Ainda só foi executado 44% do PRR para a floresta. Governo cortou 122 milhões de apoios públicos

Miguel Pereira da Silva / LUSA

Um bombeiro combate as chamas durante incêndio

O Governo de Montenegro usou as verbas do PRR para justificar o corte feito ao PEPAC em 2024, mas a execução dos fundos europeus está atrasada.

Do total de 577 milhões de euros contratados para as florestas no Plano de Recuperação e Resiliência, apenas 44% foram pagos até 28 de agosto, segundo dados do Portal Mais Transparência analisados pelo Expresso.

Dos 564 milhões de euros aprovados, apenas 250 milhões chegaram ao terreno nos últimos quatro anos. E, embora a aquisição de meios de combate tenha avançado sem dificuldades, medidas estruturais como a transformação da paisagem, as faixas de gestão de combustível e os condomínios de aldeia têm atrasos significativos. A Comissão Nacional de Acompanhamento (CNA) do PRR classificou vários destes projetos como “críticos”, sinalizando que dificilmente serão cumpridos no calendário europeu, o que pode implicar a devolução de verbas.

A transformação da paisagem, eixo central com 261 milhões de euros, tem apenas 22% de execução: 53,7 milhões pagos a 338 projetos. A lentidão resulta da dificuldade em mobilizar proprietários rurais e de atrasos no Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF).

Também a Rede Primária de Faixas de Combustível mostra fortes atrasos: dos 21 mil hectares previstos, apenas 3977 estavam concluídos até abril. A execução financeira rondava os 23%.

Em contraciclo, o Cadastro da Propriedade e o Sistema de Monitorização do Solo estão mais avançados, com 62% de execução. O Balcão Único do Prédio já registou 2,6 milhões de terrenos rústicos (30% da meta) e o levantamento aéreo com tecnologia LIDAR está quase concluído. Ainda assim, vários problemas técnicos e suspensões temporárias de financiamento fragilizaram o processo.

Governo cortou mais de 100 milhões de apoios

Os atrasos na execução do PRR são especialmente preocupantes tendo em conta os cortes que o Governo de Luís Montenegro fez no âmbito da terceira reprogramação do Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC) em outubro de 2024.

Na altura, mais de 20 organizações ambientalistas criticaram a proposta e fizeram as contas, estimando que estava em causa uma redução de 44% na globalidade, com o corte total a rondar os 122 milhões de euros.

A 12 de outubro, quando o documento foi entregue em Bruxelas, a associação ambientalista Zero e o Centro Pinus emitiram um comunicado conjunto onde descreviam a decisão do Governo como “completamente incompreensível e inaceitável”.

“Todos os especialistas têm alertado para a necessidade de aumentar a gestão florestal e a Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF) também salientou, no último relatório anual, que a intervenção no território não acontece ainda à escala espacial suficiente e apelou ao aumento dessa escala“, referiu o comunicado, citado pelo Público.

Este corte foi recentemente discutido no Parlamento, na sequência dos grandes incêndios que assolaram o país nos últimos meses, pela voz de Paulo Raimundo, que estima que o valor cortado seja de 114 milhões de euros.

“O país, como disse, não precisa de pactos como aquele pacto que cortou só no ano passado 114 milhões de euros de apoio à floresta, ora aí estão agora as lágrimas de crocodilo. O ano passado cortaram 114 milhões de euros de apoios à floresta e agora choram lágrimas de crocodilo porque a floresta está a arder. Obrigadinho, mas nós assim não vamos lá”, afirmou o líder do PCP no debate parlamentar.

A afirmação de Raimundo foi analisada pelo Polígrafo, que confirmou a sua veracidade. Na sua justificação para os cortes dada em outubro, o executivo da AD não contrariou a estimativa de 122 milhões de euros dos grupos ambientalistas e referiu que estavam a ser feitos investimentos na floresta com outras verbas, nomeadamente as vindas do PRR: “No caso das intervenções florestais, é de destacar no PRR a medida C08-Florestas, que tem financiamentos com elevado volume disponíveis para o futuro próximo, com intersecções com o PEPAC.”

A associação ZERO refutou a razão dada pelo Governo, lembrando que “os diferentes instrumentos de financiamento foram concebidos para serem complementares“. “O PRR apoiará o investimento em cerca de 140 mil hectares, que representam apenas 5% dos 3,3 milhões de hectares classificados como territórios vulneráveis aos incêndios. O PEPAC, e outros instrumentos, como o Fundo Ambiental são, assim, indispensáveis para chegar a estes e a outros territórios”, criticou.

Adriana Peixoto, ZAP //

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