Será que há algum padrão universal entre as profanidades? A ideia de que os sons dos palavrões contribuem para o seu caráter ofensivo viola um princípio linguístico: o de que a relação entre o som de uma palavra e seu significado é arbitrária.
Alguns especialistas em linguagem acreditam que esse princípio é uma característica definidora da linguagem. Por exemplo, é difícil discernir algo semelhante a uma janela nos sons em “janela”. A palavra tem sons completamente diferentes noutras línguas, desde fenêtre em francês, até شباك (“shubak”) em árabe e חלון (“chalon”) em hebraico.
No entanto, há casos, como a onomatopeia, em que as palavras soam como o que significam (pense no “zumbido” de uma abelha). Da mesma forma, as pessoas associam o som i com tamanho pequeno. E a palavra para nariz tem mais probabilidade de conter o som nasal n em diferentes idiomas do que seria de se esperar por acaso.
Alguns investigadores argumentam que os palavrões têm sons que contribuem para a sua ofensividade. A filósofa Rebecca Roache sugere que “o som ‘rápido e áspero‘ dos palavrões … plausivelmente adiciona drama à alegre emoção de quebrar o tabu”.
A teoria mais popular é que os plosivos (sons consonantais produzidos pelo bloqueio completo do fluxo de ar quando ele sai do corpo, como p, t e k) permitem uma expressão enfática de raiva ou frustração. O cientista cognitivo Benjamin Bergen, baseado nos Estados Unidos, argumentou que terminar um palavrão com um desses sons é útil, pois “são precisamente o tipo de palavra que pode querer interromper e murmurar para os seus botões”.
Um estudo canadiano de 2010 comparou os sons de palavrões em inglês com os de canções de natal e canções de embalar e descobriu que os palavrões tinham uma proporção maior de sons plosivos e menos sons sonoros (sons da fala com qualidade nasal e deslizante), como l e w.
Mas isso pode ser uma esquisitice do inglês. Ocasionalmente, pode encontrar-se uma concordância entre um som e um significado num idioma, mas não em outros. Por exemplo, mais de um terço das palavras em inglês que começam com “gl” referem-se a visão ou luz, como “glisten” e “glow”, no entanto, essa associação surgiu aleatoriamente e é específica do inglês.
Os resultados
No primeiro estudo de uma nova série de pesquisas, os cientistas procuraram saber se alguns sons em palavrões de línguas distantes aparecem com mais ou menos frequência do que se esperaria.
Foram recrutados falantes fluentes de várias famílias linguísticas diferentes: hebraico, hindi, húngaro, coreano e russo, e foi-lhes pedido que dessem uma lista dos piores palavrões no seu idioma (alguns participantes relataram ter gostado muito). Em seguida, compararam-se os sons desses palavrões com os das palavras de controlo.
Não foram encontradas provas de que plosivas fossem particularmente comuns em palavrões. Isso sugere que qualquer abundância de plosivas em palavrões pode estar restrita ao inglês e idiomas relacionados.
Mas um grupo de sons chamados “sons aproximados” (que são criados com uma leve obstrução ao fluxo de ar, como l, r, w e y) raramente aparecem em palavrões no conjunto de idiomas analisado.
Em seguida, foi feita a experiência “sweardar”. Foram criados pares de pseudopalavras “estrangeiras” que diferiam em apenas um som (como yemik e chemik). Um membro de cada par continha um som aproximado e o outro um som de controle, por exemplo, ch. 215 falantes de vários idiomas (árabe, chinês, finlandês, francês, alemão e espanhol) ouviram os sons. A tarefa deles era adivinhar qual das duas pseudopalavras era um palavrão.
Se os sons aproximados são menos adequados para palavrões, as pessoas estariam menos propensas a pensar que as pseudopalavras com um som aproximado eram palavrões do que as palavras de controlo correspondentes. E foi isso que os resultados mostraram. As pessoas consistentemente julgaram que as palavras estrangeiras sem os sons aproximados eram os palavrões.
Isto fez os autores pensar se podemos tornar um palavrão menos ofensivo ao inserirmos aproximantes na palavra. Para investigar essa hipótese, voltaram ao inglês para olhar para “minched oaths”. “Minched oaths” são versões higienizadas de palavrões formadas pela alteração de um ou mais sons. Por exemplo, mudar “car****” para “caraças”.
Os resultados mostram que estas versões higienizadas têm mais do dobro de sons aproximados do que os palavrões. Portanto, parte do motivo pelo qual “frigging” parece mais apropriado para uso em companhia educada do que “fucking” pode ser porque contém um som aproximado, r.
Linguagem forte
Dizer palavrões é regulamentado pela lei em muitos países. Algumas palavras são consideradas tão ofensivas que ficam restritas a espetáculos noturnos. Mas dizer palavrões pode ser bom para nós.
Dizer palavrões em voz alta aumenta a tolerância à dor e aumenta o desempenho físico.
Parte do que dá força aos palavrões são os assuntos tabu aos quais eles se referem. Os suspeitos habituais incluem excreção e sexo. No entanto, a pesquisa sugere que os sons em palavrões também podem desempenhar um papel importante. Os resultados indicam que os palavrões têm padrões sonoros universais – pelo menos no nosso planeta.
ZAP // The Conversation