Mais um fato-morto. Os astronautas parecem destinados a beber (e comer) a sua urina

Warner Bros / Legendary

“Dune”, filme de Denis Villeneuve (2021)

É um “traje destilador”: nova roupa espacial absorve a urina do astronauta, filtra o líquido e transforma a urina em água potável. 

Os temíveis guerreiros Fremen, que habitam o duro mundo desértico de Arrakis em Dune, de Frank Herbert, têm de recorrer a “fatos-morto” de corpo inteiro para a sua sobrevivência, que reciclam o suor e a urina absorvidos e os transformam em água potável.

Agora, a ficção científica está prestes a tornar-se realidade, diz o Ars Technica.

Cientistas da Universidade Cornell, nos Estados Unidos, desenvolveram um novo fato espacial que absorve a urina do astronauta, filtra o líquido e transforma o líquido em água potável.

Para ser preciso, 87% do xixi é reciclado, em 5 minutos, segundo o estudo publicado na revista Frontiers in Space Technologies.

O “traje destilador” foi desenvolvido para que os astronautas o usem durante a caminhada espacial, o famoso “spacewalk”.

Quando saem da nave ou da ISS – Estação Espacial Internacional, não podem ir à casa-de-banho; usam uma espécie de fralda e podem beber apenas um litro de água. Por isso, esta inovação dá um pouco mais de conforto.

O conceito da nova roupa espacial é baseado no traje usado, na saga Dune, pelos Fremen, o povo do deserto no planeta Arrakis.

Como a água é o bem mais precioso nesse futuro distópico, os fremen inventaram uma tecnologia capaz de reciclar todo o suor e urina eliminados pelo corpo. Fora do espaço, o universo ficcional criado por Frank Herbert já inspirou as ciências noutras ocasiões, incluindo a descoberta de novas espécies.

O traje espacial é composto por uma roupa íntima, feita de múltiplas camadas de tecido flexível, com um dispositivo coletor de silicone – que tem formato e tamanho diferente, dependendo do sexo do astronauta, mas é sempre colocado ao redor dos órgãos genitais.

O dispositivo está ligado a uma bomba de vácuo para sugar todo o xixi. Entretanto, essa bomba só é ligada quando a humidade relativa começa a aumentar.

Após a coleta, o líquido é levado para um sistema de filtragem com duas etapas, incluindo a osmose direta e reversa, que está localizado numa “mochila”, nas costas do astronauta. Há também uma segunda bomba que separa a água do sal.

No final, a água recém-filtrada é enriquecida em eletrólitos, tornando-se um tipo de isotónico (“bebida desportiva”), e bombeada para um reservatório de bebidas da roupa especial.

Todo o equipamento pesa cerca de 8kg e pode filtrar 500 ml de cada vez. Com o protótipo da nova roupa espacial disponível, os cientistas planeiam as primeiras experiências.

“O nosso sistema pode ser testado em condições de microgravidade simuladas, já que a microgravidade é o principal fator espacial que devemos levar em conta”, afirma Sofia Etlin, investigadora da Cornell University e primeira autora do estudo, em nota.

“Esses testes garantirão a funcionalidade e a segurança do sistema antes que  seja implantado em missões espaciais reais”, acrescenta Etlin.

Caso tudo corra bem, a expectativa é que o traje destilador possa ser usado nas missões Artemis previstas para 2025 e 2026, com o objetivo de explorar a Lua. Também deve estar presente nas missões tripuladas para Marte, a partir de 2030.

Os astronautas parecem estar condenados a beber a sua própria urina. Recentemente, um YouTuber da Hacksmith Industries criou — e testou — também a sua versão real do fato-morto.

A ideia de reciclar a urina e transformá-la em água potável é antiga. Em 2020, a NASA testou um sistema de filtragem que transforma urina em água no Espaço, e em 2023 anunciaram que os astronautas já estão a beber quase toda a sua urina.

Mas em 2017 a NASA foi mesmo mais longe, e lançou um projeto que pretende usar urina de astronautas para produzir alimentos no espaço. Não há volta a dar: os viajantes espaciais parecem mesmos condenados a beber — e comer — a sua própria urina.

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