Estranha e bizarra. A velocidade do som em Marte está constantemente a mudar

ASA/JPL-Caltech

Um panorama composto de Marte tirado pelo rover Curiosity da NASA em duas alturas diferentes do dia – 8h30 e 16h10, hora local de Marte. Uma nova investigação descobriu que o som se move de forma diferente em diferentes alturas do dia em Marte, bem como em diferentes alturas do ano e em diferentes locais.

Um novo estudo revela que a velocidade do som em Marte varia consideravelmente consoante a localização e a temperatura — uma descoberta que pode ajudar a tornar as viagens ao planeta mais seguras.

Já sabíamos, de acordo com um estudo apresentado em 2022, que a velocidade do som em Marte é diferente — e estranha.

Agora, um novo estudo revela que no Planeta Vermelho a velocidade do som varia consideravelmente consoante a localização e a temperatura.

Os investigadores descobriram detalhes sobre a forma como o som se comporta em vários momentos e locais em Marte, e os resultados são muito diferentes dos que estamos habituados na Terra.

Estas descobertas poderão ajudar os cientistas a compreender os sons captados pelos rovers marcianos, bem como tornar mais seguras as futuras viagens tripuladas ao planeta.

O rover Perseverance da NASA, lançado em 2020 e em Marte desde 2022, transporta vários microfones. Estes dispositivos, destinados a estudar as propriedades dos materiais no Planeta Vermelho, têm captado todo o tipo de sons adicionais, incluindo o estranho ruído dos demónios de poeira marcianos.

As gravações já mostraram que o som se comporta de forma peculiar em Marte. Por exemplo, os ruídos abaixo dos 240 hertz — aproximadamente o dó médio de um piano — viajam cerca de 10 metros por segundo mais lentamente do que os sons mais agudos.

Isto deve-se ao facto de as moléculas de dióxido de carbono, que absorvem alguma da energia do som a baixas frequências, constituírem 95% da atmosfera de Marte.

Estas propriedades bizarras, se não forem tidas em conta, podem comprometer as comunicações em futuras missões a Marte, especialmente as tripuladas.

Com isto em mente, uma equipa de cientistas de instituições francesas e americanas propôs-se estudar a velocidade do som e a sua atenuação — a sua tendência para diminuir com a distância — nos primeiros 20 metros da atmosfera de Marte.

Para começar, explica o Live Science, a equipa de investigadores coligiu valores de diferentes parâmetros, incluindo pressão atmosférica, temperatura e composição química, em vários pontos do Planeta Vermelho, a partir da Mars Climate Database.

As alterações nestes parâmetros podem esticar ou encolher as ondas sonoras, tornando estes fatores essenciais para prever as propriedades do som.

A equipa calculou a velocidade e a atenuação do som em diferentes momentos do ano do planeta (que é cerca de 687 dias terrestres) e em vários pontos da paisagem marciana, incluindo picos de montanhas e vales.

Esta abordagem foi necessária porque os fatores subjacentes variam enormemente no espaço e no tempo. Nas regiões polares, por exemplo, as temperaturas do meio-dia podem variar em 60 graus Celsius e os níveis de dióxido de carbono em 30%, ao longo das estações.

Os cálculos revelaram várias descobertas interessantes, que foram apresentados num estudo publicado a semana passada na revista JGR: Planets.

Por um lado, a poeira não parece afetar a propagação do som, afirmaram os autores num e-mail enviado ao Live Science, à semelhança do que acontece na Terra, onde uma tempestade de poeira entre nós e um aeroporto, por exemplo, não obstruiria a nossa capacidade de ouvir os aviões a descolar.

A alteração da velocidade do som com a temperatura (cerca de 0,5 m/s por cada grau Celsius) é também semelhante à da Terra. No entanto, ao contrário do que acontece no nosso planeta. a velocidade e a atenuação do som dependem muito dos níveis de dióxido de carbono.

Além disso, embora a velocidade do som aumente abruptamente por volta dos 240 hertz, a extensão da mudança é menos pronunciada a temperaturas mais baixas do que a temperaturas mais altas.

A maior diferença em relação à Terra, no entanto, resulta das enormes flutuações diárias de temperatura — e, em menor grau, da concentração de dióxido de carbono.

Na área onde o rover Perseverance se encontra atualmente, por exemplo, os níveis de mercúrio variam cerca de 50 graus Celsius durante o dia. Isto faz com que o som viaje até 30 metros por segundo e se perca três vezes mais depressa nas horas mais quentes do que nas mais frias.

As alterações na temperatura e nos níveis de dióxido de carbono também causam variações na velocidade e atenuação do som ao longo das estações, embora este efeito seja mais pronunciado nas regiões polares.

Os resultados permitem aos cientistas prever a velocidade do som e a atenuação para qualquer local na superfície marciana em qualquer altura do ano e a qualquer hora do dia. O modelo também pode melhorar a compreensão dos cientistas sobre como são os objetos que produzem som em Marte.

Só o ouvimos um som depois de o som se ter propagado através da atmosfera”, explicam os autores. “O nosso modelo pode ajudar a recuperar as características das fontes sonoras originais”.

Além disso, o modelo permite vislumbrar a vida dos futuros residentes humanos em Marte: As manhãs no cimo das montanhas podem ser o mais parecido com a forma como o som se comporta na Terra.

Noutras alturas e noutros locais, como as tardes no local do Perseverance, ocorrerá um efeito de choque, uma vez que os ruídos agudos a curta distância atingem os ouvidos mais rapidamente do que os ruídos mais graves; os ruídos mais distantes, normalmente audíveis na Terra, não serão ouvidos de todo.

ZAP //

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