Não é só impressão sua: os humanos estão mesmo a ficar mais burros

Apesar de não haver alterações biológicas no nosso cérebro, o desempenho nos testes cognitivos tem caído nas últimas décadas, numa tendência verificada em vários países.

Numa era em que a informação digital está constantemente na ponta dos nossos dedos, está a surgir uma tendência preocupante na capacidade intelectual humana.

Embora a biologia do cérebro humano se tenha mantido praticamente inalterada nas últimas décadas, os dados sugerem que a nossa capacidade de raciocinar, resolver problemas e manter a concentração está a diminuir.

Dados recentes do teste internacional de avaliação comparativa da OCDE, o PISA, que avalia o desempenho de jovens de 15 anos em disciplinas como a leitura, a matemática e as ciências, revelam que o desempenho dos alunos atingiu o seu pico por volta de 2012 e tem vindo a diminuir constantemente desde então.

Curiosamente, a descida dos resultados observada durante a pandemia parece fazer parte de uma tendência mais ampla e de longo prazo. Entre 2012 e 2018, o declínio nas classificações dos testes foi mais significativo do que a queda causada pelas perturbações relacionadas com a pandemia. Esta tendência descendente não se limita aos adolescentes, com os adultos de várias faixas etárias a terem um declínio semelhante nas suas capacidades de raciocínio e de resolução de problemas.

O estudo “Monitoring the Future”, que acompanha o bem-estar mental dos jovens de 18 anos desde a década de 1980, também mostra um aumento notável do número de estudantes que confessam dificuldades em pensar, concentrar-se ou aprender novas informações.

Embora este número tenha permanecido estável ao longo das décadas de 1990 e 2000, começou a aumentar acentuadamente em meados da década de 2010, coincidindo com uma mudança mais ampla na forma como lidamos com a informação, explica o Financial Times.

O cerne desta questão poderá estar na transformação da forma como consumimos conteúdos. À medida que a sociedade passa dos tradicionais meios de comunicação baseados em texto para formatos visuais, estamos cada vez mais imersos num mundo “pós-literário” e dominado por ecrãs. Esta mudança resultou num declínio notável da leitura.

Mas o problema não se limita à leitura. A investigação mostra que as pessoas também se debatem com a numeracia e a resolução de problemas, com muitos adultos incapazes de aplicar o raciocínio matemático básico.

A causa principal destes declínios está provavelmente ligada à mudança da nossa relação com a informação. No passado, interagíamos com livros na busca de informação. Atualmente, somos constantemente bombardeados com notificações e podemos obter respostas rapidamente sem ter de racicionar. Afinal, para que é que vamos procurar algo num livro quando podemos perguntar ao ChatGPT? E porque é que vamos fazer uma conta quando temos uma calculadora no telemóvel?

Embora a capacidade intelectual do cérebro humano permaneça intacta, a forma como executamos esse potencial tem sido cada vez mais comprometida. O desafio que se coloca no futuro será encontrar formas de atenuar os efeitos prejudiciais do constante estímulo digital e restaurar a nossa capacidade de concentração e pensamento crítico.

Adriana Peixoto, ZAP //

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