, 12 pessoas por dia no nosso país. Todos os anos, há mais de 12 mil enfartes deste tipo que se caracterizam pela obstrução das artérias do coração.
Não há dados específicos quanto a Portugal e relativamente a estes incidentes de saúde no Natal e no Ano Novo em concreto. Mas estudos realizados noutros países indicam que esta época festiva está associada a um aumento na mortalidade devido a problemas cardíacos.
Foi isso mesmo que concluiu uma pesquisa publicada no British Medical Journal em 2018, com base no estudo de mais de 280 mil admissões em hospitais na Suécia devido a enfartes do miocárdio durante o período de 1998 a 2013.
As conclusões revelaram que o risco de sofrer um enfarte agudo do miocárdio aumentava em 37% na véspera de Natal, um dado que era particularmente elevado em pessoas com mais de 75 anos, com diabetes e/ou com antecedentes de doença coronária.
Já outro estudo publicado antes, em 2004, no jornal científico Circulation da Associação Americana do Coração, tinha concluído que os feriados de Natal e Ano Novo “são um factor de risco para a mortalidade cardíaca e não cardíaca” devido a “múltiplas explicações”, incluindo a possibilidade de “atrasos” na procura por tratamentos devido a este período festivo.
O que explica o aumento dos enfartes no Natal?
Há várias causas que têm sido apontadas nos estudos realizados em torno desta ideia da “síndrome do coração de Natal”. Mas um dos factores que se repete é o consumo de álcool que é mais recorrente nesta época de festas.
Há os brindes com colegas da empresa nos jantares de Natal do escritório, com amigos e com familiares nas noites bem regadas do Natal e do Ano Novo. Este “abuso” alcoólico acaba por ser especialmente prejudicial para o coração.
O álcool já afecta o coração quando é consumido em pequenas doses. Mas quando esse consumo se repete no tempo, e mais do que a conta, pode provocar um aumento da frequência cardíaca e facilitar o aparecimento de arritmias cardíacas.
Especialistas indicam que o consumo excessivo de álcool desta época pode induzir a fibrilação auricular, ou seja, uma anomalia no ritmo cardíaco. Quando o coração bate de forma irregular, não consegue bombear o sangue da forma correcta e isso pode causar coágulos perigosos.
Os excessos alimentares desta época festiva, especialmente no que se refere ao consumo de doces, também agravam os riscos da “síndrome do coração de Natal”.
Além disso, as pessoas tendem a descuidar a prática de exercício físico e algumas até se esquecem de tomar os medicamentos diários.
Também é uma altura de emoções fortes, com a reunião de familiares que nem sempre estão juntos, o que é outro factor de risco.
Para lá disso tudo, há ainda o stress da época devido à necessidade de preparar as festas e de comprar os presentes, ou mesmo de “fechar” o ano profissional da melhor forma.
Por outro lado, as pessoas preferem não recorrer aos serviços de urgência nesta época do ano, para não arriscarem estragar as festas – e isso acaba também por contribuir para um aumento na mortalidade.
Factores de risco
Algumas pessoas correm ainda maiores riscos, nomeadamente as mais idosas e as pessoas com antecedentes familiares de problemas cardíacos.
“A hipertensão arterial, o colesterol elevado, a diabetes, o tabagismo, a obesidade e o sedentarismo contribuem significativamente para aumentar o risco de sofrer de doença coronária”, refere a presidente da Associação Portuguesa de Intervenção Cardiovascular (APIC), Rita Calé Theotónio, em declarações citadas pelo portal Atlas da Saúde.
A APIC lançou, neste mês, uma campanha para sensibilizar a população para a importância de manter o seu coração saudável. Sob o lema “Este Natal dê um presente ao seu coração”, a Associação apela aos portugueses para terem cuidado com os excessos desta época festiva.
“É importante incentivar as pessoas a manterem hábitos alimentares equilibrados e saudáveis, a praticarem exercício físico, e lembrá-las de que devem manter os cuidados regulares com o coração, seguindo as orientações do seu médico”, destaca Rita Calé Theotónio.
Como se pode proteger nesta época festiva?
Não vamos dizer-lhe que deve evitar o álcool. É o melhor conselho, mas pode ser difícil fugir aos brindes com os amigos e a família. Por isso, se não o pode evitar, modere as quantidades de álcool que ingere.
Pelo meio, beba bastante água, pois a desidratação aumenta os riscos da “síndrome de coração de Natal”.
Rita Calé Theotónio recomenda ainda “não exagerar nos alimentos ricos em açúcar, gordura e sal” e “não fumar“.
“Além disso, é importante continuarmos activos, caminhar ou participar em actividades recreativas”, sugere ainda a presidente da APIC. Fazer caminhadas ou dar passeios em família são óptimas sugestões para esta época do ano – assim o tempo o ajude!
Tenha atenção a estes sintomas
Deve prestar atenção a sintomas como dor forte no peito que pode irradiar para o braço, suores, náuseas ou vómitos, falta de ar e ansiedade que podem indiciar um enfarte agudo do miocárdio.
Se suspeitar que está perante um incidente destes, ligue para o 112 que pode activar a “Via Verde Coronária” para agilizar um atendimento mais rápido no hospital.
Quanto mais depressa receber ajuda, melhores hipóteses terá de um desfecho positivo.