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Mais snacks, mais ecrãs, mais tristeza. O que mudou nas crianças com a pandemia

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Sedentarismo, desnutrição, tristeza e solidão aumentaram, diz novo estudo, mas também houve melhorias, nomeadamente no tempo passado em família.

Um em cada cinco pais inquiridos num estudo europeu relatou que os filhos começaram a consumir mais snacks salgados e doces durante a pandemia, apesar de terem comido com maior frequência fruta (10,3%), hortícolas (7%) e laticínios (10,8%).

O novo estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) revela que o consumo alimentar se manteve inalterado para 70 a 80% das crianças, mas a perceção dos pais sobre o estado nutricional dos filhos duplicou para o excesso de peso (passando de 8% antes da pandemia para 16% no período pandémico) e baixou de 82 para 73% a percentagem de crianças percecionadas como tendo peso normal.

Em declarações à agência Lusa, Ana Rito, investigadora do INSA que liderou o estudo, apontou como aspeto positivo da pandemia ter havido uma melhoria de vários comportamentos familiares, como a “partilha das refeições em família” (29%), “preparar refeições em conjunto com a criança” (30%) e “compra de alimentos em grandes quantidades” (28%), em vez da ida ao supermercado.

“Embora nunca associemos aspetos positivos à pandemia, houve, de facto, um ou dois aspetos que temos que realçar e um deles foi o maior tempo passado com a família (…) que permitiu que a criança estivesse mais perto da mãe e do pai na hora de cozinhar”, recuperando algo que se tem vindo a perder no estilo de vida atual, comentou.

Sedentarismo e má alimentação aumentam

Houve, contudo, “muitos outros” aspetos que “não foram mudanças tão positivas na altura”, disse Ana Rito, exemplificando que, se por um lado se observou um aumento no consumo de frutos e vegetais em Portugal, muito semelhante à média europeia, e um decréscimo no consumo de refrigerantes e de produtos açucarados, verificou-se, por outro lado, que “as crianças consumiram muito mais produtos açucarados de outra natureza, como as bolachas, os bolos e snacks salgados“.

Também aumentaram “em larga escala” as atividades sedentárias, verificando-se um decréscimo do tempo que as crianças passaram a brincar ativamente nos dias de semana (28%) e no fim de semana (23%) e 36% aumentaram o tempo gasto a ver televisão, a jogar videojogos ou nas redes sociais.

Mais de um terço das crianças em idades escolar (34%), entre os seis e os dez anos, aumentou o tempo consumido na aprendizagem em casa, incluindo a “telescola“, em mais de três horas diárias, tendo os pais reportado também um aumento do número de horas de sono das crianças nos dias de semana (15%) e fim de semana (17%).

“O aumento significativo destas atividades sedentárias, combinado com não haver oportunidade para as crianças poderem praticar atividade física [devido ao confinamento] (…) foi algo que certamente terá tido um impacto no estado nutricional e na saúde destas crianças”, assim como “o maior consumo de produtos açucarados e produtos desinteressantes ao nível alimentar”, salientou Ana Rito.

Ressalvando que a pandemia não terá sido “a única causa” para o aumento ligeiro do excesso de peso e obesidade que se verificou em Portugal, a investigadora afirmou que foi “um período bastante difícil para estas crianças e para todos” também em questões relacionadas com o bem-estar, a saúde mental e o estado psicossocial.

E mais tristeza e solidão

A maioria das famílias de 17 países europeus inquiridas no estudo percecionou um agravamento geral do bem-estar dos seus filhos durante a pandemia de covid-19, com a tristeza e a solidão a afetar uma em cada cinco crianças.

Em média, segundo a perceção dos pais, a “capacidade das suas crianças se divertirem com os amigos” piorou em 42% dos casos, nomeadamente na capacidade da criança poder “desfrutar de atividades no tempo livre” (27%) ou de “ter tempo suficiente para si própria” (19%).

A perceção dos pais de tristeza e solidão nas suas crianças foi mais frequente no período pandémico para uma em cada cinco crianças (20% e 24%, respetivamente) e uma em cada quatro crianças foi também percecionada pelos pais como sentindo-se menos bem e em forma.

Perante estes resultados, Ana Rito defendeu ser necessário fazer uma “reflexão conjunta” sobre os impactos desta vivência em crianças que tinham entre 6 e 10 anos e que hoje são adolescentes.

“Foi um impacto bastante grande nos comportamentos psicossociais destas crianças” numa altura muito importante das suas vidas em que “aprendem a socializar com os amigos e com os colegas e com os professores” na escola.

Dificuldades financeiras das famílias aumentaram

Segundo o estudo, as dificuldades financeiras das famílias europeias aumentaram durante a pandemia.

Entre 2020 e 2022, 22% das crianças, 30% das mães e 26% dos pais testaram positivo para a covid-19 nos países estudados, uma prevalência que em Portugal atingiu os 55,3% nas crianças.

O estudo “O impacto da pandemia de covid-19 na rotina diária e nos comportamentos das crianças em idade escolar na Europa: resultados de 17 Estados-Membros”, apresentado em Lisboa esta terça-feira, reuniu dados de quase 55 mil famílias e crianças, sendo a maioria rapazes (51,8%) e crianças de oito anos (54,8%).

Coordenado pelo Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge (INSA), o estudo pretendeu conhecer e compreender o impacto da pandemia covid-19 (2020-2022) com base na perceção dos pais em relação a seis dimensões: Consumo alimentar, comportamentos familiares, atividade física e comportamentos sedentários, características do ambiente familiar, estado nutricional infantil, saúde mental e bem-estar.

ZAP // Lusa

1 Comment

  1. Bem vindos a uma sociedade secular…. Ainda vai ficar pior com os anos.

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