O ditador mais fixe do mundo foi à Casa Branca

Ken Cedeno / EPA

O presidente de El Salvador e autoproclamado “ditador mais cool do mundo”, visitou esta segunda-feira o Presidente Trump na Casa Branca . Foi o primeiro líder latino-americano a receber um convite oficial para o Gabinete Oval desde que Trump tomou posse.

O auto-proclamado “ditador mais cool do mundo, Nayib Bukele, é um dos aliados regionais mais cruciais de Trump — e ninguém abraçou as suas políticas anti-imigração com tanto entusiasmo como o presidente salvadorenho.

Com o apoio de Bukele, nas últimas semanas a administração Trump prendeu e deportou para El Salvador centenas de alegados membros de gangues venezuelanos e salvadorenhos.

No mês passado, o voo inaugural de deportação para El Salvador e a transferência para a famosa mega-prisão do país foram cuidadosamente coreografados e filmados num vídeo que Bukele partilhou nas redes sociais.

Desde então, foram realizados mais voos de deportação — o último dos quais no domingo — apesar de continuarem a ser levantadas questões sobre a falta de transparência, a legalidade do processo e  negações de muitos dos detidos de que tenham quaisquer ligações a gangues.

Então, o que sabemos sobre Bukele e porque é que ele é tão bem acolhido pela administração Trump e foi convidado para a Casa Branca?

A ascensão da doutrina Bukele

Bukele foi eleito presidente pela primeira vez em 2019 após uma campanha focada no combate à corrupção. Em 2022, declarou estado de emergência para combater o crime de gangues e as elevadas taxas de homicídio.

Sob esta lei, que permanece em vigor, Bukele prendeu cerca de 85.000 pessoas. Segundo a Human Rights Watch, apenas 1.000 dos detidos foram condenados por crimes, e haverá muitas pessoas inocentes alegadamente encarceradas.

“Sob Bukele, El Salvador tornou-se a mais recente autocracia nas Américas“, afirmou Noah Bullock, diretor executivo da Cristosal, uma ONG salvadorenha de direitos humanos.

Apesar de amplamente condenado por abusos de direitos humanos, muitos  — incluindo Donald Trump — admiram Bukele por ter conseguido, num país que durante anos teve uma das taxas de homicídio mais altas do mundo, reduzir o número de homicídios de mais de 2.000 em 2019 para apenas 114 no ano passado.

Na semana passada, o Departamento de Estado dos EUA elevou a classificação de segurança de viagem de El Salvador para o muito cobiçado Nível 1 numa escala com quatro níveis de segurança — Use precauções normais / Tenha cuidados acrescidos / Reconsidere a sua viagem / Não viaje.

“A atividade de gangues diminuiu nos últimos três anos”, nota o aviso sobre El Salvador. O gesto não passou despercebido a Bukele, que repetidamente partilhou a notícia no Twitter.

Apenas um pequeno punhado de países latino-americanos tem Nível 1 na nesta lista, na qual Portugal recebe também o Nível 1,  e está acima da classificação de viagem de Nível 2 recomendada para países como o Reino Unido, Suécia e França.

Políticos por toda a América que procuram soluções rápidas para a violência proveniente do crime organizado estão a tentar usar o discurso de Bukele“, diz Juanita Goebertus Estrada, diretora da Divisão das Américas na HRW.

Tudo isto ajudou a reforçar a sua popularidade em casa. O presidente desfruta de até 80% de aprovação e venceu a sua reeleição em 2024 por uma grande margem. Embora Bullock note que muitos têm medo de se opor publicamente a ele.

Uma aliança MAGA

Entre os muitos fãs regionais de Bukele estão os republicanos MAGA. Em junho de 2024, Donald Trump Jr. assistiu à tomada de posse do segundo mandato de Bukele, e os fiéis do MAGA aplaudiram-no quando  falou na Conferência de Ação Política Conservadora em Washington em fevereiro do ano passado.

A administração Trump também tem laços diplomáticos próximos com El Salvador. Tanto o Secretário de Estado Marco Rubio como a Secretária de Segurança Interna Kristi Noem visitaram o país nas suas primeiras viagens ao estrangeiro.

El Salvador é o único país, pelo menos na América Central, que demonstrou 100% de disposição para fazer tudo o que os Estados Unidos exigiram“, disse Ana María Méndez Dardón, diretora para a América Central no Gabinete de Washington para a América Latina.

Esta disposição estendeu-se mais notoriamente ao envio de migrantes venezuelanos e salvadorenhos, acusados de afiliação a gangues, para a infame mega-prisão de Bukele, o Centro de Confinamento de Terrorismo, ou CECOT.

As deportações têm sido amplamente condenadas e continuam a ser fortemente escrutinadas nos tribunais dos EUA. A HRW chama-as de “desaparecimentos forçados” para um centro “conhecido pelas suas condições abusivas” — também chamado de Gulag tropical.

Ken Cedeno / EPA

Nayib Bukele com Donald Trump na Casa Branca

O que estava em jogo?

Na reunião desta segunda-feira, espera-se que os dois líderes discutam uma maior cooperação em matéria de migração, tarifas e a potencial detenção em El Salvador de criminosos americanos “perigosos”.

“Seriam criminosos violentos hediondos que violaram repetidamente as leis da nossa nação, e são criminosos reincidentes violentos nas ruas americanas”, disse Karoline Leavitt, secretária de imprensa de Trump, que esclareceu também que a viabilidade e legalidade da política ainda estão por determinar.

A estratégia de Donald Trump de deportação de migantes para El Salvador recebeu uma resposta mista do Supremo Tribunal, que a 7 de abril permitiu mais deportações ao abrigo da lei de 1798, mas determinou que os deportados devem ter direito a um processo judicial.

O tribunal também ordenou à administração que “facilitasse” a libertação de Kilmar Armando Abrego Garcia, um pai de três filhos erradamente deportado para El Salvador — apesar de ter recebido proteção de um juiz, que considerou que poderia enfrentar violência de gangues na prisão salvadorenha.

No domingo, o Departamento de Justiça norte-americano disse que os tribunais não tinham “autoridade” para forçar El Salvador a libertar Abrego Garcia. Isso cabe ao presidente, “como único órgão do governo federal no campo das relações internacionais”.

Restava  saber o que iria fazer o ditador mais cool do mundo.

A pergunta é absurda. Como é que posso contrabandear um terrorista para os Estados Unidos?”, disse Bukele aos jornalistas, sentado ao lado de Trump, na Sala Oval da Casa Branca. “Não tenho o poder de o devolver aos Estados Unidos”.

ZAP //

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