Uma deficiência de vitamina pode ter mudado o curso da história da Antártida

James Murray / Wikimedia

Da esquerda para a direita: Frank Wild, Ernest Shackleton, Eric Marshall e Jameson Adams

Da esquerda para a direita: Frank Wild, Ernest Shackleton, Eric Marshall e Jameson Adams.

Ernest Shackleton terá sofrido de beribéri, uma doença causada pela deficiência de vitamina B1, que poderá ter mudado o curso da história da Antártida.

Como parte da Expedição Discovery, em novembro de 1902, às regiões antárticas, Ernest Shackleton, Robert Falcon Scott e Edward Wilson exploraram a plataforma de gelo Ross.

Em janeiro de 1903, o trio movia-se para norte em direção ao mar aberto, onde esperava lá um navio por eles. Falcon Scott e Wilson puxavam o trenó e, ao seu lado Shackleton tentava acompanhar o ritmo nos seus esquis.

Wilson, o médico da expedição, notou no seu diário que Shackleton sofria de falta de ar e, devido à fraqueza que sentia, não conseguia puxar o trenó.

Segundo um novo estudo, Shackleton sofria de beribéri, uma deficiência nutricional causada pela falta de vitamina B1, resultando em fraqueza muscular, problemas gastrointestinais e dificuldades respiratórias.

“Ele era, obviamente, um personagem tremendo, em muitos aspetos, fisicamente muito poderoso”, disse o anestesista Ian Calder, citado pelo Atlas Obscura. “O que me intrigou foi que ele parecia sempre estar a desmaiar”.

Apesar dos seus incríveis feitos no continente, as notas da expedição salientavam que Shackleton sentia uma ocasional incapacidade de pôr-se a pé sozinho.

A sua morte prematura foi atribuída a problemas cardíacos devido a ser um fumador ávido há várias décadas. Um estudo publicado na revista Journal of the Royal Society of Medicine, em 2016, apresentou evidências de que Shackleton tinha arritmias recorrentes.

Mas agora, num novo estudo publicado no Journal of Medical Biography, o autor principal, Paul Firth, sugere que beribéri terá sido a doença misteriosa que levou à morte do explorador e que poderá ter mudado o curso da história do continente.

Depois do incidente na plataforma de gelo Ross, Shackleton foi considerado inapto para continuar a participar com a Expedição Discovery.

Foi então Shackleton voltou para Londres e angariou dinheiro para fazer a sua própria expedição.

“Na sua segunda expedição, no Nimrod, ele partiu para o Polo Sul e por pouco não conseguiu chegar lá, mas foi aí que ele ficou famoso”, explicou Firth. “Foi a deficiência de vitamina B1 que o iniciou no seu caminho como explorador independente. Se ele não tivesse beribéri não teria feito o seu próprio caminho, como líder”.

Ao examinar os registos médicos da exploração polar, Firth encontrou casos diagnosticados de beribéri em expedições posteriores. Wilson escreveu “beribéri” nas suas anotações, mas nunca fez esse diagnóstico oficial.

“O beribéri estava predominantemente no Extremo Oriente e no Sudeste Asiático. Então, quando apareceu na Antártida, o que eles reconheceram foi escorbuto, porque eram europeus. Eles não reconheceram que era beribéri porque estavam a pensar como europeus”, sublinha Firth.

Nem todos concordam, no entanto.

“O difícil de explicar é porque é que Shackleton foi mais afetado do que Scott ou Wilson, que estavam com ele. Eles estavam basicamente a comer a mesma dieta”, disse o geógrafo histórico Ed Armston-Sheret.

Apesar das conclusões deste novo estudo, é provável que o mistério da saúde de Shackleton perdure.

Em 1914, o explorador anglo-irlandês embarcou no navio Endurance para a sua terceira viagem à Antártida e planeava atravessar a região via Polo Sul.

Contudo, em 1915, o barco encalhou e afundou-se ao fim de dez meses, ao ser esmagado pelo gelo.

A expedição tornou-se lendária por causa das condições de sobrevivência da tripulação — ao todo eram 28 elementos e todos sobreviveram —, que acampou por meses no gelo antes deste derreter. Ernest Shackleton e seus companheiros partiram em pequenas embarcações para a ilha Elefante, ao largo da Península Antártida.

Da ilha, o explorador e a sua equipa fizeram uma viagem traiçoeira de 1.300 quilómetros até à ilha de Geórgia do Sul, com o barco “James Caird”, tendo chegado ao seu destino 16 dias depois, corria o ano de 1916.

Daniel Costa, ZAP //

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