Físicos observam luz a sair de uma nuvem de átomos — antes de ter entrado

ZAP // Dall-E-2

As partículas de luz podem passar “tempo negativo” através de uma nuvem de átomos extremamente frios — sem quebrar as leis da física.

No domínio quântico, todos os dias acontecem coisas aparentemente impossíveis. Graças aos efeitos quânticos, uma partícula de luz pode sair de uma nuvem de átomos extremamente frios antes mesmo de entrar.

Quando a luz entra num material, a sua velocidade muda à medida que as suas partículas, ou fotões, interagem com os átomos à sua volta. Os átomos no interior de um material absorvem e depois libertam os fotões que entram, causando um atraso no seu tempo de viagem.

Mas em alguns casos, um fotão pode sair mais cedo do que tarde — tão cedo, de facto, que passa uma quantidade negativa de tempo absorvido pelo material, explica a New Scientist.

Num novo estudo, Daniela Angulo, investigadora da Universidade de Toronto, no Canadá, e os seus colegas enviaram um fotão através de uma coleção de dezenas de milhares de átomos de rubídio arrefecidos quase até ao zero absoluto.

Estes átomos ultra-frios são suscetíveis a efeitos quânticos, e os seus estados quânticos podem ser controlados com precisão através de lasers e campos electromagnéticos.

Os investigadores enviaram dois feixes de laser através dos átomos, cada um deles em direção a um detetor diferente.

Um feixe transportava os fotões que eram refletidos pelos átomos ou absorvidos e depois libertados por eles, enquanto o outro servia de sonda. Este feixe de sonda não era absorvido, mas revelava a alteração do estado quântico que ocorria quando qualquer átomo da nuvem absorvia um fotão do primeiro feixe.

Isto permitiu aos investigadores determinar se um átomo tinha mudado de estado enquanto o fotão estava dentro da nuvem, e durante quanto tempo.

Os investigadores ficaram surpreendidos ao descobrir que havia uma combinação entre a frequência do feixe laser e os estados quânticos dos átomos para os quais este número era negativo.

Depois de detetarem um desses casos, passaram quase dois anos a aperfeiçoar a sua configuração e, em seguida, recolheram dados ininterruptamente durante semanas para encontrar mais, explica Angulo.

Para objetos quânticos como os fotões, existe um compromisso fundamental entre a quantidade de informação sobre as suas propriedades que um observador pode recolher sem alterar o seu comportamento

Este compromisso é refletido no famoso Princípio da Incerteza de Heisenberg, que na realidade são dois: no mundo quântico, não se pode medir uma propriedade sem a alterar, porque a energia usada na medição altera a propriedade medida; e não se pode medir com a mesma precisão e ao mesmo tempo a posição e velocidade de uma partícula, porque ao medir uma, alteramos a outra.

Por esta razão, a equipa optou por fazer apenas medições muito fracas enquanto os fotões se encontravam na nuvem de átomos, mas fê-lo repetidamente durante 15 horas para obter um único ponto de dados, afirma.

Aephraim Steinberg, também investigador da Universidade de Toronto e co-autor do estudo, diz que embora a ideia de tempo negativo possa parecer paradoxal, não quebra quaisquer regras de causalidade ou da relatividade especial de Albert Einstein porque os fotões não estão a ser usados para comunicar qualquer informação.

“A experiência apenas contribui para a nossa compreensão de todas as formas como a luz e a matéria podem interagir no mundo quântico”, diz o investigador.

“Estas experiências exploram o que antes era sobretudo uma curiosidade teórica”, diz Peter Milonni, da Universidade de Rochester, em Nova Iorque. “Esta é uma contribuição importante para uma parte da física que continua a fascinar“.

Segundo Milonni, é possível interpretar a estranha medição de tempo negativo como uma consequência da imprecisão inerente à mecânica quântica, em que são possíveis várias opções para a forma como um fotão viaja através de uma nuvem de átomos.

Isto inclui a possibilidade de não passar tempo nenhum — bem como tempo negativo — entre os átomos. Quando todas as possibilidades se combinam corretamente, por vezes um destes resultados contra-intuitivos vence.

Segundo Andrew Jordan, investigador da Universidade Chapman, na Califórnia, esta experiência é fantástica, mas sugere que os resultados devem ser tomados com cautela.

“Para recordar as palavras de Einstein: o tempo é o que é medido por um relógio“, diz, “enquanto esta experiência obtém o tempo que um fotão passou dentro de um grupo de átomos de forma menos direta“.

Assim, futuras experiências deverão tentar medições ainda mais diretas deste fenómeno, conclui Jordan.

Os resultados do estudo foram apresentados num artigo que se encontra disponível para consulta no ArXiv.

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