No ano passado, cientistas detetaram ondas gravitacionais do que parecia ser a colisão de buracos negros mais massiva alguma vez registada. Agora, uma equipa internacional de astrofísicos propôs uma teoria alternativa.
Uma equipa internacional de investigadores liderada pelo Instituto Galego de Física de Altas Energias e pela Universidade de Aveiro, incluindo um cientista do Departamento de Física da Universidade Chinesa de Hong Kong (CUHK), propôs a colisão de dois objetos compactos exóticos conhecidos por bosões como uma explicação alternativa para a origem do sinal da onda gravitacional GW190521.
As ondas gravitacionais são ondulações na estrutura do espaço-tempo que viajam à velocidade da luz. Previstos na Teoria Geral da Relatividade de Einstein, originam-se nos eventos mais violentos do Universo, levando informações sobre as suas fontes.
Desde 2015, os detetores avançados do Laser Interferometer Gravitational Wave Observatory (LIGO) e de Virgo têm observado cerca de 50 sinais de ondas gravitacionais originados da coalescência e fusão de duas das entidades mais misteriosas do Universo – buracos negros e estrelas de neutrões.
Em setembro de 2020, LVC, o órgão conjunto da Colaboração Científica LIGO e da Colaboração Virgo, anunciou a deteção do sinal de onda gravitacional GW190521. De acordo com a análise, o sinal era consistente com a colisão de dois buracos negros de 66 e 85 vezes a massa do Sol, que produziu um buraco negro final de 142 massas solares. Este último foi o primeiro membro já encontrado de uma nova família de buracos negros de massa intermediária.
De acordo com Tjonnie Li, professor do Departamento de Física da CUHK, esta descoberta foi muito importantes porque estes buracos negros são considerados, há muito tempo, o elo perdido entre os buracos negros de massa estelar que se formam a partir do colapso das estrelas e os buracos negros supermassivos que se escondem no centro de quase cada galáxia.
Apesar da sua importância, a observação de GW190521 representa um enorme desafio para o entendimento atual da evolução estelar, pois um dos buracos negros fundidos tem um tamanho “proibido”.
Assim, a explicação alternativa proposta pela equipa traz uma nova direção para o estudo.
“As estrelas exóticas são objetos quase tão compactos como os buracos negros, mas, pelo contrário, não têm uma superfície sem retorno ou horizonte de eventos. Quando colidem, formam um bosão que se pode tornar instável, eventualmente colapsando num buraco negro e produzindo um sinal consistente com o que LVC observou no ano passado”, explicou Nicolás Sanchis-Gual, investigador de pós-doutoramento no Instituto Superior Técnico da Universidade de Aveiro, em comunicado.
“Ao contrário das estrelas regulares, que são feitas do que normalmente conhecemos como matéria, as estrelas exóticas são feitas de bosões ultraleves. Esses bosões são um dos candidatos mais atraentes para constituir matéria escura, formando cerca de 27% do Universo”, continuou o cientista.
A equipa comparou o sinal GW190521 com simulações de computador de fusões de estrelas exóticas e descobriu que explicam os dados um pouco melhor do que a análise conduzida por LVC. O resultado implica que a fonte teria propriedades diferentes das declaradas anteriormente.
“Em primeiro lugar, já não estaríamos a falar sobre a colisão de buracos negros, o que elimina a questão de lidar com um buraco negro proibido. Em segundo lugar, como as fusões de estrelas exóticas são muito mais fracas, inferimos uma distância muito mais próxima do que a estimada por LVC. Isto leva a uma massa muito maior para o buraco negro final, de cerca de 250 massas solares, por isso o facto de termos testemunhado a formação de um buraco negro de massa intermediária permanece verdadeiro”, explicou Juan Calderón Bustillo, antigo professor do Departamento de Física da CUHK.
Segundo Toni Font, professor da Universidade de Valência, embora a análise tenda a favorecer “por design” a hipótese dos buracos negros de fusão, uma fusão de estrelas exóticas é ligeiramente preferida pelos dados, embora de forma inconclusiva.
Apesar da estrutura computacional das atuais simulações de estrelas exóticas ser ainda bastante limitada e sujeita a grandes melhorias, a equipa pretende desenvolver um modelo mais evoluído e estudar observações de ondas gravitacionais semelhantes sob a suposição de fusão de estrelas exóticas.
Este estudo foi publicado em fevereiro na revista científica Physical Review Letters.