Países do mundo inteiro atrasam ou adiantam os relógios consoante a legislação em vigor. Nos Estados Unidos, há uma proposta em cima da mesa para que a hora de verão se torne permanente. Mas cientistas do sono sugerem que seja abolida.
No passado domingo, a hora legal em Portugal mudou para o horário de inverno — o que significa que todos os relógios tiveram de ser atrasados 60 minutos.
Agora, o mesmo acontecerá nos Estados Unidos, onde a hora também será atrasada, provocando sentimentos agridoces: se, por um lado, muitos norte-americanos irão desfrutar de uma hora extra de sono, por outro lado, o sol começará a pôr-se antes de todos. E a maioria das pessoas não gosta deste ritual confuso e perturbador de mudar os relógios duas vezes por ano (em março passado os relógios andaram uma hora para a frente).
Daylight saving time ends this Sunday, November 7th, 2021. Sunset on Sunday evening in NYC will be at 4:45pm.
— New York Metro Weather (@nymetrowx) November 1, 2021
Segundo o The New York Times, um grupo bipartidário de senadores norte-americanos reintroduziu, em março, um projeto de lei para acabar com a hora padrão (horário de inverno) e tornar o horário de verão permanente, seguindo o exemplo de 19 estados que aprovaram legislação semelhante.
No entanto, cientistas que estudam o sono e os ritmos biológicos argumentam que a hora de verão é que deveria ser eliminada.
Afinal, por que mudamos a hora duas vezes por ano?
As origens da hora de verão remontam aos tempos de Benjamin Franklin que, num ensaio satírico de 1784, sugeriu que a cidade de Paris poderia poupar todos os anos milhões de quilos de cera de vela, se os parisienses acordassem mais cedo de manhã e fossem para a cama mais cedo à noite.
No entanto, foi apenas na I Guerra Mundial que a ideia ganhou um sério impulso político. Em 1916, o governo alemão abraçou o avanço dos relógios como um meio de poupar energia.
“Enquanto os britânicos falavam disso ano após ano, os alemães decidiram fazê-lo mais ou menos por decreto”, explicou David Prerau, autor de “Seize the Daylight: The Curious and Contentious Story of Daylight Saving Time”, à National Geographic em 2019.
Passado pouco tempo, Inglaterra e grande parte do resto da Europa seguiram o exemplo, tal como os Estados Unidos. Em março de 1918, o Congresso norte-americano promulgou o Standard Time Act, que tanto definiu os fusos horários do país como instituiu temporariamente a mudança do relógio. A mudança era inicialmente impopular, contudo, e não se tornaria permanente até ao Uniform Time Act de 1966, que estabeleceu a hora de verão em grande parte do país.
Embora a divisão entre os dois sistemas de tempo fosse igual no início, a hora de verão passou a dominar, ao longo das décadas, uma parte cada vez maior do ano — atualmente, a hora padrão (de inverno) está em vigor apenas durante cerca de quatro meses, entre novembro e março.
Ao contrário do que acontecia quando foi instituída, a mudança de hora já não poupa muita energia e tem um sério custo para a saúde das pessoas.
“A luz é o regulador mais poderoso do nosso relógio interno, também conhecido como o nosso ritmo circadiano, e algumas pessoas podem nem sequer se ajustar à mudança de hora após vários meses”, diz Anita Shelgikar, professora associada de medicina do sono e neurologia na University of Michigan Health System.
“O desalinhamento crónico entre o relógio interno e as atividades ocupacionais, familiares e sociais pode ser muito perturbador”, continuou.
A transição horária tem estado, aliás, ligada — em parte devido a perturbações do sono, que são particularmente agudas durante a mudança para a hora de verão — a um maior risco de ataque cardíaco, mais lesões no local de trabalho e mais mortes por acidentes de viação.
Na semana após a mudança do relógio na Primavera, os acidentes de automóvel fatais aumentam 6%, de acordo com um estudo publicado no ano passado.
Além disso, os pais também têm razões especiais para temer as transições horárias, que tendem a desestabilizar a sesta e a rotina de dormir das crianças mais pequenas.
