Solução encontrada em 2024 não é inédita. Com ajuda preciosa de um leitor, recuamos até 1983/84 e a Tito de Morais e Fernando Amaral.
Lembramo-nos de muitos factos da história da política em Portugal. Mas não nos lembramos de tudo – e não consultamos tudo em todos os artigos.
Ontem, quarta-feira, PSD e PS chegaram a acordo e resolveram o impasse à volta do presidente da Assembleia da República: presidência rotativa. Aguiar-Branco (PSD) até 2026, algum deputado do PS a partir desse ano.
Escrevemos que esta é uma solução inédita em Portugal. À boleia de colegas da comunicação social, informámos que é a primeira vez que há presidência rotativa na Assembleia da República.
Não é.
Pouco depois da publicação do artigo, um leitor do ZAP chamou-nos a atenção para a III Legislatura, entre 1983 e 1985.
O PS de Mário Soares ganha, longe da maioria absoluta, e celebra acordo parlamentar e governamental com o PSD.
Estava criado o – ainda hoje – muito famoso “Bloco Central”.
No meio de crise económica e social, com presença do Fundo Monetário Internacional (FMI), e entre questões “quentes” como planeamento e educação sexual, aborto, segurança interna… Um aspecto escapou à nossa memória: houve dois presidentes da Assembleia da República nessa legislatura.
Como descreve o site do Parlamento, na segunda reunião desta legislatura, Tito de Morais (PS) foi eleito Presidente da Assembleia da República.
Tito de Morais
Manuel Alfredo Tito de Morais foi Presidente da Assembleia da República entre Junho de 1983 e Outubro de 1984.
Formado em engenharia eletrotécnica, tinha fugido do país durante o Estado Novo por motivos políticos – entre Angola, França, Brasil, Argélia, Suíça, Itália e Alemanha.
Foi um dos fundadores do Partido Socialista; em 1964 fundou a Associação Socialista Portuguesa (ASP), que viria a dar origem ao PS 1973. Tito de Morais foi o primeiro secretário nacional do PS, ainda clandestino.
Eleito deputado logo a seguir ao 25 de Abril – primeiro para a Assembleia Constituinte e depois para a Assembleia da República – viria a ser vice-presidente da Assembleia da República entre 1977 e 1983, ano em que passou mesmo a ser presidente.
Renunciou ao mandato de deputado em 1984, quando deixou de ser presidente da Assembleia da República
Manuel Tito de Morais viria a ser presidente do PS entre 1986 e 1989. Faleceu em 1999, tendo sido criada entretanto a Associação Tito de Morais em sua homenagem e ainda em homenagem ao seu pai e irmã.
Fernando Amaral
O acordo PS/PSD de 1983 estabeleceu que Tito de Morais só seria presidente da Assembleia da República na primeira sessão legislativa.
Em 1984 há novas eleições para a presidência da Assembleia da República e aí, como já estava combinado, foi eleito um deputado do PSD: Fernando Amaral.
Fernando Monteiro do Amaral, formado em Direito, tinha passado pela Câmara Municipal de Lamego e pela Assembleia Municipal do mesmo conselho.
Foi deputado entre as I e VI Legislaturas – excluindo a II, que ficou fora. Foi ministro da Administração Interna e Ministro-Adjunto.
O seu mandato como presidente da Assembleia da República acabou por se prolongar mais do que o esperado.
O Bloco Central caiu em 1985. Protestos de figuras do PSD, que queriam o fim do acordo com o PS; Mota Pinto deixou a liderança do partido, Cavaco Silva foi o seu sucessor e o PSD saiu do Governo.
Mário Soares demitiu-se, eleições antecipadas, vitória do PSD – e Fernando Amaral continuou a ser Presidente da Assembleia da República até 1987, ano de (novas) eleições antecipadas.
Faleceu em 2009.