Portugal registou uma subida brusca de interrupções de gravidez em 2022. O aumento do custo de vida é apontado como a principal causa.
Dados provisórios da Direção Geral de Saúde (DGS), a que o Diário de Notícias teve acesso, confirmam um acréscimo no número de abortos realizados em 2022.
Na última década, em Portugal, tinha vindo a verificar-se uma descida no número de interrupções de gravidez (IG). Entre 2018 e 2021, houve uma diminuição de 18,8%.
Dina Oliveira, a chefe de Divisão da Saúde Sexual, Reprodutiva, Infantil e Juvenil da DGS, em declarações ao DN, confirma a reversão dessa tendência, em 2022: “Ainda estamos a trabalhar os dados provisórios, mas pode-se confirmar a existência de um acréscimo“.
Apesar de ter alertado que são apenas dados provisórios, a especialista disse que “o aumento que parece estar a verificar-se em vários países no pós-pandemia pode ser enquadrado com a existência de uma guerra, a inflação, o aumento do custo de vida”.
De resto, não se verificam alterações nos padrões dos últimos anos: “Não se prevê aumento nas adolescentes [em 2020/2021 eram 8% do total], e observa-se a continuação do crescimento da IG nas mulheres estrangeiras” – que em 2020 representavam um quarto das mulheres que recorreram ao aborto.
Teresa Bombas, obstetra do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, confirmou ao DN que houve um aumento de procura dos serviços.
A especialista disse que a falta de condições financeiras é o principal motivo que leva as mulheres a interromperem a gravidez: “Há, nas mulheres que comentam o motivo para abortar, uma relação clara com a causa económica. O número de filhos que a família comporta está subjacente à maioria das decisões”.
“Em termos de idade não notei diferenças. Em Coimbra temos uma população muito jovem, por causa da Universidade, e não houve maior afluência dessa população“, garantiu a obstetra.
Em fevereiro, o Hospital de Santa Maria já tinha informado o DN que, no início de 2023, houve um “aumento exponencial da procura” destes serviços, na sequência de uma “procura muito elevada” em 2022 – onde houve 851 IG para as 630 de 2021.
Abortos disparam na Europa no pós-pandemia
Países como Alemanha e a Noruega, que na última década tinham vindo a registar uma taxa de aborto persistentemente baixa, também verificaram uma subida brusca no número de IG, em 2022.
Em ambos os países, o aborto a pedido da mulher é autorizado até às 12 semanas.
Tal como autoridades de saúde alemãs, as norueguesas ainda não têm uma explicação sustentada: “Não é ainda possível dizer se se trata de uma mudança de tendência ou apenas um resultado temporário da pandemia”, afirma a médica Mette Løkeland-Stai, do Instituto de Saúde Pública do país, citada pelo Diário.
A médica norueguesa disse ainda que foi “recentemente descoberto que há menos mulheres a usar contraceção hormonal“, sendo, por isso, mais um fator a ter em conta.
O Reino Unido foi o país que registou um maior acréscimo neste parâmetro.
De acordo com o DN, nos primeiros seis meses de 2022 verificou-se em Inglaterra-Gales, em relação ao mesmo período de 2021, mais 17% IG – de 105 488 para 123 219.
Na Escócia, em todo o ano, houve um aumento de 19% – de 13 931 para 16 584.
No entanto, ao contrário de Portugal, Alemanha e Noruega, a tendência de IG no Reino Unido tem sido crescente – os números têm vindo a aumentar, há décadas.