O misterioso código no vestido de seda servia para transmitir observações meteorológicas.
A compra de um vestido de seda da Era Vitoriana por uma curadora de arqueologia em 2013 levou à descoberta de um código secreto escondido na roupa — e que levou toda a década para ser decifrado. Sara Rivers-Cofield adquiriu o artigo de vestuário no estado americano do Maine, descobrindo um bolso escondido na parte interna, onde havia uma bola de papéis amassados.
Nos papéis, havia duas dúzias de linhas de texto, nenhuma delas a fazer sentido algum. Ao achatar o material, foram reveladas sentenças como “Grub wrongful hug duck fagan each” e “Calgarry Cuba Unguard confute duck fagan egypt”. Circulando pela internet desde então, as palavras passaram pela mão de decifradores de código de todo o mundo, que não fizeram progressos em traduzir as suas mensagens.
Passando a ser conhecido como “Criptograma do Vestido de Seda”, o mistério chegou a figurar entre os 50 principais códigos sem solução do mundo para alguns criptógrafos, até que, finalmente, foi decodificado.
O que dizia o Criptograma do Vestido de Seda?
O analista de informática Wayne Chan, da Universidade de Manitoba, no Canadá, foi quem descodificou o texto e resolveu o mistério, descobrindo não apenas o significado das palavras cifradas, mas também indicando uma data bastante provável para sua confecção: 27 de maio de 1888.
Entre os mistérios em torno do criptograma, estava o seu uso — seria uma comunicação secreta entre espiões? Talvez algo ilícito, como contrabando ou apostas? No final das contas, era algo muito mais mundano.
Chan publicou o achado numa revista científica voltada para mensagens secretas, Cryptologia, revelando tratar-se de… observações meteorológicas! As mensagens eram um tipo de código telegráfico usado pelo Exército dos Estados Unidos e o Escritório do Clima do país no século XIX para partilhar previsões do tempo para cidades da forma mais barata possível. Na época, mandar um telegrama era caro, com cada palavra a custar vários dólares, em um tempo em que a cotação da moeda a fazia valer muito mais.
Alguns códigos telegráficos eram usados comercialmente e em larga escala, sem muita cerimónia ou segredo, e todos sabiam que era uma tática para economizar dinheiro. No caso do Criptograma do Vestido de Seda, o código servia apenas para um grupo restrito de oficiais do governo encarregados de criar um mapa meteorológico nacional.
Segundo Chan, embora centenas de telegramas climáticos fossem enviados com ele todos os dias, as mensagens eram inúteis após a tradução, então poucas devem ter sido arquivadas.
Como o código funcionava
Os papéis criptografados do vestido estão entre os poucos exemplos já encontrados, e cobrem a meteorologia de regiões dos Estados Unidos e Canadá. O significado só pôde ser desvendado por causa de um livro de códigos do Exército Americano de 1877 recuperado e disponibilizado na internet.
O truque é o seguinte: considere a frase “Memphis Target Kernel One Nile Bigot Tide”. A primeira palavra, Memphis, refere-se à estação meteorológica da cidade do mesmo nome. A segunda, Target, descreve a pressão e temperatura.
Uma única palavra descreve ambas as características ao ser quebrada em duas partes — as que começam com vogais, por exemplo, indicam valores de pressão e temperatura abaixo de 0,1, enquanto as que começam com consoantes indicam um aumento desses valores de acordo com sua posição no alfabeto.
Se a 2ª palavra do código for Dundee, por exemplo, “Du” indica um barómetro marcando 0,2 e “de” indica temperatura de 24 ºC. A 3ª palavra, Kernel, indica a hora do dia e humidade, com One e Nile a indicar vento e precipitação. Bigot refere-se à velocidade do vento e máximo de temperatura prevista, e Tide informa a cheia do rio.
Além de usar o livro de códigos para decifrar as frases, Chang também descobriu que a formatação das estações canadianas era diferente da americana, e, em seguida, procurou dados meteorológicos do país para descobrir qual dia estaria a ser descrito; Era, muito provavelmente, 27 de maio de 1888.
As previsões do tempo locais do dia provavelmente convergiram para uma sala telegráfica no Departamento de Guerra em Washington, capital dos EUA. Embora não houvesse mulheres a trabalhar como operadoras no local, havia atendentes, copistas, datilógrafas e encadernadoras.
A equipa escriturária deve ter recebido os códigos, com a dona do vestido a figurar entre elas. A razão para os códigos estarem num bolso secreto “quase inacessível”, como a compradora descreve, é desconhecida. O nome costurado ao item é Bennet, única dica até o momento.
// CanalTech