Um satélite britânico na órbita da Terra moveu-se. Ninguém sabe quem o fez e porquê

PIRO4D / Pixabay

Alguém moveu o satélite mais antigo do Reino Unido — mas não se tem registo de quem o fez e porquê.

Lançado em 1969, apenas meses após a humanidade conseguir pisar na Lua pela primeira vez, o Skynet-1A foi lançado sobre a costa leste da África para transmitir comunicações para as Forças Armadas britânicas.

Poucos anos depois, quando o satélite parou de funcionar, era de se esperar que a gravidade o empurrasse um pouco mais para o leste, sobre o oceano Índico.

Mas hoje, curiosamente, o Skynet-1A está a meio planeta de distância dali, numa posição de 36 mil km acima do continente americano.

De acordo com as leis da astrodinâmica, é pouco provável que o satélite militar de meia tonelada se tenha simplesmente deslocado sozinho até ali.

É possível dizer quase com certeza total que os seus propulsores foram ligados nos anos 1970 para conduzi-lo rumo ao oeste. A pergunta que se faz é: quem fez isso, e com qual autoridade e propósito.

Outro ponto intrigante é que a informação chave sobre esse satélite — que já foi um ativo de segurança nacional vital — pode ser perdida.

Mas mistérios à parte, também podemos perguntar por que esse satélite continua a ser importante. Afinal, estamos a falar de um lixo espacial com 50 anos.

“Continua a ser relevante porque quem quer que tenha movido o Skynet-1A ajudou-nos muito pouco”, diz o consultor espacial Stuart Eve.

“Agora está no que chamamos de ‘um poço de gravidade‘ a 105 graus de longitude oeste, a vaguear para frente e para trás, como um berlinde num pote. E infelizmente isso coloca-o com frequência perto de outros satélites em trânsito.”

“Como ele está morto, o risco é que ele possa chocar com algo, e como é ‘nosso’ satélite, somos responsáveis por ele.”

Eves pesquisou em catálogos de satélites antigos, nos Arquivos Nacionais e conversou com especialistas em todo o mundo, mas ele não conseguiu encontrar explicações para o comportamento do Skynet-1A, que é o satélite mais antigo do Reino Unido.

É tentador pensar em teorias da conspiração — ainda mais por ser difícil ouvir o nome “Skynet” sem pensar no sistema maligno de inteligência artificial que tenta dominar o mundo na série de filmes O Exterminador do Futuro.

Mas não existe nenhuma relação com isso, a não ser o nome. A vida real é muito mais prosaica.

O que se sabe é que o Skynet-1A foi produzido nos EUA pela extinta empresa aeroespacial Philco Ford e lançado por um foguete Delta da Força Aérea americana.

“O primeiro satélite Skynet revolucionou a capacidade de telecomunicações do Reino Unido, permitindo que Londres se comunicasse com segurança com forças britânicas em lugares distantes como Singapura. No entanto, do ponto de vista tecnológico, o Skynet-1A era mais americano do que britânico, já que foram os EUA que o construíram e o lançaram”, afirma o especialista Aaron Bateman, num artigo sobre a história do programa Skynet, que está agora na sua quinta geração.

Esta opinião é confirmada por Graham Davison, que operou o Skynet 1A no início dos anos 70 do centro de operações do Reino Unido na base da RAF (a Força Aérea Britânica) Oakhanger em Hampshire, na Inglaterra.

“Os americanos inicialmente controlavam o satélite em órbita. Eles testaram todos os nossos softwares com o deles, antes de eventualmente passar o controlo à RAF”, diz o engenheiro aposentado.

“Essencialmente havia duplo controlo, mas quando ou por que o Skynet-1A teria sido devolvido aos americanos, que parece provável… eu não consigo lembrar-me”, diz Davison, hoje com mais de 80 anos.

Rachel Hill, estudante de doutoramento da University College London, também está a vasculhar os Arquivos Nacionais.

A sua pesquisa levantou uma hipótese bastante razoável.

“Uma equipa do Skynet de Oakhanger iria à base de satélites da USAF em Sunnyvale (conhecida informalmente como ‘Cubo Azul’) para operar a Skynet durante o ‘Oakout’. Foi quando o controlo foi temporariamente transferido para os EUA enquanto Oakhanger esteve fora de serviço para manutenção essencial. Talvez a mudança tenha acontecido nesse momento”, especula Hill.

Os registos oficiais — e incompletos — do Skynet-1A sugere que o comando final do satélite foi deixado na mão dos americanos quando Oakhanger o perdeu de vista em junho de 1977.

Mas seja como for que o Skynet-1A tenha sido movido para a sua posição atual, ele foi colocado para “morrer” num local estranho e deveria ter sido colocado numa área que é uma “órbita cemitério“.

Essa região fica mais acima no céu, e é onde lixos espaciais não interferem com satélites ativos de telecomunicações. Usar essa órbita para lixo espacial é o padrão atual da indústria, mas nos anos 1970 ninguém queria saber da sustentabilidade espacial.

As atitudes mudaram desde então, porque o espaço está mais congestionado. A 105 graus de longitude oeste, um satélite pode ficar a apenas 50 km de distância de um lixo espacial quatro vezes por dia. Pode parecer uma distância grande, mas nas velocidades a esses objetos se movem, os riscos de uma colisão estão a aumentar.

O ministério da Defesa disse que o Skynet-1A era constantemente monitorizado pelo Centro Nacional de Operações Espaciais do Reino Unido. Outros operadores de satélite são avisados de quando haverá aproximações grandes, para que possam desviar os seus satélites.

Em última instância, o governo britânico pode ter que pensar em retirar o satélite antigo para um local mais seguro.

Tecnologias estão a ser desenvolvidas para se apanhar lixo espacial. A agência espacial britânica está a financiar esforços para fazer isso em altitudes mais baixas. Os americanos e chineses já mostraram que isso é possível até mesmo em órbitas mais altas, como a do Skynet-1A.

“Pedaços de lixo espacial são como bombas-relógio“, diz Moriba Jah, professor de engenharia aeroespacial da Universidade do Texas, em Austin, nos EUA.

“Precisamos de evitar o que chamo de eventos de super-disseminação. Quando essas coisas explodem ou algo colide com eles, isso gera milhares de pedaços de destroços que ameaçam outras coisas com as quais nos importamos.”

ZAP // Lusa

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