O asteroide gigante Ryugu tinha água

JAXA Hayabusa 2

O asteroide Ryugu, fotografado pela sonda Hayabusa 2

Grandes quantidades de água terão, em tempos, atravessado o asteroide Ryugu — um indício de que os asteroides poderão ter trazido muito mais água à Terra do que se pensava até agora.

A origem da água terrestre continua envolta em mistério. A hipótese de que asteroides tenham sido uma das suas fontes já foi colocada, mas subsistem dúvidas sobre se terão ocorrido impactos em número suficiente para explicar toda a água que hoje existe no planeta.

As primeiras imagens de Ryugu sugeriam que o asteroide era muito mais seco do que o esperado, mas estudos mais recentes revelaram que o objeto está repleto de fraturas que, em tempos, poderão ter estado preenchidas com ingredientes cruciais para a vida — incluindo água.

Agora, uma nova investigação indica que este corpo celeste com cerca de 800 metros poderá, em determinado momento, ter tido água líquida a circular no seu interior — e, de forma ainda mais surpreendente, muito mais tarde na história do Sistema Solar do que se julgava possível.

As conclusões, apresentadas num novo estudo, publicado na semana passada na revista Nature, reforçam a teoria de que asteroides ricos em água poderão ter sido os responsáveis por trazer as primeiras reservas de H₂O à Terra, há milhares de milhões de anos.

«Isto muda a forma como pensamos sobre o destino a longo prazo da água nos asteroides», afirmou Tsuyoshi Iizuka, autor principal do estudo e professor associado no Departamento de Ciências da Terra e Planetárias da Universidade de Tóquio, num comunicado sobre o trabalho. «A água permaneceu durante muito tempo e não se esgotou tão rapidamente como se pensava».

Quando o Sol era ainda jovem, estava rodeado por um chamado disco protoplanetário, composto por material que viria a dar origem aos planetas. Os restos desse processo formaram os asteroides.

Muitos dos asteroides do tipo C, ou carbonáceos, como Ryugu, formaram-se além ou perto de uma determinada fronteira conhecida como a “linha de gelo”, onde as temperaturas eram suficientemente baixas para que a água se condensasse em minúsculos grãos de gelo.

Até agora, os astrónomos acreditavam que a presença de água líquida só teria sido possível nos momentos mais primordiais do Sistema Solar.

No vácuo do espaço, a água, mesmo protegida no interior de asteroides, deveria evaporar ou congelar com o tempo, já que a ausência de pressão atmosférica reduz drasticamente o seu ponto de ebulição. Pensava-se que a pouca água remanescente estaria presa dentro de minerais, em forma molecular.

Mas os novos dados sugerem que isso pode não ser sempre assim.

A equipa analisou amostras microscópicas de rocha recolhidas do asteroide pela sonda Hayabusa2 da agência espacial japonesa JAXA, entre 2018 e 2019. Em particular, mediram a taxa de decaimento radioativo dos isótopos lutécio-176 e háfnio-176 para estimar a idade de Ryugu — mas os resultados não batiam certo, apesar de este ser, normalmente, um método fiável de datação.

«Obtivemos idades em torno dos 4,8 mil milhões de anos para as amostras de Ryugu, muito superiores à idade do Sistema Solar», explicou Iizuka à New Scientist. «Isto significa que o “relógio” está desregulado nas amostras de Ryugu.»

E o que poderia ter desregulado esse “relógio”? Segundo os investigadores, a presença de um líquido que terá arrastado parte dos isótopos de lutécio.

Isto aponta para a existência de água corrente em Ryugu, ou na rocha original de onde se formou, cerca de mil milhões de anos após a sua formação. Por consequência, isso significa que deve ter existido uma reserva considerável de água gelada que sobreviveu durante todo esse longo período antes de derreter.

A equipa ainda não sabe ao certo o que poderá ter provocado o degelo, já que o calor do Sol não deveria penetrar suficientemente fundo no asteroide. Suspeitam que outro objeto tenha colidido com Ryugu, fragmentando-o e aquecendo-o.

As implicações são, em qualquer caso, impressionantes. Isto deixa em aberto uma janela de pelo menos mil milhões de anos durante a qual blocos rochosos repletos de gelo poderiam ter colidido com a Terra e fornecido água em quantidades substanciais — e não apenas as pequenas quantidades presas nos minerais.

Esta descoberta pode mudar não só a forma como se pensa que a Terra adquiriu os seus oceanos, mas também a forma como se formaram outros mundos.

«A ideia de que objetos como Ryugu conseguiram conservar gelo durante tanto tempo é extraordinária», afirmou Iizuka. «Isto sugere que os blocos de construção da Terra eram muito mais ricos em água do que imaginávamos.»

ZAP //

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