“Atenção: o médico que está a tratar de si não dorme há 20 horas”

Não é só cá. E é uma médica que deixa o aviso: “O médico que deve tratá-lo provavelmente não dorme há 20 horas, não come há 8 horas ou não foi à casa-de-banho. É normal aqui”.

O desgaste dos profissionais de saúde, e os consequentes riscos, têm sido assunto em Portugal. Mas chega um relato preocupante de outro país, que mostra que não somos um caso isolado.

E o relato chega de um dos países mais desenvolvidos do planeta: a Alemanha.

Também lá existem hospitais realmente sobrecarregados, médicos, enfermeiros e auxiliares exaustos. Situação no limite.

O Zeit recolheu o depoimento de uma médica experiente, numa clínica de uma grande cidade alemã. Os nomes da médica (ginecologista) e da cidade não foram revelados.

A profissional tem noção de que há alemães que (tal como cá) ficam horas à espera nas urgências. Ninguém aparece.

E, quando alguém aparece, eis que surge um médico “stressado e exausto”. E os utentes sentem-se “invisíveis e mal-tratados”.

Mas a rotina de muitos médicos alemães resume-se a isto: falta de tempo. “Quando os doentes esperam, não é porque nós (médicos) fizemos longas pausas para almoçar ou porque gostamos de fumar cigarros no quintal”.

“Nada disso. O médico que vai tratar de si, provavelmente, não dormiu durante 20 horas, não comeu nas últimas 8 horas, ou nem foi à casa-de-banho. Isso faz parte do quotidiano nas clínicas alemãs”, alerta.

A médica aborda depois a versão de 2017 do Juramento de Hipócrates, que os médicos fazem ao iniciar a carreira.

Nesse documento lê-se, já desde o original: “A saúde do meu doente será a minha primeira preocupação“. Mas, mais abaixo, agora lê-se: “Vou cuidar da minha saúde, do meu bem-estar e das minhas capacidades para prestar cuidados da maior qualidade”.

Ou seja: a saúde do doente depende da saúde do médico.

Passados oito anos de trabalho na clínica, esta médica tem noção de que, com esta rotina, já não consegue cumprir tudo que está no juramento.

“Você sabe quantas vezes eu estou numa sala de parto às 4h da manhã e já tenho 20 horas de trabalho atrás de mim?”, questiona a ginecologista.

A rotina é correr de uma sala para outra, de um caso para outro – sempre à espera que não haja complicações na sala de parto anterior. São, por vezes, 90 horas de trabalho numa semana.

Faltam profissionais de saúde, médicos neste caso: “Por causa de um impiedoso cálculo de pessoal, a excepção tornou-se a regra. Estamos cronicamente e perigosamente sobrecarregados”, descreve.

“Não tenho tempo para me recompor, muito menos para me recuperar do que acabei de passar. Às vezes parece uma guerra“.

E, a esta altura, os médicos já aceitaram que “o esgotamento é uma condição permanente“.

ZAP //

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