“Quem rompe, paga”. O que é que Espanha pode aprender com Portugal depois da maioria de Costa

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António Cotrim / EPA

A vitória, com maioria absoluta, do PS de António Costa nas eleições legislativas do domingo passado pode servir como uma “lição” para as forças políticas espanholas, em principal para a coligação de Governo que junta os socialistas do PSOE com os comunistas do Unidas Podemos.

As realidades políticas portuguesa e espanhola são bastante distintas. Contudo, Espanha tem em vigor, nesta altura, uma geringonça de esquerda semelhante à que António Costa cozinhou com o Bloco de Esquerda (BE) e com o PCP e que morreu de vez com a vitória gorda do PS nestas últimas eleições.

No país vizinho, o Partido Socialista espanhol (PSOE) lidera a coligação de Governo com o Unidas Podemos que junta vários partidos, incluindo os comunistas.

“A principal leitura” que o Governo de Pedro Sánchez faz é que o eleitorado português se pronunciou “enfaticamente” pela “estabilidade em tempos de incerteza”, como escreve o jornalista José Enrique Monrosi numa análise no Infolibre.

“Quem rompe com a estabilidade, rompe a ligação com a rua”, consideram fontes governamentais do Executivo de Sánchez, segundo cita o jornalista.

Falando das “lições de Portugal para a esquerda espanhola“, Monrosi nota que “o eleitorado progressista” de Portugal “castiga as forças de esquerda que romperam com os socialistas” no âmbito das negociações do Orçamento de Estado para 2022.

O presidente da delegação espanhola do PSOE no Parlamento europeu, Javier Moreno, considera que os eleitores votaram “claramente pela responsabilidade” e elogia a “flexibilidade” de Costa para fazer acordos, conforme cita o mesmo jornalista.

Fontes do gabinete da vice-presidente do Governo espanhol – na prática, é uma das vice-primeiras-ministras de Sánchez -, Yolanda Díaz, do Unidas Podemos, realçam que as eleições portuguesas revelam que “o povo progressista quer cooperação e colaboração entre as diferentes forças políticas”, refere ainda o artigo do Infolibre.

Galega e comunista (é militante do PCP espanhol, um dos partidos que integra o Unidas Podemos), Yolanda Díaz é vista como uma potencial futura primeira-ministra, com a sua popularidade em crescendo.

Nos próximos dias, vai ter um combate decisivo pela reforma laboral que será uma prova de fogo para o Governo de Sánchez e, em especial, para a sua maioria de esquerda no Parlamento.

Iglesias a mexer cordelinhos nos bastidores

Com o reflexo das eleições portuguesas, o Unidas Podemos não está inclinado para entrar numa ruptura incurável com o PSOE. Mas o jornalista Javier Caraballo considera, num artigo de opinião no El Confidencial, que Yolanda Díaz poderá vir a ser vítima do “fogo amigo” dos próximos de Pablo Iglesias.

Depois de ter fundado e deixado o Podemos, Iglesias continua a mexer os cordelinhos nos bastidores, com uma meta clara que é “ganhar”, como reforça Caraballo.

Assim, o jornalista fala do “regresso de Pablo Iglesias”, mesmo que na sombra, e acredita que ele vai definir uma futura estratégia do Podemos “mais agressiva e de confrontação com o PSOE do que tenta impor Yolanda Díaz”.

O núcleo duro de Iglesias quer evitar que, daqui a uns meses, o Podemos fique “diluído na plataforma feminista e de esquerda anunciada” por Yolanda Díaz, salienta ainda Caraballo, frisando que, assim, vai apostar no desgaste da vice-primeira-ministra de Sánchez.

Efeitos “psicológicos”

Em termos de efeitos das eleições portugueses em Espanha, são mais “psicológicos” do que outra coisa, analisa ainda Caraballo no El Confidencial.

O jornalista considera que é “inevitável que o resultado influencie os estados de ânimo dos dirigentes políticos e das suas organizações”, algo que “pode ser determinante para umas futuras eleições”.

Assim, o resultado português é visto pelo PSOE como “um desígnio” e como “o aval da política máxima que prevê que, numa coligação de Governo, o presidente é quem se sai melhor”, vaticina o jornalista.

Já a subida do Chega ao terceiro lugar como força política no Parlamento português também dá “ânimo” ao Vox.

Por outro lado, fazendo um paralelismo entre o PSD de Rui Rio e o PP de Pablo Casado, o jornalista lembra que o líder dos populares espanhóis salientou, a propósito do triunfo socialista em Portugal, que “não vai acontecer o mesmo a Sánchez” em Espanha.

Mas, na perspectiva do jornalista, na verdade, Casado está a pensar: “Espero que a mim não me aconteça o mesmo” que a Rio, a quem as sondagens davam um empate técnico com o PS de Costa.

“Oxalá que Sánchez fosse António Costa”

Para o jornalista galego Bieito Rubido, ex-director do diário ABC, “o melhor” de António Costa foi “o seu discurso depois da vitória eleitoral”, especialmente por ter dito que “a maioria absoluta não quer dizer poder absoluto”, como escreve na sua coluna de opinião no jornal El Debate.

Pedro Sánchez apressou-se a dar os parabéns ao vizinho socialista e Rubido fala de uma “tentativa de refugiar-se na magnífica sombra projectada pela vitória de António Costa”.

“Oxalá que Sánchez fosse António Costa”, escreve ainda Rubido, “não só pela sua bonomia, cordialidade e humildade”, mas “sobretudo, por baixar os impostos, gerir bem a crise económica, desenvolver uma diplomacia serena e exemplar e não carregar com 21%, por exemplo, as máscaras”.

E também “por governar em solitário e saber fazer frente aos extremistas da esquerda portuguesa”, conclui o jornalista.

O galego ainda nota que o “governante espanhol está nos antípodas do seu homólogo lusitano” e aconselha Sánchez de que o seu “Governo social-comunista precisa de um bálsamo urgente de mais democracia”.

Susana Valente, ZAP //

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2 Comments

  1. Mesmo aqui ao lado e não faço ideia do que por lá se passa.
    Pudera, vejo canais de Informação!
    Assim, pelo menos sei quem levou um tiro em carregal-de-baixo.

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