Astrónomos descobrem dois sistemas binários raros

Poon, Zhu, Zanazzi, Universidade de Toronto; Sahl Rowther, et al, Universidade de Warwick

Ilustração original de um disco protoplanetário com estrelas binárias.

Uma equipa internacional de astrónomos identificou apenas o segundo e terceiro exemplos de um tipo raro de sistema estelar composto por duas estrelas centrais que se orbitam uma à outra, englobadas por um disco de gás e poeira.

“Se houvesse um planeta num destes sistemas, seria como o planeta Tatooine da ‘Guerra das Estrelas'”, diz Michael Poon, estudante de doutoramento no Departamento de Astronomia e Astrofísica David A. Dunlap da Faculdade de Artes e Ciências da Universidade de Toronto, um dos dois investigadores desta instituição de ensino ligados à descoberta.

“Veríamos dois sóis no céu a orbitarem-se um ao outro. Além disso, há um disco à volta das estrelas. Imagine os anéis de Saturno, mas muito, muito maiores — com as estrelas no meio”.

Tais discos são referidos como discos protoplanetários porque eventualmente formam famílias de planetas como o nosso Sistema Solar. Os sistemas recentemente descobertos são raros porque os seus discos estão situados num ângulo em relação às órbitas das suas estrelas centrais.

“A descoberta de objetos como estes é importante para a nossa compreensão da formação planetária”, diz J.J. Zanazzi, pós-doutorado do CITA (Canadian Institute for Theoretical Astrophysics) da mesma faculdade.

“Os planetas nascem deles, pelo que a existência de discos em torno de estrelas binárias mostra que é provável que encontremos mais planetas a orbitar binários. Vão também ajudar-nos a compreender se a vida pode existir num planeta que orbita uma estrela binária num ângulo devido à forma como essa orientação afeta a temperatura e outras condições.”

A descoberta dos novos objetos, designados Bernhard-1 e Bernhard–2, foi descrita num artigo publicado dia 4 de julho na revista The Astrophysical Journal Letters.

O autor principal é Wei Zhu da Universidade Tsinghua, em Pequim, antigo pós-doutorado do CITA. Zanazzi e Poon são coautores.

Bernhard-1 e Bernhard–2 estão tão distantes que não conseguimos ver as suas duas estrelas centrais individualmente (tais pares estelares são conhecidos como estrelas binárias). Ao invés, só vemos um único ponto de luz e medimos a luminosidade total do binário.

Os investigadores identificaram os novos objetos analisando as complexas e distintas variações de luminosidade causadas pela sua geometria invulgar.

Um gráfico dessas variações ao longo do tempo é referido como uma curva de luz e as curvas de luz dos novos sistemas correspondem às do primeiro sistema deste tipo jamais descoberto — um objeto referido como Kearns Herbst 15D (KH 15D).

As curvas de luz de Bernhard-1 e Bernhard-2 mergulham para uma fração do seu brilho máximo — a primeira durante 112 dias a cada 192 dias; a segunda durante 20 dias a cada 62 dias. Estas quedas de brilho são o sinal de que uma das estrelas em cada binário se está a mover atrás do disco, tal como visto da Terra. Quando a estrela ressurge, a luminosidade do sistema volta ao normal.

Além disso, quando os coautores compararam observações recentes com dados de arquivo remontando a décadas atrás, descobriram que ambos os objetos variaram em brilho durante períodos muito mais longos.

A análise anterior de KH 15D por Poon, Zhu e Zanazzi, juntamente com o trabalho de outros investigadores, concluiu que este padrão a longo prazo revelava que o disco e as estrelas estavam inclinados um com o outro.

Porque as estrelas binárias e os seus discos protoplanetários condensam a partir da mesma nuvem de material vasta e giratória, o disco encontra-se tipicamente no mesmo plano que as órbitas das estrelas — tal como as órbitas da maioria dos planetas e luas do nosso Sistema Solar se encontram no mesmo plano.

Imagine dois patinadores artísticos, de mãos dadas, rodando um em torno do outro enquanto outros patinadores fazem um círculo à volta do par; todos patinam no mesmo plano da superfície de gelo.

Mas KH 15D, Bernhard-1 e Bernhard-2 são raros na medida em que os seus discos circumbinários estão num ângulo em relação aos planos das estrelas em órbita.

Devido a esta inclinação, os discos oscilam como um pião, um movimento referido como precessão, à medida que se movem entre nós e as estrelas, fazendo com que a luz das estrelas centrais escureça. Para KH 15D, esse ciclo de escurecimento pode demorar entre 60 e 6000 anos.

Os dois tipos de variações de luminosidade combinam-se para criar a assinatura de curva de luz de objetos semelhantes a KH 15D.

A descoberta de Bernhard-1 e Bernhard-2 foi feita quando Klaus Bernhard, astrónomo amador e membro da Associação Federal Alemã para as Estrelas Variáveis, analisou dados do ZTF (Zwicky Transient Facility).

O instrumento do ZTF examina todo o céu do hemisfério norte de dois em dois dias, fornecendo dados para inúmeros objetos ao longo de grandes períodos de tempo.

Combinando os dados, Bernhard descobriu candidatos do tipo KH 15D. Depois partilhou as suas descobertas com Poon, Zanazzi e Zhu, cuja análise posterior revelou Bernhard-1 e Bernhard-2.

Agora que os investigadores encontraram mais dois destes raros objetos celestes, estão otimistas que mais descobertas se seguirão.

“Ainda este mês, o Gaia divulgou os seus dados mais recentes,” diz Zanazzi acerca da missão espacial que tem vindo a observar mil milhões de estrelas na via Láctea desde o seu lançamento em 2013. “E agora que temos este modelo para estes objetos, esperamos poder usá-lo para encontrar mais objetos a acrescentar à lista”.

“Estamos também esperançosos de que mais observadores vão olhar para Bernhard-1 e Bernhard-2 por períodos mais longos”, diz Poon.

“Temos sorte de KH 15D ter sido observado num momento especial em que a sua orientação fazia com que a luz das estrelas centrais escurecesse. Estamos confiantes de que Bernhard-1 e Bernhard-2 também existem nesta orientação favorável, pelo que ter mais observações vai aumentar a nossa compreensão destes objetos raros”.

// CCVAlg

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