O roubo de telemóveis continua imparável. Os criminosos exploram lacunas nas funcionalidades de segurança, enquantoe os fabricantes optam usabilidade em detrimento da proteção. Para quem vende telemóveis novos, o roubo de telemóveis não é mau negócio.
O roubo de smartphones atingiu proporções epidémicas nas principais cidades do mundo. No ano passado, conta a New Scientist, só em Londres foram registados 80.000 roubos de dispositivos.
Apesar de existir tecnologia que poderia virtualmente eliminar o problema, uma conjugação de três fatores continua a alimentar esta lucrativa onda de crimes: uma complexa rede de empresas criminosas, as prioridades dos fabricantes e lacunas regulamentares.
Nos últimos anos, o roubo de smartphones evoluiu muito para além do simples crime de rua, sendo agora fruto de operações criminosas sofisticadas.
Quando os dispositivos são roubados, entram no que a polícia descreve como uma “correia transportadora de crime” com múltiplas fontes de lucro.
A rota mais simples envolve revender telemóveis internacionalmente, frequentemente através de redes criminosas que contrabandeiam telefones para o estrangeiro em carregamentos em massa semelhantes ao tráfico de droga.
Esquemas mais sofisticados envolvem remover cartões SIM para intercetar mensagens de texto e contornar sistemas de autenticação de dois fatores, dando aos criminosos acesso às contas de email e serviços online das vítimas.
Os alvos mais valiosos são telefones desbloqueados, onde os ladrões podem aceder a aplicações bancárias, carteiras de criptomoedas e contas de redes sociais para conduzir burlas elaboradas direcionadas aos contactos da vítima.
A Polícia de Londres relata ter descoberto “caixas e caixas de telefones” a serem exportados através de redes de contrabando criminosas. Estas operações têm alcance internacional, e os dispositivos roubados acabam frequentemente em países onde não foram reportados como roubados, o que permite que funcionem normalmente nas redes locais.
O custo humano estende-se além das perdas financeiras. Um utilizador cujo telemóvel foi roubado segundos após sair de uma estação de metro, descreve a experiência como “traumatizante”. Além de perder 300 € em compras fraudulentas, perdeu fotografias insubstituíveis dos seus filhos que não estavam guardadas no armazenamento na nuvem.
A Polícia admitiu que não havia “qualquer hipótese” de recuperação, apesar de múltiplos roubos terem ocorrido no mesmo local no espaço de uma hora.
Especialistas em tecnologia argumentam que as soluções já existem, mas não estão a ser totalmente implementadas.
Cada smartphone transporta um identificador IMEI único que pode ser usado para bloquear dispositivos das redes celulares, um sistema já a operar em inúmeros países, incluindo o Reino Unido, Canadá, Estados Unidos, e Portugal. No entanto, os telefones bloqueados ainda podem aceder à internet através de ligações Wi-Fi, mantendo muito da sua funcionalidade e valor criminal.
As autoridades policiais há muito que defendem que as empresas tecnológicas expandam as capacidades de bloqueio para serviços na nuvem, o que reduziria significativamente a utilidade dos telefones roubados. Mas grandes fabricantes, incluindo a Apple e a Google, recusaram implementar estas medidas, apesar de terem a capacidade técnica para o fazer.
Mesmo as funcionalidades de segurança existentes falham frequentemente em fornecer proteção adequada.
Muitos telefones incluem sistemas de deteção de movimento que bloqueiam automaticamente dispositivos quando é detetado um movimento súbito que seja semelhante ao do cenário de um roubo.
No entanto, estas funcionalidades estão normalmente desativadas por omissão, para dar prioridade à conveniência do utilizador em detrimento da segurança.
O antigo especialista em forense digital da polícia Jordan Hare acredita que os fabricantes escolhem deliberadamente configurações predefinidas que favorecem a experiência de utilização em detrimento da segurança. “As empresas parecem relutantes em adicionar atrito à experiência do utilizador”, diz Hare.
As capacidades de rastreamento em que muitos utilizadores confiam para poder recuperar os seus aparelhos são na prática largamente ineficazes. Quando os telefones roubados são rastreados em grandes edifícios de apartamentos ou áreas urbanas densas, a polícia não tem de autoridade legal para conduzir buscas sem mandados específicos, tornando a recuperação virtualmente impossível.
James O’Sullivan, criador da aplicação Nuke, que ajuda vítimas de roubo, sugere que os fabricantes não têm incentivo para resolver o problema — pelo contrário. “Telefones roubados são um bom negócio para pessoas que vendem telefones novos”, nota, destacando um potencial conflito de interesses.
O governo britânico reconheceu a gravidade da crise, e prometeu pressionar os fabricantes a desativar permanentemente dispositivos roubados. No entanto, sem coordenação internacional, os criminosos podem simplesmente exportar telefones para países com sistemas de bloqueio menos rigorosos.
A Apple, o único grande fabricante que respondeu a um pedido de comentário da New Scientist, diz ter investido significativamente em medidas anti-roubo na última década. No entanto, a empresa recusou explicar por que muitas funcionalidades de segurança permanecem opcionais em vez de configurações predefinidas.
Enquanto os fabricantes não derem prioridade à segurança em detrimento da conveniência do utilizador, e os governos continuarem sem coordenar respostas internacionais, a epidemia provavelmente continuará a crescer.
“só em Londres foram registados 80.000 roubos de dispositivos” a epidemia é resultado de más políticas… por aqueles lados parece que é comum entrar-se numa loja, encher a mochila e sair sem pagar e com os seguranças a ver… porque será?
“O governo britânico reconheceu a gravidade da crise, e prometeu pressionar os fabricantes” a culpa é sempre dos outros… “A Polícia admitiu que não havia “qualquer hipótese” de recuperação, apesar de múltiplos roubos terem ocorrido no mesmo local no espaço de uma hora.” esses fabricantes malvados, não querem ajudar…