Rudolf Hima

Impressão artística de uma pequena cria de Pterodactylus a lutar contra uma violenta tempestade tropical, inspirada nas descobertas de fósseis.
Dois fósseis encontrados na Alemanha de pterodáctilos muito jovens mostram os ossos das asas, provavelmente fraturados em pleno voo, devido a violentos ciclones tropicais.
Ao que tudo indica, os pterodáctilos bebés eram capazes de voar poucos dias depois de eclodirem, mas alguns deles acabavam por partir as asas em tempestades violentas, que os lançavam contra lagoas onde se afogavam.
Mesmo em idades muito precoces, estes répteis alados possuíam estruturas de asa semelhantes às dos adultos, com a potência e as características aerodinâmicas necessárias para o voo.
Ainda assim, os paleontólogos têm debatido durante décadas se estas crias conseguiam realmente voar, nota a New Scientist.
Esta dúvida acaba de ser desfeita.
Há cerca de 150 milhões de anos, uma tempestade tropical destrutiva atravessou a região que hoje corresponde ao sul da Alemanha e pôs um fim trágico à vida de dois pterossauros bebés (Pterodactylus).
O mau tempo criou as condições ideais de preservação, que permitiram que os paleontólogos pudessem estudar o par excecional de fósseis dos dois bebés.
Os resultados do estudo, que foram apresentados num artigo publicado esta sexta-feira na revista Current Biology, podem ajudar a reescrever a compreensão dos ecossistemas europeus da época e dos animais que os habitavam.
A era Mesozóica é frequentemente associada a dinossauros gigantes, como o Tyrannosaurus rex ou o Ankylosaurus, mas a paisagem era partilhada por fauna de todas as dimensões.
Como a fossilização tende a favorecer criaturas maiores e mais robustas, é muitas vezes difícil estudar as espécies mais pequenas, frágeis e de ossos finos desse período.
Este não é, no entanto, o caso dos calcários de Solnhofen, no sul da Alemanha. Antigamente coberta por lagoas, a região proporcionou um repouso ideal para dinossauros mesozóicos de menor porte, incluindo pterossauros, explica a Popular Science.
Mas o local tem intrigado os paleontólogos: ao longo das décadas, foram encontrados centenas de fósseis de pterossauros jovens, enquanto os restos de adultos são muito mais raros.
Quando surgem exemplares mais maduros, tratam-se quase sempre de fragmentos de crânios ou membros, contrariando a tendência observada noutras jazidas para a preservação de fósseis maiores.
“Os pterossauros tinham esqueletos incrivelmente leves. Ossos ocos e de paredes finas são ideais para o voo, mas péssimos para a fossilização”, explica Rab Smyth, paleobiólogo da Universidade de Leicester e coautor do estudo, em comunicado publicado no EurekAlert.
“As hipóteses de preservar um já são reduzidas, e encontrar um fóssil que nos diga como o animal morreu é ainda mais raro”, nota o investigador.
Um golpe de sorte
Ainda assim, seria de esperar que os paleontólogos tivessem encontrado mais exemplares adultos completos. Mas duas descobertas recentes permitiram a Smyth e à sua equipa juntar mais peças do enigma.
A cerca de 80 quilómetros a sul de Nuremberga, foram desenterrados dois pterossauros bebés completos, articulados e excecionalmente preservados. A equipa apelidou-os, de forma irónica, de Lucky I e Lucky II — embora Smyth não os tenha identificado ao mesmo tempo.
“Quando o Rab encontrou o Lucky ficámos entusiasmados, mas pensámos tratar-se de um caso isolado. Seria de facto representativo?”, recorda David Unwin, coautor do estudo.
“Um ano depois, quando o Rab descobriu o Lucky II, percebemos que já não era coincidência, mas uma evidência de como estes animais estavam a morrer”, acrescenta.
Uma análise mais detalhada dos dois fósseis revelou que ambos tinham envergaduras inferiores a 20 centímetros, o que indica que tinham apenas alguns dias ou semanas de vida — sendo dos mais pequenos pterossauros alguma vez escavados.
Curiosamente, os dois apresentavam a mesma lesão: uma fratura limpa no úmero. No caso do Lucky I, no osso da asa esquerda; no Lucky II, no direito.
Morte e descoberta
Smyth e Unwin acreditam que a causa é clara: rajadas violentas de vento durante uma tempestade tropical terão torcido os membros destes animais, em vez de resultar de uma colisão com uma superfície dura.
As fraturas fatais lançaram-nos em espiral contra a lagoa, onde se afogaram rapidamente antes de ficarem soterrados em sedimentos calcários finos. Essas mesmas condições turbulentas permitiram a preservação quase perfeita dos fósseis, que permaneceram intactos durante 150 milhões de anos.
Os autores do estudo defendem que Lucky I e II não são casos raros. Pelo contrário, tempestades semelhantes poderão explicar a abundância de fósseis de pterossauros jovens em Solnhofen, enquanto os adultos tinham mais resistência para enfrentar ventos e chuvas intensas.
Quando morriam, era mais provável que os seus corpos flutuassem durante dias ou semanas nas águas calmas da lagoa, acabando por se depositar apenas partes dispersas das carcaças em decomposição.
“Durante séculos, acreditou-se que os ecossistemas das lagoas de Solnhofen eram dominados por pequenos pterossauros. Mas sabemos hoje que essa visão está profundamente enviesada”, afirmou Smyth.
“Muitos destes pterossauros nem eram nativos da lagoa. A maioria eram juvenis inexperientes que viviam em ilhas próximas e que, infelizmente, foram apanhados por tempestades poderosas.”
A natureza nunca foi indulgente — mas, pelo menos, a morte de Lucky I e Lucky II deixou aos investigadores registos valiosos, descobertos milhões de anos mais tarde.