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A primeira missão de vacinação internacional usou órfãos para transportar o vírus da varíola

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Francisco Pérez / Wikimedia

A expedição espanhola levou vacinas para as colónias na América e usou órfãos como incubadoras para a varíola, dado que as vacinas se estragariam na longa viagem.

No século XVIII, os contágios da varíola estavam desenfreados, especialmente nas cidades. Sem cura, na altura o único método conhecido para se tratar a doença era a variolação, ou seja, infectar-se pessoas saudáveis propositadamente com uma pequena dose do pus de alguém que tivesse varíola, na esperança de que uma infecção mais branda ajudasse os pacientes a tornarem-se imunes.

Depois de notar que as vaqueiras eram imunes à varíola, Edward Jenner revolucionou a Medicina em 1796 ao criar a primeira vacina do mundo, depois de experimentar infectar os seus pacientes com a estirpe de varíola que afecta as vacas e descobrir que isto tornava os pacientes imunes, nota o IFLScience.

No entanto, a pandemia de varíola estava longe de estar resolvida, tanto que a doença só foi erradicada em 1980. Na altura, ainda sem aviões, havia um desafio ainda maior com a distribuição das vacinas por todo o planeta — e a Real Expedição Filantrópica para Vacinação, conhecida como Expedição Balmis tornou-se o primeiro programa internacional de saúde da História.

Em 1830, o Rei Carlos IV de Espanha, que já tinha perdido vários membros da família para a varíola, decidiu enviar vacinas gratuitas para as colónias espanholas mais remotas no continente americano, assim como todos os recursos necessários para que estas implementassem um programa de vacinação próprio em larga escala.

Mas mesmo com estas boas intenções, o método usado para fazer chegar a vacina às colónias foi bastante duvidoso a nível ético. Sem modos de transporte rápido, o pus das vacinas já não seria eficaz quando chegasse ao destino, visto só ser viável durante alguns dias.

A equipa ponderou transportar vacas infectadas para as colónias, mas isso seria um pesadelo logístico. Assim optaram por usar órfãos como incubadores da doença, para que o vírus ainda chegasse vivo.

O navio levou assim 22 órfãos, entre os três e nove anos de idade. Duas das crianças já partiram infectadas e o pus destas foi usado para infectar duas outras. Quando chegaram ao destino, os colonos pagaram às famílias locais para infectarem as suas crianças e poderem assim manter a doença viva e inocularem mais pessoas.

Apesar do sacrifício dos órfãos, a expedição acabou por ser um sucesso e preveniu incontáveis novas infecções e mortes por varíola.

ZAP //

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