“Outra vez”, quando os medicamentos falsos chegam por carta

António Cotrim / Lusa

Elementos do Infarmed, da Autoridade Tributária e da Polícia Judiciária participam na operação internacional Pangea, coordenada pela Interpol

“É o mais habitual”: quando o medicamento é comprado na internet, o que chega a casa não é nada do que o comprador julga. Operação da Interpol com inspetores do Infarmed e CTT identifica todos os anos milhares de encomendas de fármacos falsificados — ou cuja circulação é proibida em Portugal.

A azáfama é grande num dos cantos do armazém. Junto a uma passadeira rolante, uma dezena de pessoas inspecionam todas as caixas de medicamentos que ali chegam, selecionados por suspeitas de falsificação.

Esta inspeção, que decorre em instalações dos CTT, na região de Lisboa, faz parte da operação internacional Pangea, coordenada pela Interpol e focada no combate à venda ‘online’ de medicamentos falsificados.

Outra vez. É o mais habitual”, diz à Lusa uma das funcionárias da Autoridade Tributária que participa na ação, em conjunto com o Infarmed e elementos da Polícia Judiciária, confirmando que o medicamento em causa, comprado na internet, não é nada do que o comprador julga, representando um perigo para a saúde.

A operação Pangea decorreu desta vez entre dezembro de 2024 e maio de 2025, mas durante todo o ano, graças a um protocolo específico, o Infarmed e a AT verificam encomendas e a autoridade do medicamento analisa e decide se se trata de um medicamento com suspeita de falsificação, ou não, e qual o destino a dar-lhe.

Este ano, a operação apreendeu em Portugal cerca de 30.000 comprimidos, cápsulas e outras apresentações individuais de medicamentos ilegais — com um valor superior a 74.000 euros.

“Os fármacos são apreendidos quando há uma suspeita de falsificação e o grupo principal é o dos medicamentos para a disfunção erétil”, explica Ana Rita Martins, da Unidade de Inspeção do Infarmed.

Atrás da responsável, a passadeira rolante continua a debitar caixas, algumas das quais passaram pelo aparelho raio-x montado atrás do grupo de inspetores.

Há casos de medicamentos em que se confirma a falsificação, mas noutros são fármacos que as pessoas, por diversos motivos, como a falta de acesso, por exemplo, pedem a familiares para enviarem de outros países.

“Como a circulação não está autorizada no mercado português, estes medicaentos acabam devolvidos ao remetente”, explica a responsável do Infarmed.

No caso de se confirmar a suspeita de falsificação, o medicamento é destruído. Se se tratar de fármacos que são expedidos de outros países, mas cuja circulação não está autorizada em Portugal, são devolvidos ao remetente.

Nestas situações, quando os medicamentos precisam de frio, por exemplo, podem já não estar próprios para consumo e a melhor opção seria a destruição. Contudo, a legislação não o permite, o que abre a hipótese de posteriormente estes medicamentos entrarem de novo no mercado.

“Esses medicamentos são de várias panóplias, desde os cardiovasculares, aos fármacos para o aparelho gastrointestinal, anti-infecciosos, analgésicos e anti-inflamatórios”, explica Ana Rita Martins, revelando que estes são “a maior percentagem que se tem encontrado nos últimos anos”.

A responsável do Infarmed reconhece que para impedir que o medicamento voltasse a entrar no mercado – destruindo-o em vez de o devolver ao remetente – “era preciso alterar a legislação”.

Esta verificação ao longo do ano é feita pela AT, em colaboração com o Infarmed – responsável pelas análises que confirmam a falsificação -, tanto na delegação aduaneira das encomendas postais como nos aeroportos.

A nossa função é verificá-los e fazer um controle físico, para detetar a entrada destes produtos proibidos”, explica à Lusa Manuela Manta, da AT, alertando: “Estamos a falar de medicamentos que podem ser perigosos para a saúde do consumidor”.

A responsável avisa ainda que a maioria destes produtos pode conter substâncias que podem causar danos físicos aos próprios consumidores: “Normalmente encomendam através da internet e, muitas vezes, não sabem os perigos que correm quando os consomem”.

Ana Rita Martins, do Infarmed, explica que tudo o que é comprado fora da cadeia de distribuição legal e foge ao controlo das autoridades ”pode ter a substância ativa na quantidade certa, pode ter em quantidade inferior ou pode nem sequer ter essa substância”.

“Isto traz perigos, pode criar efeitos adversos graves, inclusive a morte”, avisa a responsável, lembrando, contudo, que a compra ‘online’ é autorizada, em ‘sites’ de organizações que têm luz verde para a venda dos medicamentos que comercializam.

Questionada sobre como podem os consumidores proteger-se, a responsável aconselha: procurar no ‘site’ o logotipo comum, desenvolvido a nível europeu, um desenho com listas verdes e permite acesso a um ‘link’ para a autoridade competente.

Só assim se tem a certeza de que se está a comprar medicamentos que estão autorizados”, disse a especialista — enquanto lá atrás, os inspetores continuavam a separar as caixas de várias cores que entravam na passadeira rolante: os suspeitos de serem falsificados para uma grade, de onde seguem para o laboratório do Infarmed, os não autorizados em Portugal para outra, para devolução ao remetente.

// Lusa

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