Uma criança sul africana, de nove anos, que nasceu com VIH viveu de forma saudável durante quase nove anos sem medicamentos, tendo apenas sido submetida a um tratamento durante os seus primeiros meses de vida, segundo um estudo divulgado esta segunda-feira.
Trata-se do terceiro caso de remissão do VIH sem tratamento com medicamentos que é observado numa criança, sublinha o estudo que foi apresentado na conferência internacional sobre investigação em VIH/sida que decorre em Paris, pela médica Avy Violari.
Isto “vem reforçar as esperanças de um dia libertar crianças seropositivas do fardo de um tratamento ao longo da vida, tratando-as por um curto período nos primeiros meses de vida”, refere Anthony Fauci, diretor do Instituto norte-americano de Doenças Infeciosas.
O investigador ressalva que é sempre possível haver uma recaída, como em qualquer remissão. “Mas o facto de esta remissão ser verificada por um longo período sugere que pode ser sustentável”, indicou ainda, citado pela agência France Presse.
A rapariga sul-africana foi submetida a partir dos dois meses a tratamentos antirretrovirais, o que dificultou o desenvolvimento do vírus da sida. Quarenta semanas depois o tratamento foi interrompido deliberadamente no âmbito do estudo, verificando-se que o vírus tinha sido reduzido a uma carga indetetável.
Oito anos e nove meses depois, o vírus do VIH permanece com carga indetetável mesmo não se tendo submetido a mais tratamentos.
Segundo o Observador, a criança sul-africana fez parte de um estudo,realizado entre 2005 e 2011, que envolveu 370 crianças infetadas com VIH. Foram divididas em três grupos: umas receberam um tratamento antirretroviral logo após o nascimento e durante 40 semanas; outros durante 96 semanas; e o terceiro grupo não foi submetido de imediato ao tratamento, mas foi recebendo-o ao longo do tempo – como se fazia na altura em que se deu início ao estudo.
O estudo comprovou que, no caso das crianças que foram submetidas ao tratamento logo após o nascimento, a taxa de mortalidade diminuiu em 76% e a progressão da doença diminuiu 75%. Mas só nesta criança sul africana é que o vírus não foi detetado.
“Isto é mesmo muito raro. Ao estudar estes casos, esperamos conseguir compreender como é que podemos parar o tratamento”, afirmou Violari, citada pela CNN, acrescentando que há algo “único” a nível biológico e no sistema imunitário desta criança que ajudou a que o vírus ficasse em remissão.
Das outras duas crianças em todo o mundo a quem isto aconteceu, apenas uma continua com o vírus em remissão. É o caso de um francês, atualmente com 20 anos, cuja mãe tinha VIH. O jovem também recebeu um tratamento antirretroviral pouco tempo depois de nascer e parou quando tinha seis anos. Desde então, o vírus não é detetado através dos testes habituais.
Uma rapariga, nascida em 2010 no estado do Mississippi, nos EUA, recebeu o tratamento 30 horas depois de nascer até aos 18 meses de idade. Apesar de ter ficado em remissão durante mais de dois anos, o vírus voltou a ser detetado no sangue em 2015.
Uma situação que já aconteceu com adultos, mas todos ficaram com o vírus em remissão depois de receber transplantes de medula. Hoje em dia, apenas um, Timothy Ray Brown, continua com o vírus em remissão.
A equipa de Violari vai agora analisar esta e outras crianças que participaram no estudo para perceber o que difere esta criança, a nível biológico, das restantes.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), nas crianças infetadas com VIH antes do nascimento, a progressão da doença é muito rápida nos primeiros meses de vida e pode levar à morte. De acordo com a UNAIDS, o programa das Nações Unidas para o VIH/sida, em 2015 havia 1,8 milhões de crianças a viver com o vírus e 110 mil morreram de doenças relacionadas com o VIH.
ZAP // Lusa