Edifício histórico de Lisboa está arrendado à Igreja Universal do Reino de Deus há mais de 25 anos. Teria lógica voltar a ser cinema?
O Cinema Império, localizado na freguesia de Arroios (Lisboa), foi inaugurado como sala de cinema em maio de 1952, tendo encerrado portas em 1983.
Está arrendado à Igreja Universal do Reino de Deus há mais de 25 anos, mais concretamente desde 1998.
A Câmara Municipal de Lisboa aprovou “alterar o uso de equipamento cultural para equipamento religioso, com outras valências complementares”, nomeadamente “serviços de administração, de apoio com salas de atividades para crianças e jovens, de formação e reunião”.
A Academia Portuguesa de Cinema (APC) instou na segunda-feira o Governo e a Câmara de Lisboa a protegerem a memória do Cinema Império e a manter o edifício como um espaço cultural da cidade.
Segundo a proposta, a que a agência Lusa teve acesso, pretende-se ainda ampliar o edifício “com aumento de área de construção e volumetria, alterações exteriores, de fachada, ao nível dos últimos pisos, incluindo alterações na cobertura, e ainda outras alterações e legalizações no interior do imóvel, para o adaptar ao uso proposto”.
“As notícias que nos chegam da sua desclassificação de equipamento cultural para uso religioso e o início de obras que ignoram o seu valor cultural deixam antever mais uma perda irreparável para a cidade. O desaparecimento do Cinema Império é uma ameaça real e alarmante, à semelhança do que já aconteceu com salas icónicas como o Monumental, Condes, Éden, Odeon, Olympia, Europa, Paris, Londres Mundial e Quarteto, apenas para mencionar algumas”, é referido na nota divulgada pela Academia Portuguesa de Cinema.
Antevendo essa situação, a APC considera que “é urgente que as entidades responsáveis, desde o Governo à Câmara Municipal de Lisboa, intervenham no sentido de preservar este espaço”.
“É tempo de exigir a salvaguarda do Cinema Império e de reconhecer o seu papel insubstituível na identidade cultural de Lisboa e do país. Não se trata apenas de salvar um edifício, mas de proteger a memória, a história e o futuro cultural da cidade”, sublinha ainda a APC.
Também na segunda-feira, a associação Fórum Cidadania LX enviou um pedido de esclarecimento à Câmara Municipal de Lisboa (CML) e à ministra da Cultura sobre a legalidade e as consequências da aprovação da proposta.
“Não podemos deixar de manifestar a nossa tristeza pela indiferença continuada dos poderes públicos, desde logo pelo Governo e a CML, para com as grandes salas de cinema de Lisboa, que outras cidades e outras sociedades civis desde logo na Europa, procuram resgatar o máximo possível, mais a mais quando estamos perante uma ‘obra total’ como o Cinema Império, que constituiu na altura, inclusivamente, um desafio arrojado em termos arquitetónicos pela configuração do lote onde foi construído”, refere a associação.
Voltar a ser cinema?
Na prática, o Cinema Império não é cinema há mais de 40 anos. Tem sido utilizado como local de culto pela Igreja Universal do Reino de Deus.
A Câmara de Lisboa já assegurou que esta alteração quer sobretudo legalizar adaptações e ampliações – que já foram feitas dentro do edifício – e não coloca em causa a preservação cultural do espaço, estando salvaguardado “o futuro retorno à sua função primitiva”, cita o Correio da Manhã.
Mas o Cinema Império voltar a ser cinema… Não vai acontecer, segundo Helena Matos.
“Há um problema: este tipo de salas de cinema foi feito para outros tempos, em que salas de cinema de grande dimensão ficavam cheias. Hoje não vamos ao cinema dessa forma“.
“Hoje em dia, ao falar do Cinema Império, estamos a falar de um edifício. As pessoas que pedem estas proteções, provavelmente, nunca utilizam estes espaços quando estão abertos. As pessoas não vão lá“, avisa a comentadora na rádio Observador.
Helena considera que em casos como este há um “aviltamento” dos espaços, sobretudo quando estão em causa certos grupos religiosos, “com caráter mais popular, mais histriónico”.
O Cinema Império voltar a funcionar como cinema “não faz qualquer sentido. Não vai voltar à sua função inicial”, assegura Helena Matos.
ZAP // Lusa