António Cotrim / Lusa

A ex-ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque
Para evitar espionagem: Comissão Europeia acredita que há risco de vigilância russa ou chinesa e replicou medidas postas em prática em viagens à Ucrânia e à China. Entretanto, “o cavalo de Troia” de Trump visita o amigo nos EUA.
A Comissão Europeia forneceu telemóveis descartáveis e computadores portáteis básicos a alguns responsáveis que têm viagens aos Estados Unidos, incluindo a comissária europeia portuguesa Maria Luís Albuquerque, para evitar o risco de espionagem, noticiou o jornal Financial Times.
Os comissários e altos funcionários europeus com deslocações programadas às reuniões de primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial na próxima semana receberam estas novas orientações, de acordo com quatro pessoas ligadas aos processo citadas na segunda-feira pelo jornal britânico. Segundo estas fontes, as medidas replicam as utilizadas em viagens à Ucrânia e à China, onde os equipamentos informáticos padrão não podem ser levados para os países por medo da vigilância russa ou chinesa.
“Estão preocupados com a possibilidade de os EUA entrarem nos sistemas da comissão”, frisou uma das fontes.
Desligar os telemóveis e pô-los em capas especiais
O Presidente norte-americano Donald Trump acusou a União Europeia (UE) de ter sido criada para “prejudicar os EUA” e anunciou tarifas recíprocas de 20% sobre as exportações do bloco, que posteriormente reduziu para metade durante um período de 90 dias. Bruxelas e Washington estão envolvidos em negociações delicadas em diversas áreas em que seria conveniente para cada um dos lados recolher informações sobre o outro, referiu ainda o Financial Times.
Maros Sefcovic, comissário do comércio da UE, manteve na segunda-feira uma reunião com o secretário do Comércio, Howard Lutnick, em Washington, num esforço para resolver uma guerra comercial crescente.
Três comissários vão viajar para Washington para as reuniões do FMI e do Banco Mundial de 21 a 26 de abril: Valdis Dombrovskis, comissário da economia; Maria Luís Albuquerque, comissária de Serviços Financeiros e União da Poupança e dos Investimentos; e Jozef Síkela, que se ocupa da assistência ao desenvolvimento.
A Comissão confirmou que atualizou recentemente o seu conselho de segurança para os EUA, mas disse que nenhuma instrução específica sobre a utilização de telefones descartáveis foi dada por escrito, ainda segundo o jornal económico.
As fontes citadas pelo jornal adiantaram ainda que a orientação para todos os responsáveis que viajam para os EUA incluía uma recomendação de que devem desligar os telemóveis pessoais na fronteira e colocá-los em capas especiais para os proteger de espionagem se deixados sem supervisão.
A missão quase impossível de Meloni
A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, procura esta semana assumir-se como a intermediária entre a UE e os Estados Unidos em plena guerra comercial, com uma visita à Casa Branca imediatamente seguida de uma receção ao vice-presidente norte-americano.
A líder do Governo de direita e extrema-direita de Itália e do partido pós-fascista Irmãos de Itália, e próxima de Trump — foi a única chefe de governo da UE a estar presente na sua tomada de posse em janeiro passado — realiza uma “visita oficial de trabalho” a Washington na quinta-feira, regressando de imediato a Roma para, na sexta-feira, receber o vice-presidente JD Vance.
A suspensão recíproca, por igual período, das tarifas, abriu uma janela diplomática e de negociação que a primeira-ministra italiana — a primeira líder europeia a encontrar-se com Trump desde o anúncio na ‘pausa’ nas taxas — quer aproveitar.
Contudo, muitos analistas consideram que Meloni enfrenta uma missão quase impossível, e a sua deslocação à Casa Branca é olhada com reservas por alguns parceiros europeus, com França à cabeça, e severamente criticada pela oposição italiana, que acusa a primeira-ministra de ser “o cavalo de Troia” de Trump e do magnata Elon Musk — de quem também é muito próxima — dentro do bloco europeu.
“Se começarmos a ter conversações bilaterais, esta dinâmica [de unidade europeia] que está presente neste momento acabará por se quebrar. É um risco que tem estado presente desde o início, porque sabemos que Donald Trump tem uma estratégia bastante clara e simples: dividir os europeus. Perante este risco, temos de estar unidos, porque a Europa só é forte se estiver unida”, comentou recentemente o ministro francês da Indústria, Marc Ferracci.
Já fontes diplomáticas europeias consideram que a visita não é problemática desde que Meloni não se limite a transmitir a sua mensagem nacional, mas também “a linha oficial da UE”.
As críticas à deslocação de Meloni a Washington são rebatidas pelo Governo italiano, com fontes do gabinete da primeira-ministra a garantirem que esta “não vai a Washington para minar o processo europeu, mas para usar a sua boa relação [com Trump] para ajudar a facilitar uma negociação europeia”.
Os trunfos europeus que Meloni leva
Como trunfos negociais, Giorgia Meloni deverá mostrar abertura em Washington para um aumento da compra de gás natural liquefeito dos Estados Unidos por parte dos europeus, assim como apoio à ideia de que parte substancial dos fundos financiados com dívida europeia para a compra conjunta de equipamento militar por vários países se destine aos EUA.
Vários analistas apontam a proximidade entre ambos, até a nível ideológico, mas salientam que a primeira-ministra italiana supostamente representará também os interesses da UE, bloco que Trump afrontou repetidamente.
Embora oficialmente o bloco comunitário apoie a iniciativa de Meloni, com o tradicional argumento de que todos os esforços diplomáticos para evitar a escalada da guerra comercial são bem-vindos, Bruxelas e ‘pesos-pesados’ como França e Alemanha recusam ficar à margem de negociações com Washington e seguirão com particular atenção os desenvolvimentos deste encontro bilateral.
Na segunda-feira, um porta-voz da Comissão Europeia, lembrando que a negociação de acordos comerciais é da competência exclusiva do executivo comunitário, mas sustentando que todos os contactos são bem-vindos, garantiu que a presidente Ursula Von der Leyen tem estado em “contacto regular” com Meloni em relação a esta missão.
ZAP // Lusa
Guerra das Tarifas
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15 Abril, 2025 Maria Luís Albuquerque leva telemóvel descartável para os EUA — e Meloni uma missão (quase) impossível