Um grupo de cientistas desenvolveu um método para determinar a idade biológica dos seres humanos a partir da flora intestinal. Estas informações podem ajudar a prevenir a morte prematura de um indivíduo.
Os milhões de bactérias no intestino dos seres humanos podem ajudar a regular tudo desde a habilidade de digerir comida até às funções do sistema imunológico. Mas os cientistas sabem pouco sobre como este sistema, conhecido como microbioma, muda com o tempo.
Agora, investigadores que estudam as bactérias intestinais de milhares de pessoas em todo o mundo chegaram a uma conclusão: o microbioma é um relógio biológico surpreendentemente preciso, capaz de prever a idade da maioria das pessoas.
O intestino humano, segundo o artigo publicado no bioRxiv, contém colónias de bactérias vivas que desempenham um papel importante na formação do sistema imunitário, produzem substâncias importantes para o sistema nervoso e também influenciam no processo de desenvolvimento.
Dado que a composição do microbioma intestinal muda durante o curso de vida, é difícil determinar as bactérias que estão associadas ao risco de desenvolver determinadas doenças e ao envelhecimento.
Para descobrir como o microbioma muda com o tempo, o especialista em longevidade Alex Zhavoronkov e colegas da InSilico Medicine, uma startup de inteligência artificial de Rockville, Maryland, examinaram mais de 3.600 amostras de bactérias intestinais de 1.165 indivíduos saudáveis que vivem em todo o mundo.
Das amostras, cerca de um terço eram de pessoas de 20 a 39 anos, outro terço era de pessoas com idade entre 40 e 59 anos e o terço final era de pessoas entre 60 e 90 anos.
Os cientistas usaram a AI para analisar os dados. Primeiro, treinaram o programa em 95 espécies diferentes de bactérias de 90% das amostras, juntamente com as idades das pessoas de quem vieram. Depois, pediram ao algoritmo para prever as idades das pessoas que forneceram os 10% restantes.
O programa previu com precisão a idade de alguém dentro de quatro anos. Das 95 espécies de bactérias, 39 foram consideradas mais importantes na previsão da idade.
Zhavoronkov e os colegas descobriram que alguns micróbios tornaram-se mais abundantes à medida que as pessoas envelheciam, como o Eubacterium hallii, que é considerado importante para o metabolismo nos intestinos.
Outros diminuíram, como Bacteroides vulgatus, que tem sido associado à colite ulcerosa. Mudanças na dieta, hábitos de sono e atividade física provavelmente contribuem para estas mudanças nas espécies bacterianas, disse o co-autor Vadim Gladyshev, um biólogo da Universidade de Harvard que estuda o envelhecimento.
Segundo Zhavoronkov, este “relógio de envelhecimento do microbioma” pode ser usado como uma linha de base para testar a velocidade ou o ritmo do envelhecimento de uma pessoa e se álcool, antibióticos, probióticos ou dieta têm algum efeito sobre a longevidade. Também pode ser usado para comparar pessoas saudáveis com pessoas que têm certas doenças, como Alzheimer, para ver se os microbiomas se desviam da norma.
Se a ideia for validada, juntar-se-ia a outros biomarcadores que os cientistas usam para prever a idade biológica, incluindo o comprimento dos telómeros – as pontas dos cromossomas envolvidas no envelhecimento – e mudanças na expressão do ADN ao longo da vida de uma pessoa.
Combinar o novo relógio de envelhecimento com estes outros poderia render uma imagem muito mais precisa da verdadeira idade biológica e da saúde. Poderia também ajudar os investigadores a testar melhor se certas intervenções – incluindo drogas e outros tratamentos – têm algum efeito no processo de envelhecimento. “Não é preciso esperar que as pessoas morram para realizar esperiências de longevidade”, refere Zhavoronkov.
A ideia de prever a idade de alguém com base no microbioma intestinal é “muito plausível” e de “tremendo interesse” para os cientistas que estudam o envelhecimento, de acordo com Robin Knight, diretor do Centro de Inovação microbiológica da Universidade da Califórnia. O seu grupo está a analisar 15 mil amostras do American Gut Project, um estudo mundial sobre microbiomas.
Mas um dos desafios de desenvolver tal relógio é que existem enormes diferenças em que as bactérias estão presentes nas entranhas das pessoas em redor do mundo. “É importante replicar estes tipos de estudos com populações marcadamente diferentes” para descobrir se há sinais distintos de envelhecimento em diferentes grupos de pessoas.
Além disso, o especialista não se sabe se as mudanças no microbioma levam as pessoas a envelhecer mais rapidamente ou se as mudanças são simplesmente um efeito colateral do envelhecimento.
A InSilico Medicine está a construir vários relógios baseados em IA que podem ser combinados com o microbioma. “A idade é um parâmetro importante em todos os tipos de doenças”, diz Zhavoronkov. “A cada segundo nós mudamos.”
ZAP // Science Magazine