Ilhas artificiais de 11 mil milhões de euros tornaram-se o “projeto mais inútil do mundo”

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Earth Observatory / NASA / Wikimedia

O Mundo ou The World, projeto de ilhas artificiais no Dubai

No final do século passado, os Emirados Árabes Unidos iniciaram um ambicioso projeto para construir luxuosos complexos em ilhas artificiais.

Embora não tenha sido uma ideia original — no Lago Titicaca, entre o Peru e a Bolívia, há ilhas artificiais com vários séculos de história — o projeto chamou à atenção, entre outras coisas, por apresentar um desenho de figuras elaboradas e simétricas que podiam ser observadas do alto.

Um desses projetos, talvez o mais ambicioso deles, era o chamado “O Mundo“: compreendia um arquipélago de quase 300 ilhas artificiais que recriava a forma dos sete continentes, como visto nos mapas.

O plano foi lançado pelo próprio primeiro-ministro dos Emirados Árabes Unidos, Mohamed bin Rashid Al Maktoum, em 2003.

A ideia era que os compradores interessados ​​pudessem escolher uma ilha que simulasse o formato de um país ou uma região — do Reino Unido e Estados Unidos até à Gronelândia.

Com um investimento de 11 mil milhões de euros, com quase 321 milhões de metros cúbicos de areia e 386 milhões de toneladas de pedra, o objetivo era criar ilhas que pudessem ser convertidas em propriedades luxuosas para as pessoas mais ricas do mundo.

“Os Emirados Árabes Unidos queriam encontrar uma forma de substituir a dependência do petróleo como principal fonte de recursos. E a escolha foi o negócio imobiliário”, explica o professor Alastair Bonnett, geógrafo da Universidade de Newcastle, no Reino Unido, e autor do livro “Elsewhere – A Journey into Our Age of Islands”

“O modelo de ilhas artificiais, que foi copiado por outros países como a Nigéria, teve sucessos e fracassos“, salienta Bonnett.

E este empreendimento nos Emirados Árabes Unidos parece ser um dos que não prosperaram como planeado: o portal Top Luxury acaba de declarar “O Mundo” como o “megaprojeto mais inútil do planeta“.

A razão é simples: 21 anos após o início da iniciativa, apenas algumas ilhas foram completamente construídas. Além disso, vistas do céu, parecem uma série de pontos desertos e abandonados que estão longe de formar um mapa do mundo.

“Nenhum dos planos traçados foi realizado. Da forma como as coisas estão, a maioria das ilhas que compõem ‘O Mundo’ ficou deserta e forma terrenos vazios de areia”, descreve o portal.

Com 60% do empreendimento vendido e com os próprios promotores a assegurar que os planos continuam de pé, várias investigações indicam que as ilhas já apresentam alguns sinais de erosão.

Mas como é que um empreendimento que contava com o apoio de um país em expansão se tornou um complexo fantasma?

A palmeira e o mundo

Em 1999, os Emirados Árabes Unidos apresentaram-se ao planeta como um país moderno e internacional.

Nesse mesmo ano, foi inaugurado o hotel Burb al Arab, que redefiniria o conceito de luxo no mundo.

Além disso, o sheik dos Emirados Árabes Unidos também anunciou a construção do projeto “A Palmeira Jumeirah“, um complexo residencial e hoteleiro que se ergueria numa ilha artificial que, como o nome indica, teria o formato de uma palmeira.

Esse projeto teve um bom desempenho em vendas e incentivou planos de construção de outros empreendimentos semelhantes.

Em 2003, o próprio Al Maktoum deu luz verde à construção do empreendimento “O Mundo”, que tentava, numa escala muito maior, replicar o sucesso da “Palmeira Jumeirah”.

Havia um projeto ainda mais ambicioso: tratava-se de um complexo de ilhas chamado ‘O Universo‘, onde também foram desenhados espaços como a Via Láctea, o Sol, a Terra”, lembra Bonnett.

O plano era arrojado, mas com alguma simplicidade: consistia basicamente em instalar cerca de 300 ilhas artificiais, para que pessoas ricas pudessem adquirir um “pedaço do mundo” e nele construíssem o que quisessem.

Como salienta Oliver Wainwright, repórter do jornal britânico The Guardian, “os projetos em cada ilha também foram bastante marcantes: um bilionário chinês traçou planos para refazer o horizonte de Xangai na sua ilha, com uma réplica da icónica Torre de Televisão da cidade”.

Uma empresa chamada Opulence Holdings adquiriu o pedaço de areia equivalente à Somália, “com a ambição de a esculpir com a forma de um cavalo-marinho, onde os residentes pudessem jogar golfe a partir das suas varandas”, acrescenta Wainwright.

Na prática, porém, apenas alguns complexos foram construídos. Um deles, com o formato da Gronelândia, recebeu uma espécie de “casa modelo” que expunha tudo o que o projeto incluiria no futuro — não apenas espaços residenciais, mas também resorts e restaurantes.

Outro empreendimento foi um casa doada, esta já totalmente construída, ao heptacampeão mundial de Fórmula 1, Michael Schumacher.

No entanto, a crise financeira de 2008 acelerou o colapso do projeto. Muitos dos investidores que se comprometeram em comprar as casas ficaram sem recursos para continuar adiante. Desse modo, os planos iniciais continuam de pé, embora sem grandes avanços.

“Um dos grandes problemas do projeto ‘O Mundo’ é que, ao contrário da ‘Palmeira’, ele não tem ligação física com o Dubai. Não existe uma ponte ou qualquer ligação entre as ilhas”, acrescenta Bonnett.

A empresa Nakheel Properties, que é a atual responsável pelo projeto, indicou em diversas ocasiões que “O Mundo” continua e que eles buscam recursos para seguir em frente.

Outros projetos

Mas o facto de “O Mundo” não ter avançado como o esperado não significa que a ideia de transformar o Dubai num centro de negócios imobiliários naufragou.

Atualmente, a “Palmeira Jumeirah” tem cerca de 4 mil casas, onde residem cerca de 25 mil pessoas, dezenas de hotéis e outras atrações.

Mas, apesar do bom desempenho, o negócio das ilhas artificiais para criar espaço de novos desenvolvimentos urbanos comerciais é um tanto arriscado.

“O aumento do nível do mar torna arriscado o investimento em ilhas. Mas se há algo que caracteriza o Dubai é assumir riscos, mesmo que sejam dispendiosos”, acrescenta Bonnett.

Além disso, a construção de Jumeirah e de outros complexos como “O Mundo” ou a enorme “Ilha Deira” — cuja construção foi interrompida também por falta de recursos — teve um impacto ambiental alvo fortes críticas.

Segundo a Greenpeace, o projeto não é sustentável e  a construção das ilhas artificiais afetou gravemente os recifes de coral localizados nas proximidades da costa dos Emirados Árabes Unidos.

A Nakheel Properties, embora tenha admitido que alguns ecossistemas marinhos foram afetados pelo desenvolvimento do projeto, adiantou entretanto que contratou uma equipa de biólogos marinhos para reconstruir e reabilitar os recifes afetados.

ZAP // BBC

1 Comment

  1. Os gajos não sabem o que fazer com o dinheiro….. Que tal combaterem a fome ou doenças curáveis que matam tanta gente no mundo? Mas não é só projectos ruinosos e …..

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