No entanto, a proposta para tornar a hora de verão permanente tem alguns argumentos a seu favor.
Steve Calandrillo, professor de direito na Universidade de Washington, conduziu uma investigação económica sobre a abolição da hora de inverno e pensa que é a atitude certa. Isto porque a escuridão à noite (hora de inverno) está associada tanto a um maior número de acidentes de automóvel fatais como a níveis de criminalidade mais elevados do que a escuridão de manhã (hora de verão).
“O horário de verão traz uma hora extra de luz solar à noite para mitigar esses riscos”, enquanto a hora padrão tem precisamente o impacto oposto, escreve Calandrillo.
A nível económico, a hora de verão também é mais benéfica. Isto porque, quando escurece mais tarde, os consumidores tendem a sair mais de casa.
O efeito real pode ser pequeno, mas ainda assim significativo: um relatório do JP Morgan Chase Institute concluiu que os consumidores gastam mais 0,9% no início da hora de verão e 3,5% menos no mês após os relógios atrasarem.
Os defensores da hora de verão também argumentam que o facto de escurecer mais tarde é mais útil e menos deprimente. De acordo com um estudo publicado em 2017, a transição da hora diurna para a hora padrão está associada a um aumento de 11% em episódios depressivos, um efeito que leva 10 semanas a dissipar-se.
No entanto, e embora o prolongamento da hora de verão possa parecer apelativo, muitas organizações científicas, incluindo a Academia Americana de Medicina do Sono, dizem que a hora padrão é, na realidade, melhor para a saúde das pessoas.
Isto porque a hora de inverno permite um maior alinhamento do ciclo luz-escuro do sol, que controla os nossos ritmos circadianos, e os nossos relógios sociais, que ditam, entre outras coisas, quando as pessoas precisam de acordar para o trabalho e para a escola.
“Acredite ou não, ter luz de manhã não só o faz sentir-se mais alerta, como o ajuda a ir para a cama à hora certa à noite“, disse Beth Malow, diretora da divisão do sono da Escola de Medicina de Vanderbilt, em declarações à Kaiser Health News.
Quando os relógios sociais estão desalinhados com o relógio solar, as pessoas experimentam o que se chama jet lag social, que tem sérios efeitos na saúde, incluindo curta duração do sono, aumento das perturbações metabólicas, problemas cardiovasculares, perturbações do humor e até mesmo redução da esperança de vida e aumento do risco de cancro.
“Assim, se ficássemos permanentemente no horário de verão, teríamos meses adicionais desta fase não ótima dos nossos relógios, e isso poderia levar a uma incidência de cancro ainda maior do que a que vemos atualmente nos Estados Unidos”, disse Joseph Takahashi, presidente do departamento de neurociência do Centro Médico da Universidade do Texas Southwestern.
Nos Estados Unidos, 40% dos cidadãos acreditam que se deveria adotar a hora padrão durante todo o ano, de acordo com uma sondagem de 2019, em comparação com 31% que acreditam que a hora de verão é que deveria ser permanente.
No entanto, há 28% que preferem continuar com a mudança horária.
ZAP:
Grande novidade.
Esqueceram-se que foi feita uma sondagem europeia e dos resultados????
O Parlamento Europeu já decidiu, mas (obviamente) está tudo emaranhado por motivos políticos e a desculpa da Covid veio ajudar, e ainda não começaram as negociações para a aplicação da directiva.
Talvez agora que os “camones” acordaram para o tema, os europeus os sigam, quando podiam ter sido o motor da mudança.
Uma cambada, só palab=vras bonitas, mas ninguém tem nem competência nem capacidade política para guiar verdadeiramente a União, assumindo alguns riscos, naturalmente.
É muito melhor garantir o “assento”…..
Há coisa de uns anitos, uma votação online patrocinada pela UE rejeitou a mudança de hora bianual.
Falou-se então de acabar com a mudança da hora, e o assunto ficou em 6° plano com o advento da pandemia.