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António Costa é aceite por todos ou aceita todos?

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Zoltan Fischer / EPA

António Costa, com o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán

António Costa é um colecionador de consensos. Eleito presidente do Conselho Europeu, é aceite por conservadores, liberais e até pela direita mais radical (com quem se “senta ao lado” e “compreende”).

Marcelo Rebelo de Sousa aplaudiu, esta sexta-feira, a escolha de António Costa para presidir ao Conselho Europeu. O Presidente da República diz que já há muito tempo que o ex-primeiro-ministro “é a solução ideal” para o cargo.

O Chefe de Estado enalteceu ainda o facto de António Costa ser um socialista aceite por todos: “pelos conservadores, pelos liberais e, também, pela direita mais radical”.

“Ao longo dos últimos nove anos, António Costa não só teve magníficas relações com os responsáveis executivos da Comissão, Conselho e do Parlamento Europeu, como conseguiu em muitos casos coser entendimentos entre países que, à partida, tinham posições muito diferentes“, disse Marcelo.

António Costa vai assumir o cargo a partir de 1 de dezembro de 2024, o que significa que vai ter de cooperar com o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, já que a Hungria vai assumir, a partir de segunda-feira e até final de dezembro, a presidência rotativa do Conselho da União Europeia (UE).

Problema para Costa?

A especialista em assuntos europeus  Dharmendra Kanani, porta-voz do centro de análise de políticas europeias Friends of Europe, ouvida este sábado pela Lusa, alerta que Orbán poderá criar polémicas durante a presidência.

“Há um ditado que diz que um leopardo nunca muda as suas pintas”, resume Dharmendra Kanani, acrescentando: “Tendo em conta o historial de Orbán na frente interna e o uso do seu veto em decisões políticas fundamentais da UE, é difícil aceitar garantias de Budapeste”.

Orbán tem protagonizado vários momentos de tensão no seio da UE, ao vetar, por exemplo, apoio financeiro à Ucrânia, e vendo fundos europeus retidos por violações ao Estado de Direito.

Além disso, são conhecidas as afinidades de Orbán com os pouco consensuais Vladimir Putin (presidente russo), Benjamin Netanyahu (líder israelita), e com o candidato republicano norte-americano Donald Trump.

“A preocupação é que o líder húngaro aproveite a liderança do Conselho da UE para fazer uma retórica que não está de acordo com os valores europeus”, continuou o representante do grupo de reflexão.

Mas Costa e Orbán são velhos conhecidos – e, segundo a descrição de Marcelo Rebelo de Sousa, o ex-primeiro-ministro português é especialista em diplomacia.

Costa ao lado dos intervenientes

Há cerca de um ano, António Costa esteve no centro de uma grande polémica por ter feito escala em Budapeste, num avião da Força Aérea, para ver um jogo de futebol ao lado de Viktor Orbán.

Na altura, o antigo primeiro-ministro já era acusado de se servir dos meios do país para ganhar apoio político na Europa. “Parece estar mais preocupado com a campanha europeia, com o seu próximo lugar, do que com gerir Portugal”, disse André Ventura em junho de 2023.

Por seu turno, Marcelo Rebelo de Sousa saiu em defesa de Costa, não tendo visto qualquer “problema político” na escala do primeiro-ministro na Hungria: “Não vejo qualquer compromisso pelo facto de estar sentado ao lado de Orbán”.

E quanto a Meloni? Compreensão total

A primeira-ministra de Itália, Giorgia Meloni, foi a única líder europeia que votou contra o nome de António Costa para presidente do Conselho Europeu, mas o político português diz compreendê-la.

“O Conselho [Europeu] não é propriamente uma agremiação de tecnocratas, mas de políticos, todos têm as suas famílias políticas, orientações e votam também, manifestam-se, de acordo com essas preferências. Compreendo perfeitamente o voto da primeira-ministra de Itália, com quem conto colaborar com enorme proximidade”, disse António Costa, em declarações aos jornalistas portugueses, na sede do Partido Socialista Europeu (PES), em Bruxelas.

“O Governo de Itália, como o Governo dos outros 26 países, resulta do voto e da expressão democrática dos respetivos povos, que nós devemos respeitar. Que isso depois se manifeste de uma forma divergente no Conselho é normal”, completou, descartando que os consensos políticos estejam em causa.

Questionado sobre as declarações do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que disse que António Costa era um “socialista aceite pelos conservadores, pelos liberais e, também, pela direita mais radical”, o presidente eleito considerou que tem de estar acima das famílias políticas.

“Toda a gente sabe qual é a minha família política, estou aqui no Partido Socialista Europeu porque sou socialista, e fui eleito porque sou socialista. Além disso, o presidente do Conselho tem de que se saber colocar acima das famílias políticas para o exercício das suas funções e ter uma noção muito clara e precisa que todos os 27 chefes de Estado e de Governo que se sentam no Conselho têm igual direito e merecem igual respeito”, comentou.

“Uma das grandes qualidades da UE é ser uma união de vários Estados, todos eles de direito democrático, e os respetivos governos são fruto da vontade popular, democraticamente escolhidos. O Conselho tem de respeitar todos”, sustentou.

António Costa será o primeiro português e o primeiro socialista à frente do Conselho Europeu. O antigo primeiro-ministro juntar-se-á a uma lista de quatro portugueses à frente de cargos internacionais de relevo: Freitas do Amaral, o único a presidir à Assembleia-Geral das Nações Unidas, Durão Barroso, ex-presidente da Comissão Europeia, António Vitorino, diretor-geral da Organização Internacional para as Migrações até 2023 e António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas.

Miguel Esteves, ZAP // Lusa

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