Durante mais de um século, milhares de milípedes venenosos invadiram as linhas de comboio nas densas montanhas do Japão, forçando mesmo os veículos a parar. Estes artrópodes apareciam de vez em quando e, depois, desapareciam novamente durante anos a fio. Agora, os cientistas descobriram porquê.
Tal como conta o site Live Science, os operadores de comboios japoneses observaram este surto, pela primeira vez, em 1920. De acordo com vários relatos, os milípedes, da espécie Parafontaria laminata armigera, voltavam a cada oito anos ou depois disso, formando uma manta cada vez mais densa onde era impossível passar.
Em 1977, Keiko Niijima, investigador do Instituto de Pesquisa de Produtos Florestais e da Exploração Florestal, foi o primeiro a propor que estes artrópodes, que ficaram conhecidos como “milípedes dos comboios”, poderiam ter um ciclo periódico de oito anos.
Agora, o mesmo investigador, juntamente com os professores Momoka Nii e Jin Yoshimura, confirmou essa teoria num estudo publicado, a 13 de janeiro, na revista científica Royal Society Open Science.
Estes longos ciclos de vida “periódicos” – nos quais uma população passa pelas diferentes fases da vida ao mesmo tempo – só tinham sido confirmados em algumas espécies de cigarras, com ciclos de vida de 13 e 17 anos, bem como em bambus e outras plantas.
“Este milípede é o primeiro artrópode não-inseto entre todos os organismos periódicos”, disse Yoshimura, o autor sénior do artigo científico e professor emérito do departamento de Matemática e Engenharia de Sistemas da Universidade de Shizuoka.
Ao longo de vários anos, os cientistas recolheram milípedes das montanhas em Honshu e conduziram pesquisas com estas criaturas. Para determinar as suas etapas de vida, a equipa contou o número de pernas e os segmentos no seu corpo, já que estes são específicos da idade de um milípede.
Segundo o mesmo site, os investigadores descobriram que as várias ninhadas desta população têm cada uma a sua própria sincronização. Por outras palavras, uma ninhada pode estar ainda nos ovos, enquanto outra pode estar já na fase adulta. Cada população percorre todo o seu ciclo de vida em oito anos.
Relativamente à ninhada de milípedes que aparece de forma periódica nas linhas ferroviárias, os cientistas dizem que os artrópodes estão apenas a tentar chegar a novas áreas de alimentação, que por vezes estão do outro lado das ferrovias.
Como vivem em grande número, os milípedes mais velhos comem rapidamente todos os alimentos disponíveis onde nasceram e é a partir daí que começam a sua jornada para um novo local de alimentação. Aí, comem folhas em decomposição, acasalam, deixam novos ovos e depois acabam por morrer.
A equipa levanta a hipótese de os seus longos ciclos de vida poderem estar sincronizados com a hibernação no inverno. Ao contrário das cigarras periódicas, que surgem em grande número e, portanto, tornam cada indivíduo menos propenso a sucumbir aos predadores, estes milípedes não precisam dessa proteção adicional, porque têm um mecanismo de defesa ainda melhor: quando atacados, libertam cianeto.