Um novo estudo, conduzido por investigadores da Universidade de Harvard, desafia a ideia de longa data de que o atraso no desenvolvimento da linguagem experimentado por algumas crianças está ligado a origens sócio-económicas mais baixas.
A pesquisa, recentemente publicada na PNAS, sugere que a quantidade de conversas entre adultos que uma criança ouve desempenha um papel mais significativo na sua proficiência linguística inicial do que o seu estatuto socioeconómico.
Analisando mais de 40.000 horas de gravações áudio de cerca de 1000 crianças com menos de quatro anos em 12 países e 43 línguas diferentes, o novo estudo produziu resultados surpreendentes.
Os investigadores não encontraram nenhuma ligação significativa entre as vocalizações de uma criança e o seu estatuto socioeconómico, determinado pelo nível de escolaridade da mãe, ou exposição a múltiplas línguas.
Em vez disso, o estudo, conduzido por Elika Bergelson, investigadora da Universidade de Harvard, revelou um padrão marcante: as crianças que ouviam mais conversas entre adultos ao longo do dia vocalizavam mais frequentemente.
Em média, por cada 100 novas vocalizações ouvidas no período de uma hora no decorrer do estudo, as crianças produziam mais 27 vocalizações. O efeito da “conversa de adultos” aumenta também com a idade das crianças, que produziam 16 vocalizações adicionais por cada ano a mais.
“Os resultados do estudo levantam muitas questões acerca da ideia preconcebida de que as famílias de certo estatuto socioeconómico estão a dar menos estímulos linguísticos, ou de menor qualidade, aos seus filhos”, explica Bergelson em nota de imprensa publicada na The Harvard Gazette.
Crianças com condições como dislexia, que afetam o desenvolvimento da linguagem, exibiram menos vocalizações, e o fosso aumentou à medida que envelheceram.
Embora não aponte o mecanismo exato por trás desta ligação, o estudo sugere que simplesmente estimular conversas entre adultos e crianças pequenas, independentemente do seu contexto socioeconómico, pode ter um impacto positivo no seu desenvolvimento linguístico.
Os investigadores salientam que o estudo se concentrou na quantidade de exposição à linguagem, não na qualidade.
Assim, dizem os autores do estudo, fatores como o estatuto socioeconómico podem ainda influenciar aspetos mais matizados da aprendizagem da linguagem, como o vocabulário e a gramática.
“Este estudo destaca a importância da interação precoce no desenvolvimento da linguagem de uma criança, independentemente do seu contexto socioeconómico”, explica”, conclui professora de psicologia e autora principal do estudo.