Descoberta espécie invertebrada que usa as estrelas para navegar nas suas épicas migrações

Lucinda Gibson & Ken Walker, Museum Victoria / Wikipedia

Exemplar de traça Bogong (Agrotis infusa) fêmea

As traças Bogong fazem migrações de centenas de quilómetros todos os anos — usando o céu noturno austral como bússola.

Todas as primaveras, milhares de milhões de traças Bogong (Agrotis infusa) migram centenas de quilómetros para sul até aos Alpes Australianos, guiadas pelo céu noturno austral.

A descoberta de que conseguem encontrar o seu caminho usando apenas as estrelas, relatada num artigo publicado na semana passada na revista Nature, torna esta traça o primeiro invertebrado a ser observado usando navegação celestial para viagens de longa distância.

“A primeira vez que as vimos voar sob o céu noturno sem qualquer outra pista e voar na direção certa tivemos de nos agarrar à beira da mesa”, explica o co-autor do estudo Eric Warrant, entomólogo da Universidade de Lund na Suécia.

As traças Bogong emergem dos seus casulos no sudeste da Austrália e algumas regiões da Nova Zelândia e iniciam um longo voo até grutas montanhosas que nunca visitaram anteriormente.

No outono seguinte, estas traças fazem o voo de regresso para se reproduzirem e morrerem. “Como é que sabem encontrar o caminho até lá?” pergunta Warrant.

Warrant e a sua equipa suspeitavam que estas traças se orientavam durante o voo olhando para as estrelas, uma capacidade anteriormente identificada apenas em humanos, aves e possivelmente focas.

Para testar esta teoria, capturaram traças selvagens e colocaram-nas num ‘simulador de voo’ — uma caixa cilíndrica transparente na qual os insetos foram amarrados e os seus movimentos registados enquanto lhes eram mostradas projeções do céu estrelado.

Os investigadores manipularam o campo magnético no simulador para observar se as traças conseguiam navegar sem esta pista. Também registaram a atividade dos neurónios visuais nos cérebros das traças para investigar se têm uma representação interna do céu estrelado.

Quando as traças não tinham acesso à projeção do céu ou ao campo electromagnético, eram completamente incapazes de navegar.

Mas com acesso apenas à pista visual das estrelas, conseguiam navegar na direcção sazonalmente apropriada. Também conseguiam voar na direção correta na presença de um campo electromagnético, mas sem estrelas visíveis.

Ter estas duas ‘bússolas’ internas funcionais permite às traças navegar em condições adversas, como céus nublados noturnos que obscurecem as estrelas, ou durante tempestades magnéticas, dizem os investigadores.

A equipa também identificou os neurónios visuais dentro do cérebro da traça que respondem a características do céu, incluindo a forma da Via Láctea.

O que foi emocionante para mim foi que estes são neurónios que não tínhamos visto antes”, diz Andrea Adden, investigadora de neurociência no Instituto Francis Crick, em Londres, e co-autora do estudo.

“É surpreendente que um inseto com um cérebro menor que um grão de arroz seja capaz de fazer isto”, diz Basil el Jundi, biólogo da Universidade de Oldenburg, Alemanha, que não esteve envolvido no estudo.

Uma via para investigação futura será ver como as traças Bogong podem integrar pistas visuais e electromagnéticas em conjunto. “Mesmo um sistema nervoso muito pequeno é capaz de coisas espantosas“, diz Warren.

ZAP //

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