Afinal, asteróide que se aproxima da Terra pode ser um foguetão com 50 anos

NASA / JPL-Caltech

O asteroide recentemente descoberto em rota de aproximação à Terra poderá, afinal, ser apenas o que resta de um foguetão lançado há 54 anos numa missão falhada à Lua, segundo peritos da NASA.

“Estou bastante entusiasmado com isto”, afirmou o perito em asteroides da agência espacial norte-americana, Paul Chodas, em declarações à agência Associated Press. “É um hobby que tenho, encontrar um objeto destes e procurar a sua origem, é algo que faço já há décadas”, disse.

Chodas especula que o asteroide 2020 SO, como é formalmente conhecido, possa na verdade ser a parte superior do foguetão Centauro, que em 1966 lançou, com sucesso, o módulo da NASA Surveyor 2 em direção à lua.

O módulo acabou por se despenhar na Lua, devido a uma falha num dos propulsores, e o foguetão, entretanto, passou pela Lua e entrou na órbita do Sol, transformando-se em lixo espacial e nunca mais tendo sido visto – pelo menos até agora.

No mês passado, enquanto procurava asteroides potencialmente perigosos em rota de aproximação à Terra, um telescópio no Havai descobriu um objeto misterioso a aproximar-se da órbita do planeta.

O objeto foi imediatamente introduzido no registo do International Astronomical Union’s Minor Planet Center (Centro de Planetas Menores) relativo a asteroides e cometas encontrados no Sistema Solar e que conta já com perto de um milhão de astros registados.

Com base na sua luminosidade, estima-se que o objeto tem cerca de oito metros, o que coincide com a dimensão do Centauro, que teria menos de 10 metros de comprimento, incluindo a extremidade do motor, e três metros de diâmetro.

O que começou por chamar a atenção de Choda, que é diretor do Centro para o Estudo de Objetos Próximos da Terra do Jet Propulsion Laboratory da NASA, no sul da Califórnia, foi que a órbita quase circular deste objeto em torno do sol é muito similar à da Terra, o que é pouco comum num asteroide.

O facto de o objeto estar no mesmo plano da Terra, e não inclinado para cima ou para baixo, foi outro sinal de alerta, já que os asteroides normalmente surgem em ângulos mais irregulares.

Finalmente, está a aproximar-se da Terra a 2400 quilómetros por hora, o que é uma velocidade reduzida para um asteróide.

À medida que o objeto se aproxima, os astrónomos deverão conseguir traçar melhor a sua órbita e determinar em que medida está a ser impulsionado pela radiação e pelos efeitos térmicos da luz do sol.

Se se tratar do velho foguetão Centauro – que, no fundo, não passa de uma leve lata vazia – irá movimentar-se de forma diferente do que se moveria uma pesada rocha espacial, muito menos suscetível a forças externas.

Segundo Paul Chodas, existem provavelmente dúzias de falsos asteroides registados, mas os seus movimentos são demasiado imprecisos ou complexos para que possa ser confirmada a sua natureza.

Em 1991, por exemplo, um misterioso objeto foi identificado por Chodas e por outros astrónomos como um asteroide e não como um detrito espacial, apesar de a sua órbita em torno do Sol ser semelhante à da Terra.

Em 2002, Chodas encontrou mesmo o que acredita que era uma parte restante do estágio de foguete Saturno V, do módulo Apollo 12, lançado em 1969 e que foi o segundo módulo da NASA a aterrar na lua. O astrónomo admite que as provas eram circunstanciais, devido à órbita errática deste objeto ao longo de um ano em torno da Terra. Acabou por nunca ser classificado como um asteróide e deixou a órbita da Terra em 2003.

A rota do objeto agora detetado é, contudo, muito mais direta e estável, o que vem reforçar a teoria de Chodas.

“Posso estar enganado. Não quero parecer demasiado confiante, mas é a primeira vez, na minha perspetiva, em que tudo parece corresponder a um lançamento efetivamente conhecido”.

E, neste caso específico, Paul Chodas regista com agrado o facto de se tratar de uma missão que ele acompanhou em 1966, quando era, na altura, um adolescente a viver no Canadá.

A “caçadora de asteroides” Carrie Nugent, do Olin College of Engineering, em Needham, no Massachusetts, considera que a conclusão a que chegou Chodas é “válida” e baseada em provas sólidas.

A autora do livro “Asteroid Hunters” (“Caçadores de Asteroides”), lançado em 2017, admite que “a existência de dados adicionais seria útil para se ter mais certezas” e garante que “os caçadores de asteroides de todo o mundo vão continuar a observar este objeto para reunirem mais informações, confessando-se “ansiosa pelos próximos desenvolvimentos”.

Já Jonathan McDowell, do Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, refere que tem havido “inúmeros incidentes embaraçosos com objetos em órbita, que são inicialmente catalogados como asteroides e só depois se percebe que eram objetos artificiais”.

O facto é que raramente são casos óbvios, sem margens para dúvidas.

No ano passado, o astrónomo amador britânico Nick Howes anunciou que um asteroide na órbita solar era, provavelmente, o módulo solar deixado para trás pela Apollo 10, da NASA, um primeiro ensaio da “aterragem” na lua da Apollo 11. Embora admitam que este objeto é provavelmente artificial, Chodas e outros especialistas estão, contudo, céticos quanto a esta conclusão.

Para Howes, este ceticismo é algo de positivo: “Esperamos que leve a mais observações quando voltar a estar mais próximo de nós”, no final da década de 2030, disse.

O objeto que agora está a captar toda a atenção de Paul Chodas passou pela Terra nas respetivas voltas em torno do sol em 1984 e 2002, mas os oito milhões de quilómetros de distância a que então estava tornavam-no demasiado indistinto.

Quanto à possibilidade de este objeto vir a colidir com a Terra, o astrónomo da NASA está muito cético que tal possa acontecer. “Pelo menos não desta vez”, antecipa.

// Lusa

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