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Na época medieval, quem se suicidasse ainda era torturado depois da morte

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O ciclo de vida e morte é uma verdade eterna da história humana. No entanto, as crenças em torno de ambas são influenciadas e moldadas por uma série de fatores que vêm do passado. Na época medieval, o suicídio era visto como um crime.

Atualmente, as discussões sobre o suicídio adquiriram um maior grau de empatia, pois esta decisão está muitas vezes associada ao bem-estar psicossocial e mental, ou neste caso, à ausência dele.

No entanto, nem sempre foi assim.

Uma pesquisa da académica religiosa australiana, Carole M. Cusack, indica que, no passado, era a religião que controlava essa atitude “medieval” em relação ao suicídio. Os sistemas de justiça criminal, mesmo os seculares, foram influenciados pela teologia e surgiram logo depois na Europa medieval.

O suicídio como pecado

A ideia de suicídio como pecado remonta à altura em que a moralidade cristã e o papel de Judas estavam fortemente interligados.

De acordo com os quatro evangelhos canónicos, Judas Iscariotes foi um dos 12 discípulos de Jesus Cristo, mas a sua traição deu início à cadeia de eventos que levou à crucificação de Jesus.

Para evitar a crucificação, Judas tentou devolver o dinheiro que havia tirado para revelar a identidade de Jesus, mas como isso não ocorreu da forma que tinha previsto, acabou por se suicidar. Com o tempo, o nome de Judas começou a ser associado a traição.

Uma das primeiras visões documentadas sobre o suicídio no Cristianismo são as de Agostinho de Hipona, na Cidade de Deus (413-426 d.C). A sua interpretação do Sexto Mandamento “Não matarás” é vista como englobando o eu.

O religioso classifica o suicídio como uma “maldade detestável e condenável”, equiparando-o a assassinato, diz o Ancient Origins.

Agostinho foi o primeiro a relacionar suicídio com pecado. Juridicamente, a perseguição aos suicidas ocorreu a partir do século VI d.C.

Justiça Medieval

Mais à frente, entre os séculos 10 e 12, em muitas partes da Europa, o suicídio tornou-se um crime doloso.

A Europa pré-industrial, antes de se tornar uma potência imperial, não estava apenas sob a influência da Igreja, mas também do feudalismo.

A natureza proprietária da relação “senhor” e “servo” fazia com que o mestre visse o suicídio de um camponês como uma negação da sua posse. O confisco dos bens do servo foi visto como uma ação legítima para reivindicar o que era “propriedade do Senhor”.

O confisco de terras e propriedades, seja pelo soberano ou pelo monarca, aumentou ainda mais o poder estatista. Com o aumento do controlo autoritário, a punição tornou-se bastante mais severa.

Em Inglaterra, os “Costumes de Anju e Maine”, de 1411, equiparavam o suicídio a violação e assassinato.

Já em França, no mesmo período, as leis previam a demolição da casa da pessoa que se suicidou e um castigo para a família do pecador. No caso de ser um homem, o corpo da vítima, era enforcado novamente e depois queimado.

A “tortura post-mortem” era vista como uma forma legítima de punir o suicídio, particularmente invocando o medo deste ato entre os vivos.

Ana Isabel Moura, ZAP //

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