Se o dono for branco, uma casa vale 1,5 milhões. Se for negro, já só vale 990 mil

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Mark Moz / Flickr

Um casal norte-americano venceu um processo onde provou ter sido alvo de discriminação racial na avaliação à sua casa. Quando pediram a uma amiga branca que se fizesse passar pela dona da habitação, o seu valor disparou 43%.

Uma casa em Marin City, na Califórnia, foi avaliada em 995 mil dólares. Passadas meras semanas, já foi avaliada em 1 482 500 milhões. O que explica esta discrepância?

Não, a casa não tinha sido vandalizada anteriormente nem foi alvo de obras nas semanas de intervalo.

Também não aconteceu nada de significante no seu bairro que pudesse causar esta oscilação de valor. A única diferença era a etnia dos donos.

Em 2020, o casal negro Paul Austin e Tenisha Tate-Austin decidiu convocar um avaliador para saberem quanto é que a sua habitação valia. Apenas algumas semanas mais tarde, decidiram receber uma segunda opinião, mas pediram a uma amiga branca que se fizesse passar pela dona da casa.

Confrontados com a enorme diferença de valores na avaliação, o casal decidiu processar a avaliadora, Janette Miller, e empresa de avaliação imobiliária, Miller and Perotti Real Estate Appraisals Inc, alegando que a discriminação que sofreram era uma práctica comum imposta às minorias raciais.

O processo chegou ao fim esta segunda-feira, com ambas as partes a chegar a acordo sobre uma compensação financiera cujo valor não foi revelado. A avaliadora terá também de fazer uma formação anti-discriminação e terá ainda de ver o documentário Our America Lowballed, da ABC, que abordou o caso do casal Austin.

“Termos de apagar a nossa identidade para termos uma avaliação melhor foi uma experiência dolorosa. Esperamos que trazer atenção ao nosso caso possa ajudar a mudar a forma como esta indústria opera“, afirmou Tenisha Tate-Austin, num comunicado publicado pelos seus advogados.

A casa em questão fica num bairro onde 36% da população é negra, em comparação com apenas 1% no bairro próximo de Sausalito. O casal comprou a casa por 550 mil dólares no final de 2016, tendo feito obras de remodelação no valor de 400 mil dólares em 2017 e 2018.

Em Março de 2019, foi feita uma avaliação à habitação no valor de 1,45 milhões de dólares. Em busca de financiamento adicional numa altura em que as taxas de juro eram baixas, o casal pediu uma nova avaliação em Janeiro de 2020, desta feita pela mão de Janette Miller, que lhe atribuiu um valor de 995 mil dólares.

O casal decidiu tentar novamente em meados de Fevereiro de 2020, mas desta vez fizeram uma “lavagem” à casa — retiraram todas as suas fotos e arte com temas afro-americanos e convidaram uma amiga branca a fazer-se passar pela dona da casa e mostrar fotos da sua família. A nova avaliação foi 49% mais alta.

Para a directora executiva da Fair Housing Advocates, o caso dos Austin é um sintoma de um problema sistémico. “Infelizmente, a experiência deles não é única. Estudos mostram que os candidatos negros e latinos têm uma maior probabilidade de receber valores de avaliação mais baixos tanto nas vendas como nos processos de refinanciamento”, explica Carolyn Peattie ao San Francisco Chronicle.

As assimetrias nas avaliações das casas aumentam ainda mais a lacuna entre a riqueza das famílias brancas e de minorias étnicas e perpetuam o legado do redlining, uma política federal racista que durante décadas segregou a população por etnia e condenou os negros a viver nas zonas mais pobres das cidades.

Em 2021, uma análise a mais de 12 milhões de avaliações de casas concluiu que as casas nos bairros onde vivem mais negros tinham, em média, uma desvalorização 23% superior à registada nos bairros maioritariamente brancos.

Um estudo de 2022 com dados da Agência Federal de Financiamento para a Habitação também concluiu que os donos de casas brancos tinham uma probabilidade duas vezes superior de ver o valor da sua habitação subir em comparação com donos que pertencem a minorias étnicas.

A lacuna tem aumentado ao longo da última década e, geralmente, as casas nos bairros brancos têm avaliações duas vezes e meia mais altas do que as casas nos bairros negros. No caso dos bairros latinos, a discrepância é ainda maior.

Adriana Peixoto, ZAP //

3 Comments

  1. Numa escola havia muitos alunos de cor. Um dia guerrearam porque os brancos ficava sempre nas cadeiras da frente e os outros nas cadeiras de trás. A professora disse. A partir de agora não há distinção de cores, agora somos todos cinzentos. Todos os alunos concordaram. Quando a discussão acabou diz a professoras: agora os cinzentos claros ficam aqui a frente e os cinzentos escuros vão lá para trás.

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