Juíza brasileira tentou impedir aborto a menina de 11 anos após violação

Solon Soares / Assembleia Legislativa de Santa Catarina

A juíza Joana Ribeiro Zimmer, titular da Comarca de Tijucas.

Uma juíza do estado de Santa Catarina terá induzido uma menina de 11 anos, que engravidou após ter sido violada, a não abortar, apesar da lei o permitir, num caso que está a ser denunciado por media brasileiros.

Segundo um vídeo divulgado pelo The Intercept Brasil, numa audiência a vítima, à época com dez anos, foi questionada pela juíza Joana Ribeiro Zimmer, titular da primeira Vara Cível da Comarca de Tijucas, em Santa Catarina, responsável pelo pedido de autorização para o aborto, se queria ver o feto nascer e respondeu que não.

As imagens da audiência, obtidas de fonte anónima, sem identificarem a vítima, mostram a menina a ser questionada pela juíza acerca de quanto tempo conseguiria ficar com o “bebé na barriga” para ele nascer e posteriormente ser encaminhado para adoção, numa ação que aparentemente contraria a lei, a vontade da vítima e de sua mãe.

A menina primeiro respondeu que não sabe, depois a juíza continua a interrogá-la até aceitar ficar algumas semanas grávida até que fosse possível induzir o parto.

O vídeo da audiência mostra depois uma promotora, da 2.ª Promotoria de Justiça do município de Tijucas, a afirmar à menina que o feto “está completo, e já é um ser humano” e começa a questioná-la.

A menina quase não fala enquanto é interrogada pela promotora. No vídeo também consta parte do depoimento da mãe da vítima.

A juíza chega a questionar a menina violada se o “pai do bebé”, referindo-se ao suposto violador, concordaria com uma adoção caso permanecesse com o feto até ao seu nascimento, ao que a vítima responde não saber.

Além do vídeo, o site conta que a família da menina a levou dois dias após a descoberta da gravidez até ao Hospital Universitário Professor Polydoro Ernani de São Thiago da Universidade Federal de Santa Catarina, planeando realizar o aborto, no início de maio.

O Código Penal do Brasil permite o aborto em caso de violência sexual, sem impor qualquer limitação de semanas da gravidez e sem exigir autorização judicial, mas a equipa médica do hospital se recusou a realizar o aborto, já que só faz este tipo de procedimento em mulheres com até 20 semanas de gravidez.

A lei brasileira também permite a realização de aborto quando a mãe corre risco de vida e, segundo o The Intercept Brasil, a criança grávida corre risco devido à sua idade, condição observada em relatórios de uma equipa médica anexados ao processo e especialistas consultados pela reportagem.

Na sequência da recusa do hospital, a juíza decidiu em despacho de 1 de junho que a vítima, além de não realizar aborto, deveria ir para um abrigo para ser protegida do suspeito de ser o seu violador, mas acrescentou que “o facto é que, doravante, o risco é que a mãe efetue algum procedimento para operar a morte do bebé”.

Normas sobre aborto legal no Brasil têm sido questionadas no Brasil, nomeadamente após o início do Governo liderado pelo Presidente, Jair Bolsonaro, que se posiciona contra o aborto mesmo em casos previstos na lei.

Questionada pelo The Intercept Brasil, a juíza informou que “não se manifestará sobre trechos da referida audiência, que foram vazados de forma criminosa”, “não só por se tratar de um caso que tramita em segredo de justiça, mas, sobretudo para garantir a devida proteção integral à criança”.

Já a promotora respondeu que o hospital “se recusou a realizar a interrupção da gravidez” e que, caso houvesse “uma situação concreta de risco”, seria “obrigação” dos médicos agirem, o que não aconteceu. E alegou não saber que o aborto em estágio mais avançado de gravidez é realizado de forma que o feto saia do útero já sem batimentos cardíacos.

Justiça brasileira vai investigar juíza

O poder judicial brasileiro anunciou esta terça-feira que vai investigar a conduta da juíza Joana Ribeiro Zimmer.

O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina afirmou numa declaração que tinha iniciado um processo na esfera administrativa para “o devido exame dos factos” deste caso, que está a decorrer sob o sigilo de um processo sumário “porque envolve um menor”.

ZAP // Lusa

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