Ken Cedeno / EPA

O presidente de El Salvador e autoproclamado “ditador mais cool do mundo”, visitou esta segunda-feira o Presidente Trump na Casa Branca . Foi o primeiro líder latino-americano a receber um convite oficial para o Gabinete Oval desde que Trump tomou posse.
O auto-proclamado “ditador mais cool do mundo, Nayib Bukele, é um dos aliados regionais mais cruciais de Trump — e ninguém abraçou as suas políticas anti-imigração com tanto entusiasmo como o presidente salvadorenho.
Com o apoio de Bukele, nas últimas semanas a administração Trump prendeu e deportou para El Salvador centenas de alegados membros de gangues venezuelanos e salvadorenhos.
No mês passado, o voo inaugural de deportação para El Salvador e a transferência para a famosa mega-prisão do país foram cuidadosamente coreografados e filmados num vídeo que Bukele partilhou nas redes sociais.
Today, the first 238 members of the Venezuelan criminal organization, Tren de Aragua, arrived in our country. They were immediately transferred to CECOT, the Terrorism Confinement Center, for a period of one year (renewable).
The United States will pay a very low fee for them,… pic.twitter.com/tfsi8cgpD6
— Nayib Bukele (@nayibbukele) March 16, 2025
Desde então, foram realizados mais voos de deportação — o último dos quais no domingo — apesar de continuarem a ser levantadas questões sobre a falta de transparência, a legalidade do processo e negações de muitos dos detidos de que tenham quaisquer ligações a gangues.
Então, o que sabemos sobre Bukele e porque é que ele é tão bem acolhido pela administração Trump e foi convidado para a Casa Branca?
A ascensão da doutrina Bukele
Bukele foi eleito presidente pela primeira vez em 2019 após uma campanha focada no combate à corrupção. Em 2022, declarou estado de emergência para combater o crime de gangues e as elevadas taxas de homicídio.
Sob esta lei, que permanece em vigor, Bukele prendeu cerca de 85.000 pessoas. Segundo a Human Rights Watch, apenas 1.000 dos detidos foram condenados por crimes, e haverá muitas pessoas inocentes alegadamente encarceradas.
“Sob Bukele, El Salvador tornou-se a mais recente autocracia nas Américas“, afirmou Noah Bullock, diretor executivo da Cristosal, uma ONG salvadorenha de direitos humanos.
Apesar de amplamente condenado por abusos de direitos humanos, muitos — incluindo Donald Trump — admiram Bukele por ter conseguido, num país que durante anos teve uma das taxas de homicídio mais altas do mundo, reduzir o número de homicídios de mais de 2.000 em 2019 para apenas 114 no ano passado.
Na semana passada, o Departamento de Estado dos EUA elevou a classificação de segurança de viagem de El Salvador para o muito cobiçado Nível 1 numa escala com quatro níveis de segurança — Use precauções normais / Tenha cuidados acrescidos / Reconsidere a sua viagem / Não viaje.
“A atividade de gangues diminuiu nos últimos três anos”, nota o aviso sobre El Salvador. O gesto não passou despercebido a Bukele, que repetidamente partilhou a notícia no Twitter.
Apenas um pequeno punhado de países latino-americanos tem Nível 1 na nesta lista, na qual Portugal recebe também o Nível 1, e está acima da classificação de viagem de Nível 2 recomendada para países como o Reino Unido, Suécia e França.
“Políticos por toda a América que procuram soluções rápidas para a violência proveniente do crime organizado estão a tentar usar o discurso de Bukele“, diz Juanita Goebertus Estrada, diretora da Divisão das Américas na HRW.
Tudo isto ajudou a reforçar a sua popularidade em casa. O presidente desfruta de até 80% de aprovação e venceu a sua reeleição em 2024 por uma grande margem. Embora Bullock note que muitos têm medo de se opor publicamente a ele.
Uma aliança MAGA
Entre os muitos fãs regionais de Bukele estão os republicanos MAGA. Em junho de 2024, Donald Trump Jr. assistiu à tomada de posse do segundo mandato de Bukele, e os fiéis do MAGA aplaudiram-no quando falou na Conferência de Ação Política Conservadora em Washington em fevereiro do ano passado.
A administração Trump também tem laços diplomáticos próximos com El Salvador. Tanto o Secretário de Estado Marco Rubio como a Secretária de Segurança Interna Kristi Noem visitaram o país nas suas primeiras viagens ao estrangeiro.
“El Salvador é o único país, pelo menos na América Central, que demonstrou 100% de disposição para fazer tudo o que os Estados Unidos exigiram“, disse Ana María Méndez Dardón, diretora para a América Central no Gabinete de Washington para a América Latina.
Esta disposição estendeu-se mais notoriamente ao envio de migrantes venezuelanos e salvadorenhos, acusados de afiliação a gangues, para a infame mega-prisão de Bukele, o Centro de Confinamento de Terrorismo, ou CECOT.
As deportações têm sido amplamente condenadas e continuam a ser fortemente escrutinadas nos tribunais dos EUA. A HRW chama-as de “desaparecimentos forçados” para um centro “conhecido pelas suas condições abusivas” — também chamado de Gulag tropical.
Ken Cedeno / EPA

Nayib Bukele com Donald Trump na Casa Branca
O que estava em jogo?
Na reunião desta segunda-feira, espera-se que os dois líderes discutam uma maior cooperação em matéria de migração, tarifas e a potencial detenção em El Salvador de criminosos americanos “perigosos”.
“Seriam criminosos violentos hediondos que violaram repetidamente as leis da nossa nação, e são criminosos reincidentes violentos nas ruas americanas”, disse Karoline Leavitt, secretária de imprensa de Trump, que esclareceu também que a viabilidade e legalidade da política ainda estão por determinar.
A estratégia de Donald Trump de deportação de migantes para El Salvador recebeu uma resposta mista do Supremo Tribunal, que a 7 de abril permitiu mais deportações ao abrigo da lei de 1798, mas determinou que os deportados devem ter direito a um processo judicial.
O tribunal também ordenou à administração que “facilitasse” a libertação de Kilmar Armando Abrego Garcia, um pai de três filhos erradamente deportado para El Salvador — apesar de ter recebido proteção de um juiz, que considerou que poderia enfrentar violência de gangues na prisão salvadorenha.
No domingo, o Departamento de Justiça norte-americano disse que os tribunais não tinham “autoridade” para forçar El Salvador a libertar Abrego Garcia. Isso cabe ao presidente, “como único órgão do governo federal no campo das relações internacionais”.
Restava saber o que iria fazer o ditador mais cool do mundo.
“A pergunta é absurda. Como é que posso contrabandear um terrorista para os Estados Unidos?”, disse Bukele aos jornalistas, sentado ao lado de Trump, na Sala Oval da Casa Branca. “Não tenho o poder de o devolver aos Estados Unidos”.