Direção da ACE demite-se, após polémica com António Capelo

A direção da ACE – Escola de Artes, no Porto, demitiu-se esta quinta-feira, após terem vindo a público, na última semana, testemunhos a dar conta de alegados casos de abusos por parte de professores daquela instituição ao longo de vários anos, nomeadamente do ator António Capelo.

O ator António Capelo tem sido acusado, publicamente, nas redes sociais, de ter tido comportamentos inoportunos para com ex-alunos da ACE.

Alguns dos relatos denunciam assédio em plena sala de aula. Há o relatos de um jovem a quem, na primeira aula, o conhecido ator de 69 anos pediu para “fazer uns exercícios de interpretação”: “Deitou-se em cima de mim e perguntou baixinho: ‘Estás a gostar? Estás a sentir o meu peso?’. Tinha 15 anos“.

Mas o ator não seria o único a perpetrar este tipo de alegados comportamentos na escola de artes portuense. Na página de Instagram naotenhasmedo, multiplicam-se, desde a semana passada, as queixas contra a ACE – acusada de saber e compactuar com estes episódios.

Na sequência das queixas, a direção da escola, que leciona cursos profissionais artísticos do 10.º ao 12.º ano e da qual Capelo foi fundador e diretor, demitiu-se, esta quinta-feira.

“A Direção da ACE – Escola de Artes informa que, na sequência das recentes manifestações e do debate gerado em torno da nossa instituição, decidiu apresentar a sua demissão”, lê-se num comunicado partilhado nas páginas oficiais daquela escola nas redes sociais.

A direção da escola refere que tomou a decisão por considerar que “o presente momento exige serenidade, estabilidade e a proteção da missão e dos valores que ACE – Escola de Artes representa”.

Clima de intimidação, abusos e humilhação

Na semana passada começaram a ser divulgadas em páginas nas redes sociais – também pela página +umcasting – testemunhos de alunos e ex-alunos da ACE a darem conta de um clima de intimidação, abusos e humilhação dentro da escola e de abordagens impróprias de professores.

A juntar aos testemunhos partilhados nas redes sociais, surgiu um outro, tornado público pelo Bloco de Esquerda (BE).

Num comunicado divulgado na terça-feira, o partido dá conta que recebeu na semana passada, “por parte de uma pessoa, eleita local do Bloco e antigo aluno do ator António Capelo, o relato presencial de atos muito graves cometidos por este professor de teatro”.

Segundo o BE, este relato, de factos alegadamente ocorridos há mais de dez anos, “é consistente com outros, citados publicamente nos últimos dias”.

“Precisavam de comer”

Contactado pela Lusa, António Capelo, que deu aulas na ACE até 2022, disse estar a ser vítima de uma “cabala”, com acusações falsas, e assegura que vai lutar na justiça pela sua honra e pela verdade.

Rejeito categoricamente qualquer tipo de ação que leve a um ato sexual com alunos. Rejeito categoricamente”, declarou António Capelo à Lusa, assumindo que leu alguns dos depoimentos que vieram a público e dizendo que “alguns são um bocadinho tontos” e muitos não são de alunos seus.

“Há muita gente a falar contra mim que eu não conheço de lado nenhum”, disse.

O ator, de 69 anos, atualmente a trabalhar numa telenovela em exibição na TVI, confessou que nunca se sentiu tão “injustiçado na vida”, reiterando que são falsas as acusações anónimas que estão a ser publicadas nas redes sociais e contou ter apresentado uma queixa-crime no Ministério Público contra “uma página anónima no Instagram gerida por uma ex-aluna da escola ACE de Famalicão”, porque diz ser “absolutamente contra este universo e este mundo que anda a julgar nas redes sociais anonimamente as pessoas”, com coisas “absolutamente indescritíveis”.

António Capelo assumiu à Lusa que, ao longo dos anos, convidou alunos para sua casa para “irem buscar livros” e “jantarem, porque precisavam de comer”. O ator contou também que chegou a convidar alunos para viverem em sua casa, “porque não tinham onde viver”.

“Alojei durante dois meses um aluno que era do Algarve, que teve um acidente no Porto, teve de ser operado a uma perna e ficou em minha casa. Tratei dele como se fosse meu filho e agora sou acusado de levar meninos para casa”, afirmou o ator.

O ator receia agora pela sua continuidade em projetos nos quais está atualmente envolvido. António Capelo contou que na sexta-feira tinha um recital marcado na Igreja de Cedofeita (Porto) e que já foi adiado, por comum acordo das partes.

“Isto é medonho. Medonho. As pessoas que fazem isto nunca pensam no que está daquele lado”, lamenta o ator, criticando o comunicado do BE, que classificou como “execrável” e do qual o partido se devia “envergonhar profundamente”.

0 denúncias contra Capelo

Fonte oficial da ACE Escola de Artes confirmou hoje à Lusa que aquela instituição criou em 6 de janeiro deste ano um Canal de Denúncia, “na sequência de uma reformulação do regulamento interno da escola”, não tendo até hoje recebido nenhuma queixa através dele.

A ACE, fundada em 1990 no Porto, com um polo em Vila Nova de Famalicão, tem 64 trabalhadores efetivos atualmente e afirma-se com “um projeto educativo de referência na formação e criação no domínio das artes do espetáculo”.

Em julho, a ACE anunciou que um professor do polo de Famalicão, sobre o qual surgiram notícias de denúncias de assédio por parte de alunas e ex-alunas, “por decisão da direção, cessou o seu vínculo com a escola em abril de 2025”.

O Observador ouviu alunas de várias escolas de ensino artístico, incluindo a ACE, que relataram “contactos ‘persistentes’ e ‘desconfortáveis’ por parte deste docente, incluindo enquanto eram menores de idade”.

ZAP // Lusa

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