Os salários indicam que “Portugal é Lisboa e o resto é paisagem”

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Maria Eklinf / Flickr

Castelo de São Jorge, em Lisboa

A diferença salarial entre Lisboa e o resto do país é cada vez maior. 30% dos trabalhadores e 22% das empresas estão no distrito de Lisboa. Os economistas criticam o investimento público desigual e a falta de incentivo aos privados no interior.

Os dados mais recentes do Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social revelam que cada vez mais “Portugal é Lisboa e o resto é paisagem”.

Por exemplo, Lisboa paga mais 335 euros que o Porto, 534 euros do que Braga e 643 euros do que em Bragança.

Os dados do GEP indicam também que Lisboa tinha, em 2023, 30% do emprego nacional, com quase um milhão (994.831) de trabalhadores num total nacional de 3.296.134. Além disso, 22,6% das empresas estão no distrito de Lisboa.

As contas são mostradas esta segunda-feira pelo Jornal de Notícias (JN), que detalha que entre 2013 e 2023, a distância entre a capital e os restantes distritos aumentou no salário, no número de trabalhadores e de empresas.

Em entrevista ao mesmo jornal, o diretor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, Óscar Afonso, aponta que este “é o sintoma mais evidente da persistência de um modelo de desenvolvimento desequilibrado”.

Para o economista, este modelo “favorece a metrópole e marginaliza vastas áreas do interior e do Norte/Centro, confirmando uma estagnação estrutural da geografia económica do país”.

De acordo com os especialistas, neste momento, os discursos políticos de “descentralização” e “coesão territorial” não batem certo com a realidade dos números.

Ao JN, o economista Eugénio Rosa lamenta que “apesar de todas as bonitas palavras dos sucessivos governos, visando a coesão nacional por meio de um desenvolvimento equilibrado de todo o país, isso nunca se verificou”.

A razão deste fenómeno

O economista João Cerejeira, professor da Universidade do Minho, explica que esta desigualdade salarial entre distritos deve-se ao facto de, em Lisboa, a população empregada ter um nível mais elevado de escolaridade, que têm remunerações médias mais altas.

Quanto à concentração de empresas, João Cerejeira explica-a pelos “ganhos de produtividade associados à aglomeração da atividade produtiva”.

“Lisboa é a principal área urbana do país, beneficiando da proximidade e maior densidade de empresas e capital humano, as quais permitem ganhos de escala, maior facilidade na difusão de conhecimento, criando condições mais favoráveis à inovação. A existência do principal aeroporto do país também facilita a conexão a nível global, com vantagens para as empresas aí instaladas”, aponta o economista.

Por seu turno, Óscar Afonso aponta que este cenário é fruto da “desigualdade no investimento público e na atração de investimento privado, uma vez que as políticas de investimento público têm historicamente favorecido áreas já dinâmicas ou desenvolvidas, em particular Lisboa, ou têm sido mal aplicadas no interior, sem criar efeitos estruturantes”.

O economista lamenta também a “falta de incentivos robustos à descentralização económica, visto que os regimes fiscais e os apoios ao investimento falham em criar vantagens competitivas reais para a instalação fora dessa área metropolitana”.

Eugénio Rosa partilha da opinião, mas toca noutro ponto: o especialista acrescenta que, quando o investidor privado investe no interior, tende a indicar que pretende “para pagar salários mais baixos, aproveitando não haver alternativas”.

ZAP //

3 Comments

  1. “Lisboa paga mais 335 euros que o Porto, 534 euros do que Braga e 643 euros do que em Bragança” trata-se da mesma profissão/função? Ou é como aquele caso de comparar uma hospedeira de bordo com um piloto?

    • Podiam também dizer que é mais caro viver em Lisboa. É normal que quem trabalhe em Lisboa tenha necessariamente de receber mais.
      Mas mais uma vez é mais fácil dizer que Lisboa é a causa de todo os males do país e alimentar regionalismos bacocos.
      E náo tendo dados para o comprovar, quase que aposto que se aplica o mesmo a todas as capitais europeias.

  2. Grande descoberta esta!, Para quem vive fora desse sítio sabe como é! Basta ver os deputados eleitos pelas regiões como se comportam em S. Bento! O centralismo cada vez mais furioso em tudo. Recente RTP-Lisboa, anula praticamente a RTP Madeira.

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